Na noite de domingo (19), a Bolívia conheceu seu novo presidente. O candidato de direita do Partido Democrata Cristão (PDC), Rodrigo Paz, foi eleito para comandar o país. Venceu, no segundo turno, o ultraconservador Jorge Tuto Quiroga. A esquerda ficou pelo caminho ainda na primeira volta, em agosto.
Paz, senador e ex-prefeito de Tarija, protagonizou uma vitória histórica que encerra duas décadas de hegemonia do Movimento ao Socialismo (MAS), partido fundado e liderado pelo ex-presidente Evo Morales.
O presidente Lula falou das eleições boliviana nas redes sociais:
Encaminhei carta nesta manhã ao presidente eleito do Estado Plurinacional da Bolívia, @Rodrigo_PazP, parabenizando-o pela vitória no segundo turno das eleições do domingo (19).
A conclusão do processo eleitoral em clima de tranquilidade e harmonia demonstra o compromisso da…
— Lula (@LulaOficial) October 20, 2025
Uma das particularidades do caso boliviano foi a crise interna da esquerda nos últimos anos. A ruptura entre Morales e o presidente Luis Arce abriu caminho para o avanço da direita. O boicote de Morales ao governo de Arce acabou por enfraquecer o campo progressista e fortalecer a oposição conservadora.
Essa disputa fratricida é uma variável importante, é claro, mas não explica tudo. Como observa um dos principais intelectuais do marxismo latino-americano, Álvaro García Linera, a derrota da esquerda boliviana tem causas mais profundas. Segundo ele, a esquerda do país — e da região — deixou de promover novas reformas estruturais após o primeiro ciclo de transformações da chamada “onda rosa”. “O progressismo e as esquerdas estão condenados a avançar se quiserem permanecer. Ficar parado é perder”, argumenta Linera, que foi vice-presidente da Bolívia no governo Morales.
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A vitória da direita boliviana também se insere em uma tendência regional observada nos últimos três anos. Entre 2022 e 2025, a América Latina passou por 15 eleições nacionais. Em nove delas, a direita ou centro-direita saiu vitoriosa: Costa Rica (2022), Paraguai (2023), Equador (2023), Argentina (2023), El Salvador (2024), Panamá (2024), República Dominicana (2024), Equador (2025) e Bolívia (2025). Já a esquerda ou centro-esquerda triunfou em apenas seis: Brasil (2022), Colômbia (2022), Guatemala (2023), México (2024), Uruguai (2024) e Venezuela (2024).
É verdade que os três maiores países da região — Brasil, México e Colômbia — seguem sob governos de esquerda, mas o panorama geral mostra um avanço consistente das forças conservadoras em diversas nações.
No mês que vem, o Chile realiza seu pleito. Caso a candidata do Partido Comunista, Jeannette Jara, vença, o continente pode testemunhar um reequilíbrio entre os campos políticos. Mas, se o direitista José Antonio Kast sair vitorioso, será mais um indicativo do crescimento do conservadorismo neoliberal na América Latina.
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A eleição boliviana de 2025, portanto, não é um episódio isolado, mas parte de um novo ciclo político latino-americano em que a direita se reorganiza, explorando divisões internas das esquerdas e o desgaste de seus projetos históricos. O resultado das urnas na Bolívia sinaliza que o futuro da região dependerá da capacidade das forças progressistas de renovar suas agendas, recompor alianças e responder aos novos desafios sociais e econômicos que emergem neste século.
Theófilo Rodrigues é professor do Programa de Pós-Graduação em Sociologia Política da UCAM e coordenador do Grupo de Pesquisa da FMG sobre a Sociedade Brasileira.
Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial da FMG.