Logo Grabois Logo Grabois

Leia a última edição Logo Grabois

Inscreva-se para receber nossa Newsletter

    Comunicação

    Noveleta (continuação)

          Sete da manhã. Na varanda da casa pequena, as plantas ainda se confundem com a penumbra. No oitão, calangos arriscam aparecer debaixo das folhas de abóbora pejadas de orvalho. No terreiro dos fundos, galinhas se inquietam. Para elas, há muito que o dia amanhecera. Onde os farelos?       Dona Maria já tinha preparado o […]

          Sete da manhã. Na varanda da casa pequena, as plantas ainda se confundem com a penumbra. No oitão, calangos arriscam aparecer debaixo das folhas de abóbora pejadas de orvalho. No terreiro dos fundos, galinhas se inquietam. Para elas, há muito que o dia amanhecera. Onde os farelos?

          Dona Maria já tinha preparado o café. Aguardava o pão e o leite que o menino Joseilton tinha ido buscar. Seu Antonio já tinha partido pra suas caminhadas. Quem tinha escola ou trabalho cedo, também já tinha ido. Ficaram na casa uns miúdos e a menina.

          A porta da cozinha se abre. Surge, ainda sonada, catando remela dos olhos e se escorando no batente, Maria – a menina. Apareceu com seus 17 anos num vestido de algodão florido, sua camisola daquela noite. Olhou para mãe, já na lida, e desviou o olhar para o descampado além do galinheiro. Tinha ido dormir tarde. Mas não tinha jeito: não conseguia ficar na cama até depois das sete. Dava a hora, acordava, sem precisar de relógio ou que a chamassem.

          Depois de algum tempo ali parada sem pensar em nada, foi ao banheiro. Aliviou a bexiga, limpou-se, lavou as mãos, pegou a pasta e a escova, fez sua higiene bucal, lavou o rosto, o pescoço, os braços. Enxugou-se. De volta ao quarto, tirou o vestido. Nua – não usava lingerie para dormir – buscou no armário calcinha, uma bermuda e uma camiseta. Vestiu-se. Desfez o coque dos cabelos encaracolados. Jogou-os para diante, penteou-os com os dedos, apanhou-os num rabo de cavalo e fez novo coque.

          Na cozinha, requentou o café. Joseilton já havia chegado. Tomou um pão, untou-o de margarina pouca, mergulhou-o no café amargo e fez seu desjejum.

          – Maria!

          – Oi!

          – Me ajude aqui!

          – Tô indo.

          Colocou a xícara na pia, molhou as mãos na torneira, saiu pro quintal enxugando-as no pano de prato.

          – Me ajude aqui com a roupa, minha filha. Vá me dando as peça.

          Maria se aproxima. Pelo canto do olho, sua mãe a mede de cima a baixo. Fecha a cara e ordena, fixando o lençol com o pregador.

          – Vá botar uma roupa, Maria.

          – Ih, minha mãe! Qué que tem essa que eu tô?

          – Tá é muito escandalosa, você sabe.

          – Mas eu tô em casa.

          – Mesmo assim.

          – Mas mãe!…

          Dona Maria pára de estender a roupa. Olha a filha. Meu deus, é uma mulher! Olha esses peito sem sutiã. Olha essas coxa, senhor! E essa bunda? Junta tudo isso com essa boca e esses óio, já viu: é a perdição.

          – Vá botar uma roupa, caminh.

          Maria sai pisando duro.

          – Não sei que peste tem essa roupa. Só tem em casa pai e os menino.

          Entra batendo a porta.

          – São parente, mas são homem, minha filha – responde a velha, baixo, já no segundo lençol. 

    Notícias Relacionadas