Desde outubro do ano passado, uma comissão de republicanos e democratas no congresso dos EUA tem causado acaloradas discussões nos meios digitais. Encabeçados pelo republicano Lamar Smith, os 12 parlamentares elaboraram um projeto de lei que reforça o poder de fiscalização do governo sobre o conteúdo veiculado pela rede.

Se aprovada, a norma dará amparo ao poder judiciário dos EUA para bloquear, em seu território, sites de busca, redes sociais e qualquer outro portal, nacional ou estrangeiro, que conduza o usuário norte-americano a conteúdo pirateado ou falsificado.

Especialistas em comunicação digital e gestão pública ouvidos pela reportagem do Opera Mundi levantam suspeitas e se opõem ao projeto que, para eles, incorre em “infração de soberania”.

“O rearranjo do capitalismo pela internet coloca a grande indústria em negação consigo mesma. Elas agora tentam usufruir do poderio político alcançado para manter a ordem em que foram estabelecidas”, afirma Rodrigo Savazoni, ativista da Casa de Cultura Digital.

Na opinião de Pablo Ortellado, professor da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da USP, esse “poderio político” não se restringe apenas ao território norte-americano. O que para ele está em discussão, é uma questão envolvendo a soberania dos outros países, já que os norte-americanos acabarão legislando sobre o mundo inteiro. “O maior impacto ocorrerá fora dos EUA. O SOPA é orientado para punir atividades internas, mas, para isso, terá que intervir em empresas de fora do país”, afirma.

Apple e Microsoft, grandes fabricantes de softwares receosos com as quebras de patentes de seus produtos, posicionam-se a favor do projeto. Outro grande gesto de apoio vem dos principais estúdios de Hollywood e do AFL-CIO, o maior sindicato dos EUA.

Bob Goodlatte, um dos republicanos que compõem o grupo de autores do projeto, disse, em outubro do ano passado, que a legislação criminal do país revela-se incapaz de abranger as novas tecnologias da informação, o que permitiria que “infratores internacionais roubassem a obra de empreendedores, inventores e autores” dos EUA.

Gigantes do universo online, por outro lado, dizem compreender as intenções do projeto, mas discordam da maneira como o documento foi apresentado. O Google divulgou em seu blog oficial que “apóia fortemente o objetivo do projeto de lei”, mas que, ao mesmo tempo, receia “que a maneira como ele está redigido no momento possa ameaçar a inovação, a geração de empregos e a liberdade de expressão”.

“No caso do Google, não é uma boa estratégia colocar-se contrário à propriedade intelectual, pois colocaria  a empresa em embate com a própria ordem capitalista. Para eles, aceitar os objetivos do projeto e questionar seus meios de execução é uma saída mais efetiva”, afirma Savazoni.

Uma das principais críticas ao SOPA é que ele colocaria em prática uma forte censura ao meio digital, podendo até mesmo interferir na privacidade dos 245 milhões de internautas no país. Além de prejudicar a geração de empregos no setor, o projeto também aproximaria o país da China no ranking das nações mais opressoras do meio virtual.

Cerca de 350 instituições se manifestaram contra esse “embate”, e endereçaram um apelo ao congresso dos EUA para que a nova regulamentação “aplique-se sobre aqueles que abusam do ecossistema da internet e semeiam lucros com o roubo da propriedade intelectual” do país. No grupo, estão nomes como News Corporation, Time Warner Inc., CBS Corporation e Nintendo of America Inc.

Ortellado afirma que a argumentação dessas grandes corporações é fraca, pois “não há provas empíricas de que o compartilhamento de arquivos exerça um efeito negativo sobre o comércio formal. A literatura séria, desvinculada das corporações, é ainda inconclusiva. A pirataria pode, em tese, até auxiliar o comércio regular”.

“A rede traz uma renovação das relações comerciais. Adaptar uma relação antiga a uma nova plataforma não dá certo. Nós não temos que mudar a internet, modificando a noção de ilícito. A internet nasceu livre, mas ela não continuará assim se nós não mudarmos nós mesmos antes. O que surge como ilícito hoje é distinto. A polêmica surge quando essas duas dimensões do “ilegal” chocam-se”, explica Savazoni.

Blecaute

EBay, Facebook, Wikimedia Foundation, Mozilla, LinkedIn e Twitter entraram em contato com o congresso norte-americano, pedindo para que a lei fosse reconsiderada pelos parlamentares. Na semana passada, Markham Erickson, diretor-executivo da Net Coallition, a associação que reúne as grandes companhias do universo digital, fez uma entrevista em que chegou a cogitar a possibilidade de que empresas do porte de Facebook, YouTube e Yahoo interrompessem seus serviços temporariamente em forma de protesto contra o SOPA.

Entretanto, nenhuma das grandes corporações que fazem parte da Net Coallition confirmou a afirmação de Erickson, feita durante uma entrevista ao canal Fox News. Não oficialmente, porém, segundo fontes dessas empresas, essa hipótese está completamente descartada.

Fonte: Opera Mundi