O SR. MAURÍCIO GRABOIS – Sr. Presidente, Srs. representantes, a Assembleia acaba de se manifestar, concedendo anistia aos trabalhadores que sofreram medidas disciplinares, por motivo de greves ou dissídios coletivos. A Casa também concedeu anistia aos insubmissos e desertores.

Cabe, agora, Srs. representantes, concedê-la a todos aqueles que cometeram crimes políticos, a fim de que seja pacificada a família brasileira; que não haja mais ressentimentos entre brasileiros e possamos entrar em novo período constitucional, sob um clima de fraternidade, de harmonia, de compreensão. Não podemos compreender que promulguemos a Constituição sem conceder anistia ampla e irrestrita a todos os que cometeram crimes políticos.

No art. 34, das Disposições Transitórias, não se concede anistia àqueles que praticaram delitos políticos.
Está assim redigido o dispositivo:
    
     “Ficam abolidas todas as restrições, ainda subsistentes, das anistias concedidas, até a data desta Constituição, a todos quantos hajam cometido crimes políticos, exceto no que respeita a vencimentos atrasados, indenizações, ou outras vantagens pecuniárias.”

Sem dúvida, o artigo concede anistia a quantos cometerem crimes políticos; entretanto, os §§ 1°, 2° e 3° a anulam completamente, assim como quem dá com uma das mãos e tira com a outra. Ficam sem efeitos todas as condições prescritas no texto do artigo.

A 18 de abril do ano passado, foi baixado o Decreto-lei n° 7.474, tido como de anistia, mas que não passava de simples libertação de presos políticos. E aqui nestes §§ 1°, 2° e 3°, com pequenas modificações, repete-se o Decreto de 18 de abril de 1945.

Assim, se ficam abolidas todas as restrições ainda subsistentes das anistias concedidas até a data desta Constituição, como é possível dizer-se, no § 1°, que os militares e funcionários civis da União e dos Estados ficarão agregados aos respectivos quadros, nos postos que ocupavam ao serem reformados, aposentados, excluídos ou demitidos, com todas as vantagens e prerrogativas a eles inerentes, até que se pronunciem, sobre a conveniência do seu aproveitamento definitivo, as comissões de que tratam os arts. 2° e 3°, do Decreto-lei n° 7.474, de 18 de abril de 1945?

O Sr. Caires de Brito – V. Exa. permite um aparte? Penso que V. Exa. devia chamar a atenção da Casa para as expressões: “até que se pronunciem, sobre a conveniência do seu aproveitamento definitivo, as comissões de que tratam os artigos”, e etc., etc. Ficaremos na mesma coisa.

O SR. MAURÍCIO GRABOIS – Perfeitamente. Muda-se, apenas, o rótulo, mantendo-se as condições existentes, porque manda que as comissões dêem parecer sobre a reversão ao Exército ou ao quadro do funcionalismo civil, de todos aqueles beneficiados pelo pretenso decreto de anistia de 18 de abril de 1945.

Além disso, o § 2° estabelece:

“Somente após veredictum favorável de tais comissões, em cada caso, aprovado pelo Poder Executivo, terão eles exercício de suas antigas funções de direito acesso aos postos superiores que lhes couberem por antiguidade.”

O Sr. Caires de Brito – V. Exa. dá licença para outro aparte? Acredito que não devemos confiar mais em tais comissões, dado que os pareceres por ela emitidos demonstram, muito longe do ideal da anistia, um profundo ódio que lhes não permitirá qualquer julgamento imparcial.

O SR. MAURÍCIO GRABOIS – V. Exa. está com a razão, porque essas comissões, têm, sistematicamente, denegado pedidos em favor dos beneficiados, que pertencem a determinada corrente política e favorece todos aqueles que pertenceram ao integralismo. Há poucos dias, voltou ao serviço da armada um oficial de Marinha, o Sr. Fernando Cockrane.

Assim, essa disposição não significa anistia; significa ódios, dissensão e desarmonia para a família brasileira. Não é este o conceito que formamos em nossa terra sobre anistia. É esquecimento de todos os acontecimentos, de todas as perseguições sofridas pelos que se levantaram contra o poder, e ao mesmo tempo o esquecimento por parte dos que estavam no poder, em favor daqueles que contra eles se levantaram.

O Sr. Campos Vergal – Lembro a V. Exa. o exemplo da política italiana, que ontem decretou anistia ampla a todos os políticos. Não há, portanto, razão para abrirmos mão desse novo crédito de confiança para inúmeros brasileiros. Não podemos construir uma era nova com ressentimentos e ódios do passado.

É preciso, portanto, que o Brasil novo seja fundamentado numa esperança e num crédito novo para todos os brasileiros.

O Sr.  Caires de Brito – A Constituinte de 1934 decretou anistia ampla.
 
O SR. MAURÍCIO GRABOIS – V. Exa. tem razão. Numa verdadeira democracia não se pode compreender anistia com restrições à sua pratica, porque essas restrições implicariam em negação da própria anistia. O artigo 34 é considerado como abolicionistas de todas as restrições ainda exigentes às anistias concedidas, mas o parágrafo terceiro diz:

     “Os que, em contrário, não devem ser aproveitados, voltarão definitivamente às situações anteriores de reformados, aposentados, demitidos ou excluídos, sem mais direito algum”.

Que anistia é essa, pela qual aquele que é beneficiado fica na condição de demitido, excluído e sem mais direito algum?

O Sr. Campos Vergal – Chama-se isso dar com uma mão e tirar com a outra.

O Sr. Caires de Brito – Direi mais: parece que dá, mas não dá.

O SR. MAURÍCIO GRABOIS – É justamente uma forma de ludibriar o povo dizendo que a anistia foi concedida nas “Disposições Transitórias”, porque nega a anistias a cidadãos brasileiros que lutam pela democracia, dão sua contribuição para o progresso de nosso povo e trabalham nesta Assembléia patrioticamente, para que tenhamos uma Constituição verdadeiramente democrática.

Não desejava aludir a casos pessoais, mas, meu companheiro de bancada deputado Gregório Bezerra, eleito pelo povo pernambucano, não pode voltar à sua condição de sargento do Exército, ao qual muito se orgulha de pertencer.

O Sr. Euclides de Figueiredo – O texto de que V. Exa. trata, do ato da “Disposições Transitórias”, é um pouco melhor, talvez bem melhor do que o texto do Decreto 7.474 , de 18 de abril de 1945. É certamente melhor, e recorda-se V. Exa. do que disse o nobre senador Carlos Prestes – que agora, por felicidade, entra no recinto e vai me ouvir – a respeito daquele decreto?

Primeiro, numa entrevista aos jornais, para a qual chamou todos os representantes dos diários cariocas e não sei se dos Estados à sua residência, agradeceu e louvou o ato do ditador promulgando o decreto; depois, conclamou o povo, no Estádio do Vasco da Gama, e mostrou seu grande desenvolvimento pela medida de clemência com que o ditador acabava de contemplar os presos políticos.

O Sr. Carlos Prestes – A palavra empregada não foi absolutamente clemência. Todos os atos têm seu momento histórico. Naquela ocasião, o fundamental no Brasil era a liberdade para os presos políticos. Não se tratava de anistia. Esta, dizíamos, a nação a concederá através de seus representantes, devidamente autorizados, numa Assembléia Constituinte.

O Sr. Euclides Figueiredo – Então V. Exa. aceitou o indulto?

O Sr. Carlos Prestes – Agora é o memento de se pronunciarem os representantes da nação.

O SR. MAURÍCIO GRABOIS – A 18 de abril, o então ditador punha em liberdade os presos políticos, e muitos democratas o acusavam de não ter dado a anistia. Chegou agora o instante de todos aqueles democratas que acusavam o ditador por esse motivo, concederem a anistia ampla, irrestrita.

Naquele momento, era um grande passo por em liberdade os presos políticos. Hoje, quando vamos entrar no regime democrático, é pouco; torna-se necessário decretar a anistia de maneira definitiva, passando uma esponja no passado. Não se pede clemência. É uma medida de pacificação da família brasileira, que reforçará o regime democrático e o prestígio da Assembléia Constituinte, bem como o próprio governo, que contará, desta maneira, com o apoio do povo nesse sentido.

O Sr. Lino Machado – Reunirá todos numa só família, vencidos e vitoriosos. Esta é a anistia que se deverá conceder.

O SR. MAURÍCIO GRABOIS – Apelo, portanto, Sr. Presidente, para todos os Srs. representantes, para o sentimento democrático da Casa, a fim de que consolidem a democracia, fazendo com que sejam suprimidos os parágrafos 1°, 2° e 3° e mantido o art. 34. (Muito bem; muito bem. Palmas).