Conta-se ó rei afortunado…bem, espere aí – ainda que você não seja rei e nem tampouco afortunado, imagine que é, pois esta coluna não tem compromisso com a verdade, está claro? Vamos recomeçar então…

      Conta-se ó rei afortunado que o poeta filósofo Ling Chiang Chong, habituado ao princípio da retidão, saiu caminhando pelo mundo cortando a circunferência da terra sempre em linha reta, e eu mesmo o vi quando passou na altura do trópico de capricórnio ali por Mogi das Cruzes. Ele levava um farnelzinho ou embornal, como se fala no interior de São Paulo, em que carregava todas as verdades que não podem ser escritas nem pronunciadas e as inverdades criacionadas. Aliás, confesso que ele não usou essa palavra, “CRIACIONADA”, que é criação minha mesmo. Disse-me então que carregava este fardo para atirá-lo ao Rio Jordão.

      Ora, eu não resisti em lhe dizer que por essa latitude, seguindo sempre o caminho da retidão, nunca se alcança o Rio Jordão, pois as linhas paralelas nunca se encontram. Mas foi daí meu rei, como diriam os baianos, que ele sentou-se no chão e riu-se muito de mim, riu-se até soluçar. Riu-se da minha ingenuidade ou talvez da minha estultice, e justificou: pois se eu não acreditasse mesmo que no caminho da retidão chega-se ao Rio Jordão, cá por essas latitudes, como poderia eu ter tanta fé nas verdades não escritas e não pronunciadas que se misturam às inverdades criacionadas carregadas no fardo do poeta. Então, ó rei afortunado, foi-se embora o poeta imortal, rindo-se tanto, que talvez ainda hoje, dentro do tempo eterno das palavras que constroem esse conto, deva estar rindo, rindo até rolar no chão.