Devido complicações para chegar na cidade, André Rubião, integrante do Centro de Estudos Sociais da América Latina na Universidade Federal de Minas Gerais e professor da Faculdade de Direito Milton Campos (FDMC), falou por Skype. O professor apontou para os sorteios democráticos como uma alternativa à crise de representação. O modelo era usado na Grécia Antiga – considerada o berço da democracia – e funcionava de forma que alguns cidadãos fossem escolhidos de forma aleatória para ocupar cargos de decisão. Os sorteios foram reformulados por intelectuais contemporâneos, de forma que no novo exemplo algumas pessoas fossem nomeadas para se reunir e deliberarem sobre assuntos referentes ao coletivo. A sugestão foi apresentada por Rubião como uma alternativa. “A perspectiva do sorteio democrático não pretende substituir a democracia participativa”, concluiu.

Benedito Tadeu César, diretor do Instituto de Pesquisas e Projetos Sociais (InPrO) apontou para o desencontro da representação política com seu contexto histórico e social, o que fica claro na atuação dos partidos no Brasil. “Há um desgaste da política nacional e dos partidos nacionais”, afirmou. O diretor relatou que foram as massas que criaram os partidos políticos que, por sua vez, criaram políticas sociais importantes. Contudo, hoje, é preciso buscar novas formas para um novo contexto. O modelo islandês não seria a resposta para os problemas brasileiros, mas é possível fazer uma reforma política no Brasil. O problema é pensar como uma nova constituinte pode ser feita.

Bernardo Gutiérrez, jornalista fundador da rede FuturaMedia.net, concordou com o apontamento de Celi sobre a ausência feminina no debate, mas discordou com a historiadora sobre o resto de seu discurso. Para ele, “nunca na Espanha os adolescentes foram tão políticos”. O jornalista acredita que a democracia participativa acontece na internet também. “A democracia é híbrida, analógica e digital”, afirmou. Para ele, os jovens não se identificam com os partidos eleitorais, mas o que fazem é profundamente político.

Gutiérrez apontou que os protestos estão sendo tratados no passado durante o seminário, mas que eles não acabaram ainda. Mencionou que enquanto, antes das manifestações, não se falava de política, atualmente, se comenta muito sobre o coletivo. Os protestos, para o jornalista, têm muito mais a ver com um movimento horizontal e plural do que com um ideológico. Antes da apresentação de Eirikur Bergmann, diretor do conselho institucional da Islândia, o moderador Daniel Bittencourt acrescentou ao discurso de Gutiérrez de que estamos vivendo a pós-política.

Bergmann, por sua vez, comentou que a direção para o futuro não é clara e há diferentes cenários para o futuro. Para o islandês, as crises nos Estados Unidos e na Europa abriram ideias alternativas e discursos alternativos. É em momentos como esse que novos modelos são desenvolvidos.

Bergmann mencionou o caso de seu país, como um exemplo de opções para as crises e as soluções. O milagre econômico islandês entrou em crise até o colapso em outubro 2008. Quando a população foi às ruas, reivindicou uma reforma constituinte, que incluísse possibilidades de participação nas decisões do Estado, diferente das democracias participativas tradicionais. Já a crise nos países árabes e no restante da Europa, por outro lado, resultaram em soluções que não foram pensadas a partir do aumento da participação popular. Pelo contrário, as medidas tomadas foram mais restritivas e conservadoras. Esse cenário, segundo Bergmann, parece reforçar a crise, não a econômica ou financeira, mas a da representação política.

No espaço aberto ao público, muitos discordaram da fala de Celi Pinto. A professora respondeu que a sua preocupação em relação aos movimentos é a capacidade deles em ir além. Para Celi, eles possuem uma limitação política, pois, com base nos movimentos feministas do final da década de 1970, as mulheres só conquistaram reivindicações importantes após a sua entrada no campo político das decisões. “O que não me convence é, aí, achar a solução para a crise que nós temos no mundo”, afirmou. César reafirmou que se está fazendo política no Brasil através das manifestações, mas as pessoas não enxergam isso, e ainda a veem como uma coisa ruim. Gutiérrez completou que os movimentos são internacionais, e o mundo encontra-se em um momento “glocal”, no qual o global se integra ao local. O problema seria a falta de transversalidade, da comunicação do governo entre esses dois ambientes. Bergmann encerrou apontando que a manifestação da população é um instrumento importante para a pressão de políticos tradicionais.

O Seminário Crise da Representação e Renovação da Democracia é um evento promovido pelo Gabinete Digital do Governo do Rio Grande do Sul. Nos dias 5 e 6 de setembro, no Palácio Piratini e na Casa de Cultura Mário Quintana, 25 convidados debatem sobre as possibilidades de renovação em instituições como o governo e a mídia, em resposta à insatisfação popular demonstrada pelas manifestações de junho ocorridas em todo o país.