Lula: Gushiken merece desculpas do “jornalista canalha”
A presidenta Dilma Rousseff também se deslocou de Brasília para São Paulo, onde participou do último adeus ao ex-companheiro de governo e da militância partidária. Nesta manhã, Lula afirmou que o ex-ministro foi vítima de mentiras contadas por parte da imprensa, que agora deveria apresentar uma retratação formal pelo desgaste que provocou ao petista, morto ontem (13) vítima de um câncer. “O Gushiken foi uma das vítimas da mentira de uma parte da imprensa deste país. Eu sei o que o companheiro Gushiken sofreu com as infâmias que levantaram contra ele. Muitas vezes o irresponsável que levanta uma acusação sem ter provas não leva em conta a história das pessoas, que a pessoa tem mulher, tem filhos”, disse Lula durante encontro de integrantes do PT paulista na quadra do Sindicato dos Bancários de São Paulo, no Centro da capital.
Luiz Gushiken, que comandou a Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República após ser um dos coordenadores da campanha vitoriosa pelo Planalto em 2002, chegou a ser acusado de participação no episódio apelidado de ‘mensalão’. Apenas no ano passado, após sete anos da eclosão do caso, o Supremo Tribunal Federal (STF) considerou que não havia provas contra o ex-ministro. “Depois de sofrer tantos anos como ele sofreu, de um lado pela doença, de outro lado pela perseguição, quando provam que é inocente, pelo menos a imprensa que o acusou deveria ter vergonha na cara e publicar uma manchete amanhã pedindo desculpas ao Gushiken. Pedir desculpas não é feio para ninguém. Deveria o jornalista canalha que acusou Gushiken sem provas pedir desculpas”, desabafou o ex-presidente.
O ex-presidente abriu sua fala afirmando que cogitou cancelar sua participação no encontro depois da morte do amigo, recebida na noite passada quando voltava de Brasília. Os dois se conheciam desde o final da década de 1970, quando Lula comandava o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC e Gushiken fazia parte da direção do Sindicato dos Bancários de São Paulo, que assumiu em 1985. Os dois foram fundadores da CUT e do PT, e mais tarde, em 2002, Gushiken, já doente, foi chamado por Lula para ser um dos coordenadores da campanha à Presidência. Lula revelou que o companheiro lhe pediu poucos dias antes de morrer que trabalhasse para “recuperar” o partido.
“Nosso partido não pode ser um partido apenas para disputar eleição. Se fosse só para disputar eleição a gente não precisava ter criado um partido. Nosso partido foi criado para disputar eleição, mas foi criado sobretudo para a gente estar 24 horas por dia ajudando a organizar a luta do povo brasileiro. É para isso que existe um partido político”, lembrou o ex-presidente, que demonstrou insatisfação pelo fato de a sigla não encabeçar as manifestações ocorridas em junho em todo o país.
Lula olhou para o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, e recordou que foi ele quem introduziu, durante a campanha eleitoral do ano passado, a ideia de que a vida do povo brasileiro havia melhorado da porta de casa para dentro, ou seja, em termos de poder de consumo, mas não havia avançado da porta para fora, na prestação de serviços públicos. “Era um movimento que clamava por melhores condições de vida. Não importa quem foi e quem não foi, era o povo brasileiro. Não importava se gostava do PT ou não gostava, era o povo brasileiro. O dado concreto é que o povo foi às ruas clamar por melhores condições de vida. O que eu digo? Temos que aprender uma lição: o partido é que poderia estar puxando esses movimentos. E não é contra o nosso prefeito Fernando Haddad, não é contra a presidenta Dilma, contra o Lula. É a favor deles, é a favor do povo brasileiro”, disse.
“Serenidade ímpar”
Logo após o discurso de Lula, o Encontro da Região Metropolitana do PT de São Paulo foi encerrado, para que os presentes pudessem chegar ao velório de Gushiken. O encontro evento contou com a presença dos ministros da Saúde, Alexandre Padilha, do Planejamento, Miriam Belchior, e da Secretaria de Políticas para as Mulheres, Eleonora Menicurri, além de Haddad, de deputados federais e estaduais e de líderes sindicais.
Presidente do PT, Rui Falcão lembrou que Gushiken foi um homem “de extrema retidão, de uma serenidade ímpar, de uma sabedoria inigualável”, e também abordou o que considera uma injustiça. Em meio às denúncias, em 2005, o petista deixou a Secretaria de Comunicação Social, e ficou até novembro do ano seguinte como chefe do Núcleo de Assuntos Estratégicos. Na ocasião, em carta pública, ele afirmou que deixava o cargo para se defender, acusou haver uma tentativa de destruir reputações e disse que o clima político-eleitoral “envenenou o ambiente”.
“Com a nova fase que se configura na vida política do país delineia-se uma ampla renovação de dirigentes na administração pública federal, movimento natural e positivo para o seu segundo mandato”, acrescentou.
Para Falcão, trata-se de um “documento histórico, de desapego a cargos, de desprezo pelo poder a qualquer custo. Gushiken dizia que hoje no Brasil basta apenas uma acusação para se sentir culpado sem julgamento”. O presidente do PT afirmou que a sigla vive “dias semelhantes”, sem citação direta ao julgamento da Ação Penal 470 pelo STF.
Homenagem
O corpo do ex-ministro Luiz Gushiken começou a ser velado às 7h55 deste sábado (14). Ele morreu na noite desta sexta-feira, dia 13 de Setembro, aos 63 anos, no hospital Sírio-Libanês, em São Paulo. O ex-ministro das Comunicações do governo Lula e fazia tratamento contra câncer no estômago desde 2002 e morreu em decorrência da doença. Por volta das 8h30, chegou ao local o ex-presidente do PT e deputado federal por São Paulo José Genoino. Abatido, o deputado não quis gravar entrevista, mas ao sair, disse para as câmeras: “O silêncio fala por mim”.
Também amigo do ex-ministro, o senador Eduardo Suplicy (PT-SP) chegou ao velório às 8h50 e disse que o processo do “mensalão”, em curso no Supremo Tribunal Federal (STF), contribuiu para abalar ainda mais a saúde de Gushiken. Ele exerceu três mandatos de deputado federal pelo PT (1987-1990, 1991-1994 e 1995-1999).
Bancário, Gushiken foi fundador e dirigente do PT e da Central Única dos Trabalhadores (CUT). Exerceu a coordenação de campanhas presidenciais de Lula e, no ano passado, foi absolvido pelo Supremo Tribunal Federal (STF), por falta de provas, da acusação de crime de peculato no julgamento do mensalão. A absolvição de Gushiken foi pedida pelo então procurador-geral da República, Roberto Gurgel.
Gushiken foi formalmente acusado de peculato (delito cometido por servidor contra a administração pública), mas sempre negou as acusações, até ser inocentado e ter seu nome retirado do processo, sem por isso receber o pedido público de desculpas dos meios conservadores de comunicação que o acusaram.