O dilema dos Williams
As Organizações Globo, como se sabe, agora apoiam as manifestações do Movimento Passe Livre e as outras que se seguiram para protestar contra a inflação, a corrupção, a carestia, o aborto, a Copa das Confederações, a Copa do Mundo, o amor entre iguais, o casamento gay, a caça as baleias, a minissaia, os médicos cubanos, o pastor Feliciano e o terrível hábito de certos elementos de peidar sob as cobertas.
Ocorre que como esse apoio foi tardio e, pior, inaugurado com um mea culpa patético de Arnaldo Jabor, o Bufão do Jardim Botânico, pouca gente se convenceu ainda da repentina paixão dos Willians (Bonner e Waack) pelas massas.
Assim, tornou-se praticamente impossível aos repórteres da Globo comparecer aos protestos sem serem hostilizados pelos manifestantes. Até a tentativa de tirar os cubos com a identificação da emissora dos microfones se mostrou inútil. Sempre aparece um estraga prazeres para gritar: “É da Globo!”.
O jeito foi inaugurar uma ampla e ostensiva cobertura aérea, na qual apreensivos repórteres metidos em voos noturnos de helicóptero ficam, lá do céu, apontando o inferno na terra.
Engraçado é notar, ainda, que o apoio às manifestações acabou mudando o léxico das narrações. Antes, quando a linha editorial era, digamos, jaboriana, todos eram vândalos e desocupados. Agora que os protestos incluem as bandeiras do mensalão e da hiperinflação imaginária, quando localizam, lá do alto, os baderneiros quebrando vidraças e incendiando carros, os repórteres da Globo se referem a eles como “manifestantes mais violentos”.
E a câmara volta para o rosto visivelmente contrafeito de William Bonner.
A própria imagem da nação ultrajada.
Publicado em Carta Capital