O filósofo alemão focalizou a Alemanha e a Europa após a derrota da tentativa revolucionária que lá se desenvolveu nos anos 1840. Nesta sua nova obra, Domenico Losurdo expõe e discute a abordagem histórica e filosófica de Hegel, que se revela atual e fecunda para situar os acontecimentos em nossos dias, após a capitulação e dissolução da União Soviética e os surtos de maior agressividade imperialista e avanço do fascismo que se seguiram, num quadro mundial de busca de novo projeto revolucionário para o proletariado.

Ficha Técnica

Autor(s): Domenico Losurdo
Tradutor: Jaime Clasen
ISBN: 9788571065086
Ano de Edição: 2014
Edição: 1ª. Edição
Número de Páginas: 400
Formato: 16 X 23
Idioma: Português

Hegel atual

João Carlos Graça

Domenico Losurdo é um dos mais importantes pensadores da viragem de século XX/XXI, constituindo a sua obra um dos mais notáveis empreendimentos de renovação e aprofundamento da tradição intelectual que se liga a Karl Marx. A respeito das especificidades do marxismo de Losurdo, e admitindo embora a necessidade de circunstancialmente desconsiderar aspetos todavia importantes (como os que encontram expressão no estudo sobre Heidegger e a “ideologia de guerra” alemã em 1914-18, na sua magistral biografia intelectual de Nietzsche, no livro de discussão da “lenda negra” associada a Stalin, no tratamento do caso do marxismo de Gramsci, etc.), é justo sublinhar aqui a atenção dada ao problema do eurocentrismo da análise, ou, noutros termos, a clara assunção da importância de ultrapassar a noção oitocentista de “povos sem história”, sem que todavia essa inclinação desemboque, em Losurdo, num qualquer culto pós-moderno da “diferença”, bem pelo contrário, dado que é integrada e balizada pelo fôlego acrescido do seu universalismo e da sua preocupação com o horizonte da “humanidade comum”.
Importantíssimo é igualmente o reconhecimento explícito, por Losurdo, das componentes “não-econômicas” dos dispositivos sociais de submissão, mesmo nas sociedades liberais-capitalistas típicas ou “maduras”, isto é, muito para além duma qualquer simples “acumulação primitiva do capital”. Na verdade, pode, segundo o filósofo marxista italiano, falar-se de um processo de simultâneas emancipação e “desemancipação” caracterizando a globalidade da história das sociedades liberais-capitalistas, sendo nesse contexto merecedoras de destaque a sua reformulação do conceito de “bonapartismo” e a apresentação da noção de “monopartidarismo competitivo”.
É também digna de relevo a consciência de Losurdo quanto à importância, para o marxismo realmente existente, de ultrapassar a sua carga messiânica, oficialmente apostada no “desaparecimento progressivo do Estado”, carga que o tem ao longo dos tempos tornado tendencialmente incapaz de absorver, reprocessando-as criativamente, as lições “liberais” da importância dos contrapesos políticos, do predomínio dos princípios do “Estado de direito” e afins.
Em paralelo com a alínea anterior, é enfim digna de nota a recuperação losurdiana da figura de Hegel para a tradição marxista, no âmbito de uma clara preocupação de ligar esta aos combates pela emancipação filiando-se conscientemente na revolução francesa. Quanto a isto, de tratamento análogo beneficiam na sua obra, embora em menor grau, os legados de Kant e de Fichte. É, porém, sobretudo à tradição filosófica filiando-se em Hegel que Losurdo apela para destacar, por exemplo, a importância da noção de “contradição objetiva”, bem como a consistente denúncia das tendências para a evasão deliberada da vida política, a qual encontra plena expressão nas figuras de “alma bela” e sobretudo de “hipocondria da antipolítica”, tal como neste volume  podemos confirmar abundantemente.
João Carlos Graça é Doutor em Economia e Agregado em Sociologia, Professor do Instituto Superior de Economia e Gestão – ISEG e investigador do Centro de Investigação em Sociologia Econômica e das Organizações – SOCIUS. O ISEG e o SOCIUS pertencem à Universidade de Lisboa.