Dona Inácia atende ao telefone enxugando as lágrimas. Tinha curtido quinze minutos de choro sentido, abraçada a si mesma, sem entender o porquê de tanta dor. Toda vez que olhava para a carta, o pranto se multiplicava em água e soluços. Quando finalmente parecia ter esvaziado o peito, o aparelho tocou:

      – Alô, quer falar com quem?

      – Oi, dona Inácia, como vai?

      – Quem tá falando?

      – Toninho, da oficina. Tudo bem?

      – Jorge não tá aí?

      – Tá, sim senhora. Ééé…

      – Que foi, Toninho?

      – É que nós estamos aqui na Santa Casa, sabe? E o seu Jorge… teve lá um troço na oficina… Bom, ele…

      – Tô indo praí.

      Põe o fone no gancho, cata a carteira de sobre a cômoda e vai atrás de um táxi na rua. As lágrimas, súbito, deixam de pressionar os olhos. Mas a agonia que a come por dentro aumenta. Lembra da carta e a ela atribui a responsabilidade por todos os acontecimentos presentes e futuros.

      O táxi encosta, ela dá a direção e, no caminho, vai imaginando seu Jorge entubado, numa sala de cirurgia.. ou pior: largado no corredor do pronto-socorro. De misturada, vem a carta; lembranças do casamento; as filhas…

      – Preciso avisar a Glorinha; Mariana… Meu Deus, o que se passa?…

      Na porta do hospital, atenta que se esqueceu de perguntar a Toninho onde exatamente está seu velho. Dirige-se a uma camelô:

      – Boa noite. O senhor sabe onde é o pronto-socorro?

      Uma vez informada, parte em demanda da urgência. Na entrada, encontra um dos rapazes da oficina fumando. Não falam nada. Ele calca com o pé o cigarro pela metade, e conduz dona Inácia até seu Jorge.

      Era o que previra: operação de emergência. Diagnóstico: AVC. Segundo Toninho, os médicos informaram que ele ia ficar com seqüelas.

      Dona Inácia travou os queixais. Respirou fundo, aprumou-se heráltica e, nos olhos verdes de Toninho, traçou toda sua estratégia futura.

      – Quero ver ele.

      – Assim que a operação terminar, dona Inácia.