– Qual é a do bule no banheiro?

      De pé, na saída do corredor que dá pra sala, ele indagava a esposa, que costurava no sofá.

      – É pra esvaziar aquela bacia debaixo do lavatório.

      – Que tem o lavatório.

      – Goteira.

     – Tá vazando?

      – Se tem goteira…

      – Precisa falar assim?

      – Assim como?

      – Como se eu fosse um imbecil.

      – Ih, lá vem você…

      – Lá vem você, não. Ultimamente é isso: eu falo alguma coisa, e você debocha.

      – Eu debocho?!

      – É.

      – Olha, Olavo, não tenho tempo pra cuidar de suas manhas.

      – Ah, não tem tempo!

     – Não. Estou muito ocupada costurando suas meias. E você, em vez de ficar aí feito um pau, com esse bule na mão, devia era consertar o lavatório.

      – Tava demorando.

      – O quê?

      – Pra cobrar.

      – Cobrar!?

      – É. "Eu costuro sua meia, e você conserta meu lavatório".

      – Meu lavatório, uma vírgula! O lavatório do banheiro, que nem nosso é, porque a casa é alugada.

      – Então procura um marido que lhe dê uma casa própria, carro zero e conta no cabeleireiro!

      Ela se levantou com o maxilar cerrado e todo o ódio do mundo concentrado no rosto. Caminhou firme até ele, arrebatou-lhe o bule e atirou-o pela janela. Voltou-se e, no auge da indignação, rasgou a meia que trazia na mão esquerda.

      Atônito, ele dirigiu-se ao quarto, vestiu a camisa, calçou o tênis e pôs o boné. Após uns instantes de hesitação, foi em demanda da porta de saída.

      – Quer alguma coisa da padaria?

      Silêncio.

      Fechou a porta do apartamento bem devagarinho e saiu do prédio com um susto tão grande que o impedia de pensar.