Oceanos de sangue e lucros para os mercadores da guerra
Não o custo humano – 80 vidas num dia no Iraque, números não sabidos no Afeganistão, nenhum dia sem mortes em Israel/“Palestina” –, mas o custo financeiro. Ainda vivo obcecado pelo pedido dos sauditas, que exigiram seu dinheiro de volta, depois que Saddam Hussein invadiu o Kuwait em 1990. O rei Fahd da Arábia Saudita lembrou a Saddam que financiou sua guerra de oito anos contra o Irã, ao custo de espantosos $25.734.469.885,80. Foi muito generoso. Pagou pela custódia dos dois locais sagrados Meca e Medina. Foram mais de $25 bilhões entregues a Saddam para que massacrasse seus irmãos muçulmanos. Aqueles 80 centavos foram pura ganância.
Mas, falando em rapacidade, os árabes gastaram $84 bilhões subscrevendo a operação anglo-norte-americana contra Saddam em 1990-91 – três vezes o que Fahd pagou a Saddam pela guerra do Irã – e só a parte dos sauditas chegou, só ela, a $27,5 bilhões. No total, os árabes amargaram perda de $620 bilhões, por causa da invasão do Kwait pelo Iraque em 1990 – despesa quase toda reembolsada pelos EUA e aliados. Em agosto de 1991, Washington reclamava que a Arábia Saudita e o Kwait ainda deviam $7,5 bilhões. É como se as guerras do ocidente no Oriente Médio visassem tanto ao lucro quanto à vitória. Se o Iraque não tivesse sido o desastre que foi, talvez nos tivesse enriquecido. Se sauditas e Kwait pagassem suas dívidas, ajudariam os EUA a manter o constante derrame de dinheiro dos EUA nas desastrosas guerras de Israel.
Segundo o historiador israelense Illan Pappé, desde 1949 os EUA entregaram a Israel mais de $100 bilhões em doações e $10 bilhões em empréstimos especiais – mais do que Washington destina ao Norte da África, à América Latina e ao Caribe. Nos últimos 20 anos, Israel recebeu $5,5 bilhões para compras militares. Mas para avaliar a autodepredação dos EUA, é preciso considerar as perdas, dignas de Midas desatinado, em todo o Oriente Médio, só a partir de 1991 – estimados $12.000.000.000.000,00. Iéz, 12 trilhões secos. Se alguém duvidar, basta conferir num livrinho despretensioso que o “Strategic Fortnight Group” publicou há pouco tempo. Aquelas estatísticas chegaram a algumas manchetes, mas depois ficaram praticamente esquecidas, talvez porque tenham sido editadas na distante Mumbai, Índia, não por algum ignóbil “think-tank” (como eles dizem, e que eu, em vez de “centro avançado de reflexão”, prefiro chamar de “centro para funilaria de ideias velhas”[1]). Mas a publicação foi patrocinada, dentre outros, pelos ministérios de Relações Exteriores da Noruega e da Suíça. E os indianos são muito espertos com dinheiro, como sabemos, agora que todos tanto tememos sua nova super-economia.
E, dado que há à vista uma nova guerra Israel-Hizbollah, se considerarmos os custos astronômicos de todos aqueles F-16s, mísseis, “bunker-busters”, foguetes de fabricação iraniana, que destruíram fábricas, vilas, cidades, pontes, centrais de energia elétrica, terminais de petróleo libaneses –, nem nos sujaremos com os 1.300 patéticos mortos do Líbano e os 130 patéticos mortos de Israel na guerra de 2006, os quais, afinal, eram meros mortais –, para não falar do que se perdeu como renda do turismo e no comércio, dos dois lados. No total, o Líbano perdeu na guerra de 2006 estimados $3,6 bilhões; Israel, $1,6 bilhão – o que indica que, em termos de dinheiro, Israel saiu ganhando, apesar de o exército-ralé de Israel não ter deixado pedra sobre pedra por onde passou. Mas, entre os que pagaram por tudo isso há contribuintes norte-americanos (que financiam os israelenses) e contribuintes europeus. Potentados árabes e o doido do Irã (que financiam o Líbano).
Em outra palavras, o contribuinte norte-americano destrói o que o contribuinte europeu reconstrói. O mesmo acontece em Gaza: Washington financia as armas que explodem os projetos financiados pela União Europeia, e a União Europeia os reconstrói sempre a tempo de serem novamente destruídos. Mas, Oh! Sim!, na guerra do Líbano, os fabricantes de armas norte-americanos encheram as burras – quase tanto quanto os mercadores de mísseis iranianos e chineses.
Desagreguemos os números da guerra do Líbano de 2006. Pontes e estradas: $450 milhões. Fábricas: $419 milhões. Residências: $2 bilhões. Mas “instituições” militares: reles $16 milhões. Do que se sabe, o Hizbollah gastou $300 milhões. No total, as reconstruções consumiram $319 milhões, reparos na infra-estrutura, $454 milhões; vazamentos de óleo, $175 milhões. Para acrescentar um pouco de prazer sádico, somem-se os incêndios florestais ($4,6 milhões), deslocamento de civis ($52 milhões) e o aeroporto de Beirute ($170 milhões). O maior prejuízo de todos? No turismo, com perdas de $3-4 bilhões. Agora, Israel. O turismo perdeu $1,4 bilhão, “governo e serviços emergenciais” $460 milhões, businesses $1,4 bilhão, compensação paga $335,4 milhões, incêndios florestais $18 milhões. O que teriam o exército de Israel e o Hizbollah contra florestas? No total, os israelenses perderam 1,5% do PIB; os libaneses, 8% do PIB.
E quanto à “corrida armamentista” no Oriente Médio – cujos jóqueis são os fabricantes de armas e os apontadores são os países da região e, claro, as suas "huddled masses"[2]. A Arábia Saudita, como se lê no relatório de Mumbai, saltou, numa década, entre 1996 e 2006, de $18 bilhões para $30 bilhões ao ano – acaba de fechar negócio de $60 bilhões com os EUA – e o Irã, de $3 bilhões para $10 bilhões. Israel foi de $8 bilhões para $12 bilhões. De fato, há interessante correlação entre os mísseis ultra-modernos e de alma democrática, de Israel, disparados entre 2000 e 2007 – 34.050 – e os mísseis do Hamás, de alma terrorista, do mal: pífios 2.333.
Há várias preciosidades nessa apavorante lista de horrores financeiros e sociais. Dia 11/9/2001, havia apenas 16 nomes na lista de pessoas proibidas de embarcar em aviões nos EUA; em dezembro, eram 594. Em agosto de 2008, a lista incluía inacreditáveis 100 mil nomes. Nesse ritmo, em dois anos, a lista de “terroristas procurados” dos EUA alcançará 2 milhões de almas.
Desde 1974, os soldados da ONU que estão nas colinas de Golan para manter a paz custaram $47,86 milhões. E desde 1978, a ONU consumiu $680,93 milhões com seus soldados da paz, no sul do Líbano.
Em breve nesse canal, portanto, mais uma guerra perto de você; oceanos de sangue, cadáveres em pedaços, claro. Mas não esqueça de trazer o cartão de crédito, ou o talão de cheques. É big business. Há possibilidade de lucros.
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Fonte: The Independent, UK
Tradução: Caia Fittipaldi