A economia cubana cresceu em 1996 no ritmo dos chamados “tigres asiáticos”.
Os números revelados pelo ministro da Economia e do Planejamento no último período de sessões da Assembléia Nacional do Poder Popular ultrapassaram as previsões mais otimistas.

O crescimento global excedeu 7,8% – mais 2,3% do que o estabelecido no projeto. O déficit do Orçamento, inferior à previsão, representou 2,4% do PIB (3,6% em 1995).
A comissão Econômica para a América Latina (CEPAL), organismo da ONU, já chamou a atenção para o fato de Cuba ter crescido duas vezes e meia mais que o conjunto da Região, não obstante as suas condições serem muito mais desfavoráveis.

Gigantes como o Brasil e o México contam co o apoio empenhado de instituições financeiras internacionais e financiamentos de grande banca européia, japonesa e norte-americana. Apesar disso, os resultados que apresentam são decepcionantes.

O paralelo Brasil-Cuba é especialmente embaraçoso para a Casa Branca e para os analistas de Wall Street porque os dois países são modelos políticos e econômicos antagônicos. Enquanto o presidente Fernando Henrique é acarinhado em Washington como o mais fiel executor do neoliberalismo e teórico da estratégia da globalização para o Terceiro Mundo, Fidel Castro e o socialismo cubano são apresentados nos Estados Unidos como imagem de um processo fracassado.

Ora os fatos e números demonstram o contrário: o Brasil afunda-se numa crise gravíssima; Cuba bloqueada, vítima de uma prolongada e brutal agressão econômica, privada de créditos normais, consegue obter a mais alta taxa de crescimento do continente. O socialismo cubano humilha o capitalismo neoliberal.

Não é de estranhar que a imprensa de alguns países do hemisfério comece a utilizar a expressão “milagre cubano”para explicar os êxitos alcançados na Ilha.

Os debates na Assembléia Nacional do Poder Popular vieram, entretanto, confirmar que os dirigentes do Estado e do Partido são em Cuba infensos a tentações ufanistas. Conscientes das enormes dificuldades que o país tem pela frente, já advertiram que o ritmo do crescimento da economia terá de diminuir em 1997 para 4% ou, no máximo 5%.

É indispensável evitar desequilíbrio. O déficit fiscal previsto será, de acordo co o Plano, reduzido em 19% e os investimentos aumentarão 9%.

Governo e Assembléia debateram em profundidade a complexa situação criada pelo agravamento do déficit da balança de pagamentos. Não esquecem que o custo do petróleo e da maioria dos produtos importados cresceram muito nos últimos meses. A Ilha compra, aliás, quase tudo acima dos preços médios do mercado internacional em conseqüência, direta ou indiretamente, do cerco econômico que atinge.

Sem o endividamento verificado (alguns empréstimos a curto prazo foram obtidos com juros superiores a 20% ) a economia cubana não teria podido adquirir equipamentos e produtos que lhe permitiriam crescer e estabelecer alguns recordes em múltiplos setores: turismo, arroz, petróleo, eletricidade, hortaliças, tubérculos.

Foram muito interessantes os debates travados na Assembléia’leia sobre temas ligados ao exercício de algumas profissões por conta própria.

É positivo para a sociedade o balanço da atividade do setor privado e da contribuição para a melhora do abastecimento e da qualidade de vida. A Assembléia, entretanto, pôs ênfase na necessidade de um aumento dos impostos que incidem sobre os rendimentos pessoais de trabalhadores nessas condições. Sabe-se que o excesso de liquidez ainda existente resulta, sobretudo, da concentração da moeda nacional nas mãos de um setor minoritário da população, precisamente dos trabalhadores por conta própria. Daí uma dupla exigência: maior carga tributária e resposta adequada das empresas públicas que competem com os trabalhadores privados. É o que está a acontecer na área dos restaurantes, onde o aparecimento de novos e excelentes estabelecimentos do Estado provocou já uma redução no número de “paladares”, palavra que, aqui designa as casas particulares (todas familiares, sem empregados) do ramo gastronômico.

O povo cubano tomou conhecimento com alegria, no período festivo, das vitórias alcançadas em 1996. A convicção generalizada é a de que o país está a colher os frutos dos pesados sacrifícios do período especial.

Os cubanos sentem orgulho por saberem que as esferas da saúde, da educação e da segurança social melhoraram nestes anos difíceis o nível de seus serviços. Mereceram uma atenção ampliada do Estado apesar dos apertos orçamentais. Hoje há mais médicos, mais investigadores científicos, mais e melhores hospitais, escolas e creches.

As campanhas de desinformação sobre Cuba não conseguem apagar a realidade. O único país socialista do Ocidente é também o único onde o povo tem participação democrática ativa no debate sobre o presente e a constrição do futuro.

* Miguel Urbano Rodrigues é jornalista.

EDIÇÃO 44, FEV/MAR/ABR, 1997, PÁGINAS 46, 47