Bar na 306 Norte. O samba come solto na voz de um negro carioca, que canta todos os sucessos da Estação Primeira de Mangueira e um pouco mais. Minha filha, oito anos de energia concentrada, dança e canta junto com o artista. Findo o show, o homem vai tomar sua merecida cerveja, na companhia dos amigos. Minha menina, toda escalada, vai atrás e fica no papo.

      Como mais uns pastéis, bebo o último gole da cerveja já quente, peço a conta, despeço-me dos amigos. Aporto a mesa do artista e chamo:

      – Vamos, princesa?

      – Você é o pai? – pergunta uma das convivas da roda. 

      – Sou sim.

      – Menina danada, essa sua! – exclama o sambista – Gostei dela.

      – E põe danada nisso – devolvo, pejado de orgulho e afeto.

      – Sabe o que ela me disse? – retorna a mulher – Disse que aprendeu valsa na escola. Aí eu perguntei: "Você prefere valsa ou samba?". Ela me respondeu: "Samba". Perguntei por quê. E aí ela disse: "Porque no samba tá todo mundo dentro da gente; na valsa, tá todo mundo fora". Você acredita? 

      Não, não acreditava. Mas o que podia minha falta de fé diante do milagre assim tão evidente, e testemunhado, da poesia?