O tema principal do evento foi o lugar e o papel da cultura no projeto nacional de desenvolvimento. O presente texto apresenta diretrizes e elementos para uma plataforma de cultura enquanto parte integrante de um projeto nacional. Ele é de autoria de Manoel Rangel, diretor da Ancine, que debateu esse assunto com o secretário executivo do Ministério da Cultura, Juca Ferreira

A primeira questão de onde partimos para o debate sobre diretrizes e elementos para um programa de cultura é que todo o trabalho da atual gestão do Ministério da Cultura (MinC), a partir do esforço das correntes políticas e dos recursos humanos que o integram, foi realizado no sentido de inserir o tema da cultura como uma questão central no processo do desenvolvimento nacional. A atual direção do Ministério da Cultura não aceitou a consigna legada pelo governo anterior, neoliberal, da cultura como ornamento, como o departamento de eventos, como uma operação subsidiária e secundária na cena política.

O MinC, na gestão do ministro Gilberto Gil, empreendeu esforços para conferir uma alma ao projeto de desenvolvimento nacional, ressaltando o papel da cultura nessa luta de gerações pela construção de um país e de uma nação. Pelo trabalho realizado e vislumbrando as necessidades do futuro, temos a convicção de que esse esforço precisa ter continuidade.

Essas realizações na esfera da política cultural não se deram no abstrato, vieram à luz por intermédio de um governo concreto. Um governo democrático, de qualidade superior em todos os seus aspectos em relação ao anterior, mas também marcado por um dualismo, por um hibridismo; num pólo, concepções e práticas consoantes às aspirações da Nação, ao desenvolvimento e, noutro, a presença de concepções macroeconômicas conservadoras. O MinC se movimentou entremeio a esse dualismo no qual eclodiram conflitos ao longo de toda a gestão.

Ante esse hibridismo, a política cultural do MinC procurou canalizar forças e aliar-se com aqueles setores do governo comprometidos com a retomada do crescimento econômico, com a construção de um mercado interno de consumo de massas que represente inclusão, auto-sustentabilidade do país, redução das desigualdades sociais, melhoria das condições de vida. Quer dizer, das forças que trabalharam pela superação da lógica do rentismo, do receiturário dos monopólios e pela adoção da diretriz que determina o investimento na produção e o desenvolvimento do país.

O segundo aspecto é a perspectiva de inserção internacional não-subordinada. O ministro Gilberto Gil e sua equipe cumpriram um papel destacado para que a Unesco proclamasse a Convenção sobre a Diversidade Cultural, a despeito do voto contrário dos EUA e de apenas um dos seus satélites. Essa convenção permitirá enfrentar o dogma da liberalização comercial absoluta e da homogeneização da cultura dos povos no interior da OMC (Organização Mundial do Comércio), afirmando a possibilidade de os povos trabalharem o seu desenvolvimento cultural pleno de forma soberana, preservando assim, em condições diferenciadas a singularidade de cada povo no concerto das nações.

No sentido de uma inserção internacional não subordinada se ressalta não ser mais possível pensar o Brasil fora do contexto da América do Sul. Ou seja, pensar um projeto de desenvolvimento nacional significa pensar um projeto de desenvolvimento regional da América do Sul. Essa integração será cultural antes de econômica e de infra-estrutural. A integração precisa avançar no terreno da economia e da infra-estrutura, mas se ela não se operacionalizar no terreno da cultura, das trocas simbólicas e das trocas propiciadas pela Economia da Cultura, pela valorização de ações comuns dos nossos povos e países, não terá condições de vislumbrar a evolução do projeto nacional.

Numa direção prospectiva e sob o correto lema de que é precisamos avançar, caso as forças progressistas obtenham uma nova vitória, temos de conceber a política cultural e o projeto de desenvolvimento brasileiro numa perspectiva de superação do rentismo monopolista que caracteriza o capitalismo vídeo-financeiro de nossos dias. No seu lugar, progressivamente tornar realidade um projeto nacional que proporcione geração de emprego e renda, estímulo à produção, maiores investimentos públicos em saúde, educação, cultura, comunicações, esporte, infra-estrutura. Em suma, ações que ampliem as condições para o desenvolvimento brasileiro.

Um programa de cultura para o próximo governo deve partir destas referências gerais e dos avanços obtidos na estruturação da política cultural brasileira na gestão do ministro Gilberto Gil. A referência nossa, na construção desse programa, deve ser a relação dialética entre identidade e diversidade cultural que marcou a formação brasileira e que é a força principal de nossa cultura. Esse conceito é importante porque foge tanto de uma visão de uma identidade nacional congelada no tempo quanto de uma visão de múltiplas identidades que, na prática, diluem a própria identidade brasileira. Dessa relação dialética emergem resultantes que dão certo traço comum à nacionalidade. É a idéia da antropofagia que permanece entre nós.

O terceiro aspecto é a manutenção de uma tridimensionalidade na operação da política cultural brasileira. A idéia de que três dimensões devem estar plenamente articuladas: a simbólica, a econômica e a cidadã.

Na dimensão simbólica estão os valores, a nossa formação, a nossa constituição, o âmbito da produção cultural mais diversificada do nosso povo. É o modo brasileiro de criar, viver, produzir cultura, expresso em cada uma das linguagens artísticas e renovado permanentemente pelo choque com outras culturas e experiências. É preciso um amplo programa de valorização desta produção cultural diversificada, pensando sempre em propiciar as condições para sua multiplicação e continuidade, tradição e renovação.

Já a dimensão econômica se apresenta como a necessidade de afirmação dessa cultura no contexto da indústria cultural, do mercado, conseguindo entender que também o mercado tem uma dimensão de afirmação cultural. Há, é claro, nesse contexto, uma grande disputa a ser travada, sobretudo, porque na esfera da indústria cultural temos um forte embate contra a hegemonia de uma produção massificada estrangeira. Fenômeno que tem uma razão muito simples: a indústria cultural é monopolizada no mundo inteiro.

Essa indústria oligopolística possui grandes gravadoras, as grandes distribuidoras e produtoras de cinema e de audiovisual, as grandes editoras de livros, poderosas corporações de mídias articuladas hoje na condição de conglomerados que operam de uma ponta a outra da cadeia econômica do entretenimento e da cultura, controlando inclusive as plataformas de distribuição.

Portanto, nessa esfera econômica, em contraponto a essa realidade, temos o desafio de afirmar e ampliar o mercado interno. Tarefa que demanda o surgimento de empresas nacionais fortes que assumam, entre outras funções e serviços, o domínio da operação de distribuição de bens culturais, que resgatem o controle dos produtores brasileiros e de empresas brasileiras sobre a distribuição e a circulação da nossa produção cultural.

E a terceira dimensão é a cidadã, de empoderamento dos produtores de cultura e dos brasileiros em geral. Ações que permitam ampla circulação de bens culturais e acesso à fruição da cultura nas suas diversas formas: da cultura que nos vem de outros povos e de outras partes; da cultura dita erudita; da cultura popular. Medidas que ampliem a capacidade dos brasileiros de produzir e fruir sua produção cultural.

O quarto aspecto é estabelecer uma concepção que rompa com os limites da cultura em direção a duas outras dimensões do Estado brasileiro e da vida social brasileira: a educação e a comunicação.

A educação como o lugar institucional da disseminação da cultura. O ponto de partida de sensibilização em larga escala. Ou seja, trazer as linguagens artísticas para os currículos das escolas e das universidades, conceber e ter as escolas e universidades como pontos de difusão e de produção artística e cultural. Espaços de intensa troca e circulação de cultura. Em síntese: promover o reencontro entre a Educação e Cultura no Brasil.

As comunicações como pertencentes essencialmente à esfera da cultura. Antes, desde sempre e cada vez mais. Precisamos superar um raciocínio torto que foi disseminado entre nós. Por esse raciocínio equivocado as comunicações se restringiriam à esfera da infra-estrutura – correios, telefonia, antenas, cabos… Precisamos tornar absoluto o raciocínio de que as comunicações são os espaços da difusão, da circulação da cultura, da produção de informações e, portanto, lugar de cultura, informação e entretenimento.

Aqui há um referencial institucional importante – o paradigma francês – segundo o qual o Ministério da Cultura é o Ministério da Cultura e das comunicações. É assim porque o que importa para as comunicações é a cultura que veicula, o restante é infra-estrutura, é suporte.

Importa pouco para a sociedade brasileira qual é mesmo o suporte que viabiliza uma transmissão de TV. Não importa muito se os sinais são transmitidas em faixas de 6 mhz ou se nos chega através do cabo de fibra ótica, ou pelo satélite, ou ainda em ondas curtas. O determinante, o que faz as pessoas ficarem diante da TV é a sua programação, e esta é eminentemente produção cultural seja na forma de dramaturgia, informação ou entretenimento. Por isso, é fundamental para uma concepção de política cultural avançada, para o conceito de cultura como alma de um projeto de desenvolvimento nacional, romper a barreira entre a cultura e as comunicações na realidade do Estado brasileiro e na realidade da sociedade brasileira.

Quinto aspecto: concluir as tarefas institucionais, começadas nesta gestão, referentes ao processo de reconstrução do Ministério da Cultura e das instituições públicas federais a ele vinculadas.

Todo trabalho desenvolvido ao longo dos últimos três anos e meio foi realizado, fundamentalmente, por um conjunto de quadros não integrantes do quadro permanente do MinC, associados a um quadro de funcionários fragilizado e aviltado por décadas de descaso. Apesar do muito que foi feito, o MinC não foi fortalecido adequadamente, nem a estrutura permanente foi suficientemente impregnada pelos conceitos da política pública de cultura.

O MinC, além de ter escassos recursos humanos, não tem carreira estruturada de gestores de cultura. Seu quadro permanente é herança dos tempos em que não havia concurso no funcionalismo público federal e apenas uma minoria ingressou por concurso na administração pública federal e sem um preparo específico.

Em decorrência disso, a carência de pessoal é enorme. Órgãos e instituições como o IPHAN, a Funarte, a Cinemateca brasileira, o Centro Técnico do Audiovisual há anos não vêem chegar novos quadros. Isso significa que o Estado Brasileiro não tem um corpo de gestão da política cultural permanente. Significa também que tudo o que foi feito pode se desmanchar como num passe de mágica, numa mera troca de comando decorrente do processo eleitoral. Enquanto há outras estruturas dentro do Estado brasileiro como o Ministério das Relações Exteriores, a Receita Federal, o Tesouro Nacional, o Banco Central ou a Polícia Federal, em que carreiras estáveis permitiram estabelecer continuidade de gestão, com flexões de política a cada processo eleitoral, mas com um projeto internalizado.

Portanto, uma nova gestão deverá concluir o processo de reconstrução do Ministério da Cultura e das instituições públicas federais de cultura. É preciso ter gestores concursados, quadro próprio permanente, reestruturação das entidades vinculadas, maior sinergia e racionalidade na disposição das secretarias e das suas funções. Este esforço permitirá, a renovação da agenda e da prática política no corpo do Ministério da Cultura.

Ainda no esforço de concluir as tarefas institucionais precisamos aprofundar o desenvolvimento do Sistema Nacional de Cultura – um legado importante desta gestão. Sistema que seja instrumento de articulação do Estado brasileiro numa dimensão ao mesmo tempo unitária e federativa e que trabalha com a idéia por nós já conhecida do Sistema Único de Saúde, e do Sistema Nacional de Educação. O Sistema Nacional de Cultura precisa ser consolidado, articulando as tarefas federais, as tarefas dos estados e as tarefas dos municípios em relação à política pública de cultura para o Brasil.

Outro aspecto é a elaboração e a aprovação de um Plano Nacional de Cultura com as diretrizes do Estado brasileiro para a Política Cultural. Esse Plano Nacional de Cultura, conforme previsto pela Constituição da República, será debatido na sociedade e objeto de discussão e aprovação do Congresso Nacional. Esse Plano tem a possibilidade de ser uma força absolutamente transformadora e de operação permanente, de ser um referencial estratégico para o desenvolvimento cultural brasileiro pelos próximos anos.

O sexto aspecto é o financiamento da cultura e ele deve ser encarado a partir de três pilares. Primeiro, a elevação do orçamento da cultura para pelo menos 1% do orçamento da União. Nosso ideal é chegar a essa baliza até o final deste ano. Essa é uma batalha conduzida pelo ministro Gilberto Gil e o seu secretário executivo, Juca Ferreira, ainda no âmbito deste governo como uma sinalização concreta desse programa cultural para um próximo período. Este 1% em vias de ser conquistado é como uma ponte entre este governo e o futuro governo. Todavia não temos garantias de que nessa ponte haverá um aprofundamento das operações de transformação, maior grau de comprometimento com o desenvolvimento nacional. Isso é sempre fruto da disputa política, e as contradições da sociedade brasileira surgirão durante a batalha eleitoral, durante a batalha de formação de um eventual segundo governo, durante o transcorrer desse eventual segundo governo. Nós devemos tensionar positivamente no sentido de assegurar um compromisso maior com a noção de desenvolvimento.

Na esfera da cultura isso significa resgatar a capacidade de investimento direto do Estado. Investimento direto não para ser feito sob o princípio de que o organismo federal faz diretamente a distribuição de recursos. De se dar, por exemplo, R$ 2.000 para determinado projeto que terá de chegar lá na “ponta”, para determinada pessoa. A meu ver, devemos seguir um ponto de vista que nos permita evoluir inclusive para uma concepção de compartilhamento do orçamento público de cultura da União com os estados e municípios. Ou seja, minimamente 1% e uma caminhada para 2% com uma receita compartilhada entre a União, os estados e os Municípios. Receita compartilhada das verbas da União para a cultura como forma de se trabalhar inclusive a integração do Sistema Nacional de Cultura e a operacionalização do Plano Nacional de Cultura.

Segundo, a revisão das leis de incentivo à cultura para permitir uma integração sistêmica com o orçamento direto e para fazer prevalecer o interesse público em sua utilização. Revisão de critérios, de percentuais de abatimento e de modos de operação. Transformar as leis de incentivo da lógica em que foram criadas – de transferência de responsabilidade para a iniciativa privada e para o departamento de marketing das grandes empresas – para uma relação, sim, com as grandes empresas, mas sob a égide do interesse público, dentro da primazia de certos critérios, da valoração dos projetos e processos e, sobretudo, numa perspectiva que vise à auto-sustentabilidade de setores da cultura que podem, sim, ser auto-sustentáveis.

Terceiro, a criação de uma financiadora de projetos culturais que permita alavancar essa dimensão de economia da cultura. Os incentivos fiscais criaram a distorção de uma total subordinação da produção cultural ao financiamento a fundo perdido. Há shows de música absolutamente rentáveis e recebendo dinheiro a fundo perdido: o dinheiro vai, mas não retorna para que possa ser reinvestido. Há filmes integralmente financiados a fundo perdido, lucrativos, mas o dinheiro não volta para viabilizar novas produções. Nisso há dois problemas. Não é criado um ciclo de realimentação da produção cultural e a auto-sustentabilidade da operação econômica dos produtores culturais. Mais, muitas vezes isso torna nossa produção cultural – particularmente focando o cinema – incapaz de competir porque reduz a capacidade de encontro das obras com o público e de sua operacionalização no mercado.

Finalmente, sob os parâmetros mais gerais que procurei sistematizar acima, é necessário erguer uma plataforma que materialize setorialmente as conceituações, as balizas apresentadas para que no seu conjunto venha a se constituir um programa. Algumas dessas questões ainda têm uma dimensão transversal pela sua importância.

Primeiro: é necessário se construir uma forte rede pública de rádio e televisão no Brasil. É imperativo superar o ditame da lei de segurança nacional nas comunicações. E o caminho para tanto é a construção de um sistema público de comunicação. Somente esse sistema será capaz de romper a lógica monopolística dos meios de comunicação brasileiros, e assegurar o contraditório e a pluralidade, permitindo inclusive as emissoras privadas tentar novos caminhos. Embora o país mantenha cerca de cinco redes nacionais privadas, não temos um ambiente plural de comunicação no Brasil, nem quanto a circulação de bens culturais, nem quanto a circulação de informações.

Portanto, para romper o monopólio será preciso construir uma forte rede pública de comunicações. Nos moldes da BBC inglesa, das experiências de Portugal, Espanha, Itália, França e mesmo dos Estados Unidos, onde a PBS atua como uma forte emissora pública de televisão que serve de contraponto à visão predominante dos grandes conglomerados.

No âmbito do Estado brasileiro significa passar as redes públicas federais de rádio e televisão para o âmbito do Ministério da Cultura. Não é uma mera questão administrativa, mas uma importante questão conceitual. É preciso superar a lógica de instrumento estatal de propaganda e fazer prevalecer o conceito de política pública de comunicação, circulação de informações, cultura e entretenimento para e sob o controle da sociedade brasileira.

Segundo: estabelecer políticas setoriais, no teatro, na música, nas artes plásticas, no artesanato e diversos outros setores. Instituir políticas de desenvolvimento econômico de produção e difusão para cada uma das linguagens artísticas, encontrando para cada uma sua particularidade. Como no caso do cinema e outras em que é preciso atuar no conjunto da cadeia econômica, indo da produção à exibição, passando pela distribuição. Ou como no teatro em que é preciso atuar para além da montagem de espetáculos e circulação, para trabalhar na esfera do processo e da valorização dos grupos, da valorização das companhias como intrínseco ao processo da construção dramatúrgica e da produção teatral.

A meu ver, nesse aspecto, precisamos corrigir a ênfase dada pelo Ministério da Cultura nestes três anos e meio à dimensão antropológica da cultura. Foi importante romper com a idéia de que o Ministério da Cultura era para os artistas e para os produtores culturais, restabelecendo seu diálogo com a sociedade brasileira. Contudo, precisamos ampliar o diálogo do Ministério da Cultura com cada uma das linguagens, com cada um dos setores e com o desenvolvimento das políticas setoriais das linguagens. Esse é um esforço que já vem sendo feito através das câmaras setoriais e dos órgãos especializados do sistema MinC e que pode se aprofundar e fortalecer no curso de uma nova gestão.

Terceiro: é preciso ampliar o programa Cultura Viva, em especial os Pontos de Cultura, como uma ampla rede básica de cultura, pertencente à sociedade brasileira, reforçando a autonomia e a capacidade de realização dos brasileiros. A rede dos Pontos de Cultura, aos quais pode se acrescentar o que se passou a chamar de pontões, é uma rede viva, capilarizada, cujo foco central é a valorização da capacidade associativa dos cidadãos para a produção artística e cultural. Com esta rede o Estado brasileiro transfere efetivamente poder e responsabilidade para as mãos da sociedade brasileira.

Quarto: Promover a modernização da política de patrimônio cultural do país, lidando com o patrimônio material e imaterial, de biodiversidade, com a riqueza da construção cultural dos povos tradicionais no Brasil. Articular a dimensão preservação com a dimensão circulação, produção e geração de valor na esfera do patrimônio cultural.

Quinto: todas as ações precisam ser acompanhadas de um amplo mapeamento da produção cultural brasileira, da sua força econômica e simbólica. É preciso construir um centro de referências em estatísticas, pesquisa e estudos sobre a cultura no Brasil. Precisamos conhecer o perfil do mercado interno de consumo de bens culturais, e constituir uma série histórica de reconhecimento dos hábitos dos brasileiros em relação à cultura, como ferramenta para o desenvolvimento das políticas públicas.

E o sexto tópico dessas ações concretas: o resgate da capacidade brasileira de operar a distribuição dos bens culturais nacionais, firmando empresas de distribuição fortes, potencializando sua produção no país, facilitando a inserção internacional brasileira em um ambiente econômico internacional de primazia do setor de serviços. Uma política focada no desenvolvimento econômico do setor requer dar força às gravadoras independentes, nacionais; constituir fortes distribuidoras de obras audiovisuais brasileiras, em aliança com a distribuição de obras audiovisuais diversificadas; reforçar às editoras brasileiras para lidarem com um cenário de internacionalização da produção editorial e das cadeias de livrarias. Portanto, significa assumir controle nacional sobre a esfera de distribuição de bens culturais no Brasil. Essa é uma dimensão importante porque se trata de produzir as riquezas, gerar riquezas e mantê-las alimentando um ciclo de desenvolvimento e produção cultural no território nacional.

Manoel Rangel é cineasta, diretor da Ancine e diretor de cultura do Instituto Maurício Grabois.

EDIÇÃO 85, JUNHO, 2006, PÁGINAS 36, 37, 38, 39, 40, 41