Sim, porque como destaca a declaração da ONU, a agricultura familiar, além de garantir a segurança alimentar mundial preservando os alimentos tradicionais e assegurando uma alimentação balanceada, contribui decisivamente para a proteção da agrobiodiversidade e para o uso sustentável dos recursos naturais. Portanto, o meio ambiente só tem a ganhar com o estímulo ao desenvolvimento e expansão da agricultura familiar.

Pelo artigo 3º da Lei 11.326/2006, são agricultores familiares aqueles que praticam atividades no meio rural, desde que não possuam área maior do que quatro módulos fiscais (no caso de São Sepé, cada módulo fiscal equivale a 35 hectares) e utilizem predominantemente mão-de-obra da própria família em suas atividades econômicas.

Conforme o Portal do Ministério do Desenvolvimento Agrário (acesso em 03/06/2014) baseado nos dados do Censo Agropecuário do IBGE de 2006 – o último disponível – provêm da agricultura familiar os principais alimentos consumidos pela população brasileira: 87% da produção de mandioca, 70% do feijão, 46% do milho, 38% do café, 34% do arroz, 21% do trigo, 16% da soja, 58% do leite, 59% dos suínos, 50% de aves e 30% dos bovinos. No total, cerca de 70% dos alimentos consumidos no Brasil são produzidos pela agricultura familiar gerando 74,4% dos empregos no campo com absorção de 12,3 milhões de pessoas, apesar de ocupar apenas 24,3% da área de produção rural, em contraste com a agricultura não familiar que empregava apenas 4,2 milhões de pessoas (25,6% dos empregos) ocupando uma área de 75,7%. Não obstante essa grande importância, o Plano Safra 2013-2014 destinou ao agronegócio 136 bilhões de reais, reservando à agricultura familiar apenas 21 bilhões.

O outro destaque feito pela ONU à agricultura familiar está ligado à produção de alimentos livres de agrotóxicos. A esse propósito são impactantes os dois documentários produzidos pelo cineasta Silvio Tendler (“O veneno está na mesa” e “O veneno está na mesa 2”), ambos disponíveis no youtube. O primeiro denuncia a grande incidência de agrotóxicos nos alimentos consumidos pelos brasileiros agravada pelo fato de que o Brasil é o maior consumidor mundial dos chamados “defensivos agrícolas”, alguns dos quais permitidos somente em nosso país. E o segundo documentário apresenta a agricultura familiar como alternativa para que cheguem às nossas mesas alimentos livres de veneno.

Esperemos, enfim, que o objetivo da ONU de estimular os governos dos diversos países a formular e implementar políticas de incentivo à agricultura familiar seja, de fato, atingido no Brasil a fim de que possamos dispor de farta alimentação balanceada, livre de agrotóxicos e produzida sem agressão ao meio ambiente para saciar a fome dos treze milhões e seiscentos mil famintos que, segundo a FAO, vergonhosamente ainda existem em nosso país. Eis aí a forma consequente de não deixar passar em branco a proclamação de 2014 como o Ano Internacional da Agricultura Familiar.

*Pesquisador Emérito do CNPq.

(Publicado no Jornal “A Fonte”, de São Sepé – RS, Ano 13, nº 680, 07 de junho de 2014, p. 2-Opinião)