Os plenários da Câmara e do Senado, assim como suas comissões, se apressam para responder à altura da dimensão das manifestações que ocorrem nas ruas do país nas últimas semanas. As pautas reivindicatórias são diversas e, muitas vezes, genéricas, mas o Governo Federal e o Congresso procuram focar em propostas que satisfação a exigência popular, no que diz respeito a serviços públicos de qualidade e combate à corrupção, principalmente.
O plenário do Senado aprovou nesta quarta-feira (26 de junho) projeto de lei que inclui as práticas de corrupção ativa e passiva, concussão, peculato e excesso de exação na lista dos crimes hediondos. Com isso, as penas mínimas desses crimes ficam maiores e eles passam a ser inafiançáveis. Os condenados também deixam de ter direito a anistia, graça ou indulto e fica mais difícil o acesso a benefícios como livramento condicional e progressão do regime de pena. O projeto agora segue para a Câmara.
O autor do projeto, senador Pedro Taques (PDT-MT), justifica que esses crimes são delitos graves praticados contra a administração pública que “violam direitos difusos e coletivos e atingem grandes extratos da população”. “É sabido que, com o desvio de dinheiro público, com a corrupção e suas formas afins de delitos, faltam verbas para a saúde, para a educação, para os presídios, para a sinalização e construção de estradas, para equipar e preparar a polícia, além de outras políticas públicas”, diz o autor do projeto.
O texto original de Taques, contudo, previa a qualificação como hediondo apenas para os crimes de corrupção ativa e passiva e de concussão (obter vantagem indevida em razão da função exercida). O relator do projeto, senador Álvaro Dias (PSDB-PR), incluiu em seu parecer também os crimes de peculato (funcionário público que se apropria de dinheiro ou bens públicos ou particulares em razão do cargo) e excesso de exação (funcionário público que cobra indevidamente impostos ou serviços oferecidos gratuitamente pelo Estado).
“Sem a inclusão do peculato e do excesso de exação, a proposição torna o sistema penal incoerente, pois não há razão justificável para considerar crimes hediondos a corrupção e a concussão e não fazê-lo em relação ao peculato e ao excesso de exação”, alega Dias.
O relator também acatou emenda do senador José Sarney (PMDB-AP) para incluir homicídio simples cometido de maneira qualificada na categoria de crimes hediondos. Sarney alegou que um crime praticado contra a vida está entre os mais graves e não poderia ficar fora da lista.
Foi aprovada ainda emenda do senador Wellington Dias (PT-PI) que aumenta a pena do crime de peculato em até um terço quando ele for considerado qualificado, ou seja, cometido por autoridades e agentes políticos.
Royalties para a educação
Os senadores aprovaram ainda nesta quarta-feira requerimento para que o projeto de lei que destina 75% dos royalties do petróleo para a educação e 25% para a saúde seja apreciado em regime de urgência no plenário da Casa. A matéria foi aprovada ontem pelos deputados, mas o presidente do Senado, Renan Calheiros, disse que ela precisa ser estudada pelos senadores porque foi aprovada uma emenda que inclui contratos já estabelecidos entre os que serão abarcados pelas novas regras.
A expectativa é que os senadores votem o projeto na próxima semana. A proposição é do Poder Executivo. O governo federal espera atingir a meta de aplicar 10% dos recursos do Produto Interno Bruto do país em educação utilizando o dinheiro dos royalties. O passe livre estudantil também seria garantido com essa verba, segundo projeto de lei apresentado pelo presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL).
Alíquota zero para transporte
A Câmara dos Deputados, por sua vez, aprovou hoje o projeto de lei que reduz a zero as alíquotas das contribuições para o PIS/Pasep e a Cofins incidentes sobre os serviços de transporte público coletivo rodoviário municipal, metroviário, ferroviário e aquaviário de passageiros. A proposta será analisada pelo Senado.
O projeto original, de autoria do deputado Mendonça Filho (DEM-PE), propunha a isenção das contribuições somente para o transporte coletivo público terrestre. No entanto, um acordo entre as lideranças ampliou a abrangência da proposta e os deputados aprovaram uma emenda substitutiva que estendeu a desoneração ao transporte aquaviário.
Com o intuito de reduzir o preço das passagens, a presidenta Dilma Rousseff editou no final do mês de maio a Medida Provisória (MP) 617, que reduz a zero as alíquotas da contribuição para o PIS/Pasep e Cofins incidentes sobre a receita decorrente da prestação de serviços de transporte coletivo. A redução a zero das contribuições está em vigor com a edição da MP, que não começou a ser analisada pela comissão mista do Congresso.
O texto aprovado pelos deputados deixa em aberto o prazo de validade da isenção fiscal. Inicialmente, o projeto de Mendonça Filho, apresentado no final de 2011, limitava a redução do benefício pelo prazo de cinco anos. Relator do projeto na Comissão de Viação e Transportes, o deputado Milton Monti (PR-SP) disse que a redução fiscal contribuirá para a melhoria do transporte público e que ela vai ao encontro das reivindicações das ruas.
“Estamos dando uma importante contribuição para que qualquer prefeito de capital ou de regiões metropolitanas não possa usar qualquer argumento de não redução de tarifas”, disse o líder do PT, José Guimarães (CE). Segundo ele, a aprovação do projeto é uma “importante contribuição” da Câmara para a diminuição ou congelamento das tarifas.
Comemoração nas ruas
Aprovada na madrugada desta quarta-feira pela Câmara dos Deputados, a destinação dos royalties do petróleo para educação e saúde foi comemorada por estudantes, movimentos sociais e governo. Especialistas do setor de petróleo e gás, no entanto, veem a aprovação, que ainda precisa ser confirmada pelo Senado, com cautela. De outro lado, segundo a Campanha Nacional pelo Direito à Educação, rede composta por mais de 200 organizações em todo o Brasil, a conquista é importante, mas insuficiente.
“Foi dado mais um passo. Um passo tão importante quanto todos os anteriores. Nada ainda está resolvido, mas caminhamos. E se é verdade que a estrada é longa, pois exigimos a universalização do direito à educação pública de qualidade para todos e todas, a disposição de percorrê-la, enfrentando todo e qualquer obstáculo, é ainda maior”, diz o movimento, por meio de nota.
As organizações agora pedem a aprovação do Plano Nacional de Educação (PNE), que defendem ser o “verdadeiro pacto pela educação pública”, proposto pela presidenta Dilma Rousseff em resposta às manifestações que ocorrem em todo o país. O PNE estabelece metas para serem cumpridas no setor até 2020, como a destinação de 10% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro para educação, e que atualmente está em tramitação no Congresso Nacional.
A destinação dos recursos dos royalties foi aprovada na forma de substitutivo ao Projeto de Lei 323/07. Ele destina 75% dos recursos dos royalties do petróleo para a educação pública, com prioridade para a educação básica, e 25% para a saúde. O governo queria que todos os recursos fossem destinados à educação.
De acordo com o relatório do substitutivo, serão garantidos R$ 295 bilhões à saúde e à educação até 2022. Antes, segundo o texto, com o projeto encaminhado pela presidenta Dilma Rousseff, seria destinado à educação somente R$ 25,8 bilhões em dez anos. Os números são uma projeção feita com base em números da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).
O ministro da Educação, Aloizio Mercadante, disse hoje que o governo respeitará a decisão final do Congresso. “O governo é favorável a 100% dos royalties do petróleo [para a educação], mas evidentemente respeitaremos a decisão do Congresso”, disse. Além disso, o ministro disse que o governo continuará debatendo o tema da destinação dos royalties do petróleo para a educação.
Segundo a União Nacional dos Estudantes (UNE), “essa vitória é também uma reparação histórica, já que o Brasil nunca investiu seus recursos naturais em prol do povo, da soberania e do seu real desenvolvimento. Foi assim em diversos ciclos de riqueza que tivemos, como o pau-brasil, o café e o açúcar”.
A União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes) prometeu acompanhar a votação da proposta no Senado. “O movimento estudantil emplaca mais uma bandeira que promete mudar os rumos do Brasil, ao torná-lo um país que prioriza a educação. Para a Ubes, essa é uma vitória construída por várias gerações. Já confirmando presença no Senado Federal, Casa para onde o texto será encaminhado para votação”, diz a entidade.
Já o professor da Fundação Getulio Vargas (FGV) no Rio de Janeiro, Omar Mourão, especialista em geopolítica, petróleo e gás, vê a aprovação com cautela. A aprovação, segundo ele, é positiva, pois é uma resposta ao movimento popular, impedindo que esses recursos possam ser usados de outra maneira. No entanto, pode gerar instabilidade no mercado por trazer preocupação às grandes operadoras e empresas estrangeiras interessadas em explorar o petróleo no Brasil. Ele diz que é possível que haja receio quanto à mudanças na obrigação das empresas.

Com informações da Agência Brasil.