Tombuctu – A primeira – e fácil – fase, da invasão pela imperialista França à sua ex-colônia de Mali, cujo alvo era, essencialmente, a expulsão dos combatentes islamitas das regiões central e norte do país, encerrou-se com o emprego dos 3.500 soldados franceses da força expedicionária enviada e incursões de caças-bombardeiros Rafale, nas três primeiras semanas da invasão, com custo econômico superior a 50 milhões de euros e custo em vidas de várias dezenas de soldados franceses, combatentes islamitas e civis.

Entretanto, as dificuldades apenas começam para a França, considerando que por um lado deve consolidar a recente recuperação de alvos estratégicos, como são as cidades de Gao, Kidal e esta, Tombuctu, e, por outro, as forças expedicionárias da invasão – não só a francesa, mas também a enviada pela Comunidade Econômica da África Ocidental (Ecowas) – deverão preparar-se para uma longa e incerta aventura, verdadeira “guerra de guerrilhas”, semelhante àquela que está sendo travada há mais de uma década pelos islamitas do Talibã no Afeganistão.

Em outras palavras, a evolução da invasão não está sendo considerada desde já como eficaz e bem sucedida, por mais que julgue a orgulhosa França que pode, depois de seu “sucesso” no front norte do país, avançar na rápida retirada das tropas de sua força expedicionária do Mali, entregando o bastão de comando tanto à tropa dos quase 6 mil soldados da Ecowas e à tropa dos cerca 2,2 mil do Chade, considerados os mais capazes e habituados a guerra de guerrilhas em condições de deserto.

Além disso, a França – que, por enquanto, tem só o “apoio moral” das outras potências imperialistas ex e neocolonialistas EUA, Grã-Bretanha e Alemanha – deverá convencê-las de que pode conservar o que já invadiu e reconquistou, assim como defender os interesses estratégicos sobre os incalculáveis recursos naturais – imensas jazidas de urânio, ouro, petróleo, gás natural e uma riquíssima coleção de minérios estratégicos – os quais, considera garantidos com sua nova invasão em 11 de janeiro deste ano.

Contudo, as outras potências imperialista e neocolonialistas que – até agora – haviam depositado seu apoio moral à França não retardarão a reivindicar-lhe um pedaço do bolo dos incalculáveis recursos naturais de Mali e de Niger, onde a poderosa empresa francesa de energia Areva possui e explora jazidas de urânio (contaminando com resíduo nuclear dezenas de pequenas cidades e aldeias), alimentando com o combustível as dezenas de usinas nucleares que funcionam na França.

“Oportunidades” para EUA

Observa-se que a bem sucedida primeira fase da invasão francesa em Mali já abriu o apetite das outras potências imperialistas – que até agora haviam depositado apenas “apoio moral” à França – para registrarem sua presença no Mali, Niger e Argélia.

Os EUA, por exemplo, já anunciaram a formalização de acordo com o presidente do Niger, Mahamadu Issoufou, para criação (perto das fronteiras com Mali e Argélia) de uma base de aviões não tripulados (drones) para operações de espionagem e bombardeios, a fim de, supostamente, monitorar as ações dos islamitas extremistas na região. Isto é, os EUA buscam, com a oportunidade da invasão ao Mali, construírem sua primeira grande base de aviões não tripulados, semelhante àquelas que já mantém em Marrocos, Senegal, Burkina Faso, Uganda e Djibuti.

Lenta e firmemente, os EUA aproveitam qualquer pretexto para aumentarem sua presença e mobilidade militar no continente africano, onde já mantêm sua primeira e gigantesca base aeronaval em Djibuti, no Chifre da África, distante cerca de 5 mil quilômetros do Mali.

Paralelamente, o Comando Militar Africano dos EUA (Africom) está preparando o aumento dos ativos de unidades de forças especiais que já mantém em países da África Central – República Democrática do Congo, República Centro-Africana e outros – igualmente possuidores de ricos recursos naturais como minérios estratégicos, diamantes, petroleo e gás natural.

Em meio a tantas evoluções, a necessidade de “estabilização” da situação no Mali, sob a lógica de envolvimento de outras tropas estrangeiras, ampliará, fatalmente, a invasão francesa, tornando-a multinacional, com a participação de mais potências imperialistas, ex e neocolonialistas, todas participantes de grupos imperialistas periféricos, assim como a China e países do Brics que ingressam com dinamismo na África, além da União Africana, a Comunidade Econômica da Africa Ocidental e a Comunidade Econômica dos Países da África Ocidental.

Não é por acaso que o presidente – em exercício – da União Africana e presidente de Benin, Thomas Yayi Bony, já pediu oficialmente a invasão de forças da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), das forças francesas que invadiram Mali, assim como a ajuda militar da Alemanha.

Igualmente, não é por acaso que o secretário-geral da Otan, Anders Fogh Rasmussen, apressou-se a definir como “importantíssimo o apoio dos EUA” na invasão da França ao Mali, e paralelamente convocou os demais países-membros da Otan para participarem “cobrindo vazios em setores de informações, contra-espionagem e monitoramento dos movimentos de adversários”.

Já no Conselho de Segurança da ONU começou a discussão para o envio – com as ostensivas bençãos dos EUA, Gra-Bretanha e Alemanha – de 3 mil a 5 mil “capacetes azuis” da ONU ao Mali. Simultaneamente, o ministro de Defesa da Alemanha, Thomas de Maiziére, anunciou que seu país está pronto a ajudar no abastecimento dos caças-bombardeiros franceses que operam no Mali, assim como oferecer considerável apoio enviando algumas centenas de “especialistas” para treinar as tropas francesas.

Urânio e gasodutos

O jornal francês Le Monde está divulgando declarações de autoridades francesas e de outros países europeus, as quais denunciam que a invasão ao Mali está ligada aos interesses vitais da França e da poderosa empresa francesa de energia Areva sobre as ricas jazidas de urânio existentes, tanto no Mali, quanto no Niger, onde há alguns dias foi realizada uma “intervenção” de comandos franceses, com a missão de enfrentarem possíveis ataques.

Em outra reportagem, o Le Monde destaca, caracteristicamente, a avaliação de Stéfan Lhomme, diretor do Observatório Nuclear de Paris, segundo a qual “a invasão ao Mali objetiva garantir o abastecimento da França em urânio, ao longo de um deserto sem fim que estende-se do norte do Mali até o interior do Niger (com uma imaginária interrupção pelas fronteiras existentes apenas nos mapas).

A mesma reportagem publica avaliação de articulista do jornal argelino El Watan, explicando que “a invasão deve-se, por lado, à existência de ricas jazidas de urânio, situadas nas proximidades do Mali com o Niger (quarto maior produtor de urânio no mundo) e, por outro, aos planos de grandes potências para criação de uma nova rede de oleodutos e gasodutos na região de Sehel”.

Finalmente, reportagem com avaliações de especialistas divulgada pelo site de notícias Atlântico, revela que “a provável suspensão e fim da produção de urânio no Mali e Niger causaria a destruição da poderosa empresa francesa de energia Areva, a qual retira das jazidas dos dois países 30% do urânio destinado a manter funcionando as usinas nucleares da França”.

A evolução total da aventura francesa no Mali, assim como a participação de outras potências imperialistas ex e neocolonialistas em todo o Continente Negro evolui em nível de antagonismo, tanto para a gigantesca riqueza de recursos naturais, que poderá ser o “respiro” no capital – local e estrangeiro – neste período de profunda crise capitalista, quanto, também, por sua importância geoestratégica. Entretanto, desta queda de braço entre capitalistas sairão perdendo os povos, aqueles que continuam desdenhando o poder capitalista.

João Belisario

Africa News Agency/Sucursal da África Ocidental.