Deposição
Chegou em casa aperreado.
– Dinalva, você viu?
– Viu o que, excelência?
– Estava com ele até hoje de manhã!
– O quê, meu deus?
– Meu mandato.
– Não me diga que o senhor perdeu de novo, vossa indignicência?
– Não é que perdi, menina? Mas eu juro que saí com ele hoje de manhã.
– Não deixou no gabinete?
– Se tivesse deixado lá, não tinha perdido, criatura!
– Vossência não grita comigo não, que já tá sem imunidade!
– Ai, meu deus, e a imunidade foi junto!
– Pois foi. Então o senhor se acalme.
– Faça o seguinte: ligue pra paínho, na Bahia.
– Tá com ele.
– Não. Mas sabe um trabalho porreta pra mode achar.
– Alô. Excrescência? Aqui é Dinalva… Como vai? Vou bem, sim senhor. Não, perdeu o mandato. Como? É, já virou mania. É mesmo? Então tá. Brigada. Té logo.
– Então?…
– Ele disse que nutre a maior ternura pelo senhor; que acha uma malvadeza o que fizeram, mas que não pode ajudar. Neste momento, está de prontidão para não perder o seu.
– Meu o quê?
– O seu seu não, vossa demência, o seu dele. O mandato.
– Ai meu deus! Já sei: liga pro príncipe! Ele há de me ajudar.
– Sua esquecência me permita: agora quem governa é o sapo. O príncipe está em Paris.
– O que eu faço, Dinalva?
– Eu disse que renunciasse. Não quis me escutar. Agora espere e candidate-se.
– Qual é a próxima.
– Deixa ver… de síndico, daqui a dois meses.
– Não tem nada melhorzinho.
– O senhor está impedido por oito anos, vossa maledicência. Só síndico. Aproveita.
– Não. De síndico eu não quero!… O que cê está fazendo, Dinalva?
– As malas.
– Vai pra onde?
– Eu, pra lugar nenhum. Taqui o passe. Ah: toma – pro lanche.