"Nós dois temos a ganhar com as boas relações entre a China e os EUA, e também a perder com confrontos", disse Hu em resposta por escrito a perguntas do "Wall Street Journal" e do "Washington Post".

Hu reconheceu que existem "algumas diferenças e questões sensíveis" entre nós, mas seu tom em geral foi conciliador e ele evitou mencionar especificamente algumas das questões polêmicas que atrapalharam as relações entre os dois países no último ano – como a venda de armas americanas para Taiwan, que motivou o congelamento da cooperação militar entre os EUA, considerados a única superpotência do mundo, e seu concorrente asiático em ascensão.

Na frente econômica, Hu rejeitou um dos principais argumentos dos EUA para pressionar a China a valorizar sua moeda – o de que vai ajudar o país a baixar a inflação. Isso provavelmente deve decepcionar Washington, que acusa a China de impulsionar injustamente suas exportações com a desvalorização do yuan, que barateia seus produtos. O tópico deve ser um dos mais importantes na agenda do presidente americano Barack Obama quando ele se reunir com Hu na Casa Branca na quarta-feira.

Hu também criticou implicitamente os esforços do Federal Reserve, o bc americano, para estimular o crescimento da economia com gigantescas aquisições de títulos para baixar os juros de longo prazo, uma estratégia que a China já criticou publicamente antes, acusando-a de causar inflação em economias emergentes como a sua. Ele disse que a política monetária americana "tem um grande impacto na liquidez mundial e no fluxo de capital e, portanto, a liquidez do dólar deve ser mantida a um nível razoável e estável".

As respostas de Hu refletem uma China que se tornou mais confiante nos últimos anos – especialmente depois da crise financeira mundial, da qual o país emergiu relativamente incólume.

Hu reiterou a crença da China de que a crise espelhou "a ausência de regulamentação das inovações do setor financeiro" e mostrou que as instituições financeiras internacionais "não refletem totalmente a posição em mutação dos países desenvolvidos na economia e nas finanças mundiais".

Hu, que também comanda o Partido Comunista da China, raramente interage com a imprensa internacional. O "WSJ" enviou uma série de questões a Hu por meio do Ministério das Relações Exteriores da China. O "Washington Post" também enviou suas perguntas. O ministério devolveu respostas de Hu a sete perguntas – mas não respondeu aos questionamentos sobre o ganhador do Nobel da Paz Liu Xiaobo, que está preso no país, ou o poderio naval crescente da China, ou as denúncias de supostos ataques cibernéticos chineses, entre outras questões.

O criticismo velado de Hu ao Fed reflete a sensação nos países em desenvolvimento, também expressada pelo Brasil, de que a política monetária dos EUA está desvalorizando o dólar, motivando fluxos de capital no exterior e gerando inflação. A China e outros países em desenvolvimento gostariam que o Fed levasse em conta as consequências de suas decisões. As autoridades do Fed respondem que o dever do banco é impulsionar a economia americana, cuja saúde é do interesse da China e de outros países, que dependem muito do comércio e do investimento dos EUA.

Isso pode se tornar um confronto entre Hu e Obama. Os EUA culpam a desvalorização da moeda chinesa, e não as políticas do Fed, por piorar a competitividade e criar inflação em outros países.

Alguns dos comentários mais significativos de Hu têm a ver com o futuro do dólar e das taxas de câmbio. "O atual sistema monetário mundial é um produto do passado", disse ele, citando a primazia do dólar como principal moeda de reserva, do comércio e do investimento.

O comentário é o mais recente indício de que o futuro do dólar continua a ser uma preocupação nos mais altos escalões do governo chinês. Pequim teme que a relaxada política monetária dos EUA não apenas esteja alimentando a inflação, como vá corroer o valor das aplicações em dólar das vastas reservas internacionais chinesas, que chegaram a US$ 2,85 trilhões no fim de 2010.

O presidente do banco central da China, Zhou Xiaochuan, gerou uma polêmica internacional em março de 2009, quando sugeriu a criação de uma nova moeda sintética de reserva como alternativa ao dólar. Os comentários de Hu aumentam a impressão de que a China pretende desafiar a ordem financeira mundial criada após a Segunda Guerra principalmente pelos EUA, e dominada pelo dólar.

Hu chamou a atenção para o esforço cada vez maior da China de expandir o papel de sua própria moeda na economia mundial, descrevendo medidas recentes para expandir o uso do yuan no comércio e no investimento internacional – mas também admitiu que torná-lo uma moeda totalmente internacionalizada "será um processo relativamente demorado".

As medidas adotadas pela China já motivaram a criação de um próspero mercado cambial em Hong Kong de operações internacionais com o yuan, e são vistas como os primeiros passos para internacionalizar a moeda, em linha com a nova importância da China como a segunda maior economia mundial. Hu endossou com entusiasmo o que é descrito oficialmente como "programas pilotos". Eles "se encaixam bem na demanda do mercado, uma prova da rápida expansão na escala dessas transações", disse ele.

Hu não indicou mudanças no aspecto mais polêmico da política monetária da China: o câmbio.

O secretário do Tesouro dos EUA, Timothy Geithner, reiterou semana passada a posição americana de que o yuan forte é algo benéfico para a China, porque a ajudaria a conter a inflação, que se tornou um dos maiores riscos ao rápido crescimento da China, que é a base da recuperação da economia mundial. O yuan forte reduziria o preço das importações na moeda local chinesa.

Mas Hu descartou o argumento americano, afirmando que a China está combatendo a inflação com um pacote inteiro de medidas, como elevações nos juros, e dizendo também que "a inflação não pode ser o principal fator na determinação da política cambial".

Hu sugeriu ainda por cima que a inflação não é uma grande preocupação, afirmando que os preços estão "em geral moderados e controláveis". Ele acrescentou: "Temos a confiança, as condições e a capacidade de estabilizar o índice geral de preços".

Os EUA dizem que o câmbio real do yuan – a taxa de câmbio que leva em conta a inflação maior na China que nos EUA – está subindo a um ritmo anual de 10%. As autoridades do Tesouro americano já argumentaram para a China que suas opções são limitadas – ou ela valoriza a moeda para combater a inflação, ou a inflação vai efetivamente impulsionar o valor da moeda chinesa. (Colaboraram Jason Dean e Bob Davis)

________

Fonte:  The Wall Street Journal, no Valor Econômico