NOTA DA REDAÇÃO: A partir de Marx e Engles, ou seja, da segunda metade do século passado, a arte militar vem recebendo o mais vigoroso impulso que, por fim, a transformou, com a genial colaboração de Lênin, na vigorosa ciência militar stalintsta de nossos dias.

Hoje, a ciência militar nos países socialistas e de democracia popular, bem como entre os povos que conduzem as lutas de libertação nacional, é estudada e aplicada por organizações militares nas quais não existem as irreconciliáveis contradições dos exércitos do mundo capitalista.

Ingressam definitivamente na história dos povos as organizações militares de novo tipo, que não mais trazem os fermentos de decomposição peculiares dos exércitos divididos em classes. Desde os mais rudimentares organismos de autodefesa, desde os mais simples destacamentos vermelhos das milícias operárias ou camponesas, até ao complexíssimo instrumento de paz que é o Exército Vermelho da União Soviética, a homogeneidade de interesses entre comandantes e comandados é tão completa, que tais forças armadas representam verdadeiros blocos monolíticos de doutrina e ação a aplicarem a nova ciência militar revolucionária.

A contribuição dos clássicos do marxismo — Marx, Engels, Lênin e Stálin — foi decisiva na elaboração dos novos métodos de luta dos povos que marcham na vanguarda da humanidade, neste século da revolução socialista.

Destacamos do inesgotável tesouro do marxismo-leninismo, alguns trechos focalizando o assunto e extraídos dos trabalhos dos quatro grandes mestres.

Sua divulgação entre nós, embora possua o cunho do ineditismo — pois os mesmos ainda não foram publicados em português — longe está, entretanto, de representar uma relação completa da inestimável colaboração de Marx, Engels, Lênin e Stálin, para a ciência militar socialista. Constitui, porém, pequena mostra que “Problemas”, ao divulgá-la, acredita estar prestando valiosa contribuição para um mais amplo conhecimento da obra dos mestres, no campo das lutas populares das classes oprimidas que lutam por sua libertação.

São sínteses maravilhosas das mais arrojadas idéias de organização e combate das forças populares no caminho da Revolução, sínteses expostas com a simplicidade e a precisão peculiares aos clássicos do marxismo-leninismo.

                                                        A Insurreição Como Uma Arte

C. Marx e F. Engels
(Do artigo “Revolução e contra-revolução na Alemanha”)

A INSURREIÇÃO é uma arte, exatamente igual à guerra ou a qualquer outra arte, e está submetida a certas regras de conduta que, se descuidadas acarretam a ruína do partido que deixou de observá-las. Estas regras, conseqüência lógica da natureza dos partidos e da natureza das circunstâncias com que se deve contar em semelhante caso, são tão palmares e simples que a breve experiência de 1848 com elas familiarizara, suficientemente, os alemães. Em primeiro lugar, nunca se deve brincar com a insurreição se não há a decisão de ir até o fim. A insurreição é uma equação de grandezas sumamente indefinidas, cujo valor pode mudar todos os dias As forças que se têm pela frente contam com todas as vantagens da organização, da disciplina e da autoridade tradicional; se os insurretos não puderem reunir forças superiores contra seu inimigo, a derrota e o esmagamento são certos. Em segundo lugar, uma vez começada a insurreição, é necessário agir com a maior decisão e passar à ofensiva. A defensiva é a morte de toda insurreição armada; na defensiva, a insurreição está perdida antes mesmo de medir suas forças com as do inimigo. Deve-se surpreender o adversário enquanto suas tropas ainda estão dispersas; deve-se conseguir cada dia novos triunfos, ainda que pequenos; deve-se manter a superioridade moral que o primeiro levante eficaz propícia; deve-se atrair os elementos vacilantes que seguem a parte mais forte e aderem sempre ao lado mais seguro; deve-se obrigar o inimigo a retroceder antes que possa reunir suas forças; em suma, falando com as palavras de Danton, o maior mestre de tática revolucionária que a história conhece: “audácia, audácia e sempre audácia!”.

(LONDRES, Agosto de 1852 — Publicado no “New York Daily Tribune” de 18 de Setembro de 1852).

                                                                      A Guerra de Guerrilhas

V. I. Lênin

A QUESTÃO das operações de guerrilhas interessa vivamente a nosso Partido e à massa operária. Já várias vezes tratamos deste assunto, superficialmente e de um modo acidental, mas agora nossa intenção é fazer, conforme o prometido, uma exposição mais de conjunto de nossas idéias.

                                                                                          I

Procedamos por ordem. Quais devem ser as exigências fundamentais de todo marxista na análise da questão das formas de luta? Em primeiro lugar, o marxismo se distingue de todas as formas primitivas do socialismo porque não vincula o movimento a uma única forma determinada de luta. O marxismo admite as mais diversas formas; além disso, não as “inventa”, mas limita-se a generalizar, a organizar, a tornar conscientes as formas da luta das classes revolucionárias que aparecem por si mesmas no decurso do movimento. Inimigo absoluto de toda fórmula abstrata, de toda receita doutrinária, o marxismo exige que se preste atenção à luta de “massas”, a qual, à medida que o movimento se estende, à medida que cresce a consciência das massas, à medida que as crises econômicas e políticas se acentuam, engendra procedimentos sempre novos e sempre mais diversos de defesa e de ataque. Por isto o marxismo terminantemente não renuncia a forma alguma de luta. O marxismo não se limita em caso algum às formas praticáveis e só existentes, num dado momento .admitindo a aparição inevitável de novas formas de luta, desconhecidas, dos militantes de um dado período ao mudar uma determinada conjuntura social. Neste sentido, o marxismo aprende, se assim se pode dizer, com a prática das massas, longe de pretender ensinar às massas as formas de luta inventadas por “sistematizadores” de gabinete. Sabemos — dizia por exemplo, Kautsky ao examinar as formas de revolução social — que a futura crise nos trará novas formas de luta que agora não podemos prever.

Em segundo lugar, o marxismo exige que a questão das formas de luta seja considerada sob um ponto de vista absolutamente histórico. Apresentar esta questão fora da situação histórica concreta é não compreender o ABC do materialismo dialético. Nos diversos momentos da evolução econômica, segundo as diferentes condições políticas, a cultura nacional, os costumes etc., aparecem, em primeiro plano, formas de lutas diferentes, tornam-se preponderantes formas de luta diferentes e, em relação com isto, se modificam, por sua vez, as formas de luta secundárias, acessórias. Querer responder sim ou não a propósito de um ou outro determinado procedimento de luta, sem examinar, detalhadamente, a situação concreta de um movimento dado, em dado estádio de seu desenvolvimento, significa abandonar completamente o terreno do marxismo.

São estes os princípios teóricos fundamentais que nos devem guiar. A história do marxismo na Europa ocidental nos oferece inúmeros exemplos que confirmam o que acabamos de dizer.

(V. I. Lênin, Obras completas, t.X, pág. 80, ed. russa Publicado no “Proletari”, n.° 5, 13 de Outubro de 1906).

                                                                  Da Defesa ao Ataque

V. I. Lênin

O CORRESPONDENTE especial do sisudo periódico conservador “Le Temps”, telegrafava de Petersburgo a esse periódico, à 21 de setembro:

“Na noite passada um grupo de 70 homens atacou a prisão central de Riga, cortou os fios telefônicos e, com a ajuda de escadas de mão, penetrou no pátio do presídio, onde, após encarniçada luta, morreram dois carcereiros e três ficaram gravemente feridos. Os manifestantes libertaram então dois presos políticos que estavam submetidos a Conselho de Guerra e que aguardavam a pena de morte. Durante a perseguição aos manifestantes, que conseguiram desaparecer, excetuados dois que foram aprisionados, morreu um agente e foram feridos vários policiais”.
Assim, pois, apesar de tudo, as cousas vão para a frente! O armamento das massas, apesar de incríveis e indescritíveis dificuldades, faz progressos. O terror individual, este engenho da debilidade dos intelectuais, queda na região do passado. Em lugar de gastar dezenas de milhares de rublos e uma massa de forças revolucionárias para matar qualquer Sérgio(1) — que levou Moscou ao campo da revolução quase tão bem como muitos revolucionários, — para matar “em nome do povo”, ao invés disto começam as ações militares juntamente com o povo. Eis aqui o que resulta quando os pioneiros da luta armada se fundem com a massa, não por meio de palavras, mas com fatos, se colocam à frente das equipes de combate e dos destacamentos do proletariado, educam ao fogo da guerra civil dezenas de chefes populares que, amanhã, no dia da insurreição operária, saberão ajudar com sua experiência e com seu valor heróico a milhares e dezenas de milhares de operários.

(V, I. Lênin, Ob. completas, t.VIII pags. 232-233, ed. russa Publicado no “Proletari”, n.° 18, de 26 de setembro de 1905).

                                      A Dissolução da Duma e as Tarefas do Proletariado

V. I. Lênin

…ESTAS “organizações militares”, se cabe expressar-se assim, e às quais nos referimos, devem tender a abarcar a massa, não através de representantes eleitos, mas através dos participantes diretos da luta de ruas e da guerra civil. Estas organizações devem ter como célula, grupos independentes muito pequenos, grupos de dez, de cinco e inclusive mesmo de três. Deve-se propagar intensamente que o combate se aproxima, no qual todo cidadão honrado está obrigado a sacrificar-se e a lutar contra os opressores do povo. Menos formalidades, menos papelório, mais simplicidade na organização que deve possuir a máxima mobilidade e flexibilidade. Todos e cada um dos que queiram figurar ao lado da liberdade devem unir-se imediatamente em grupos de combate “de cinco”, grupos independentes de homens de uma mesma profissão, de uma mesma fábrica ou de homens ligados pela camaradagem, por laços de partido e, enfim, simplesmente pela vizinhança (a mesma aldeia, a mesma casa na cidade ou um mesmo andar) . Estes grupos devem ser do Partido e também sem partido, ligados por uma mesma tarefa revolucionária imediata: a insurreição contra o governo. Estes grupos devem ser criados da forma mais ampla e inexcusavelmente antes de receber as armas, independentemente da questão das armas.

Nenhuma organização do Partido “arma” as massas. Pelo contrário, a organização das massas em pequenos grupos de combate de uma grande mobilidade prestará, no momento da luta insurrecional, um imenso serviço quanto à aquisição de armas.

Os grupos isolados de combate, os grupos de “milicianos”, para empregar o título que se tornou tão honroso nas grandes jornadas de dezembro em Moscou, prestarão um gigantesco serviço no momento da explosão. Uma milícia que sabe atirar, desarma um guarda municipal, ataca inopinadamente uma patrulha, conquista armas. Uma milícia de combatentes que não sabem atirar ou não conseguiram armas, ajudará a levantar barricadas, a fazer serviços de exploração, a organizar ligações, a preparar emboscadas contra o inimigo, a incendiar um edifício onde o adversário se tornou forte, a ocupar andares que possam servir de base para os insurrectos, em uma palavra, milhares de funções as mais diversas serão executadas por grupos isolados de homens decididos a uma luta de vida ou de morte que conheçam magnificamente o terreno e que estejam ligados da maneira a mais estreita com a população.

Que em cada fábrica, em cada sindicato, em cada aldeia, ressoe o chamado à organização de semelhantes equipes isoladas de combate. Os homens que se conhecem bem entre si, as criarão com antecipação. Os homens que não se conhecem entre si formarão grupos de cinco ou de dez, no dia da luta ou nas vésperas da luta, no lugar da luta, caso a idéia da formação de tais equipes se difunda com amplitude e seja realmente aceita pela massa.

No momento presente, quando a dissolução da Duma mobilizou novas e novas camadas, podeis ouvir freqüentemente os ecos e as declarações mais revolucionárias de representantes de camadas do povo simples das cidades, menos organizado, mais “arqui-reacionário” por sua fisionomia geral. Atendamos, pois, a que todos eles conheçam a decisão dos operários e camponeses avançados de promover imediatamente a luta pela terra e pela liberdade, que todos eles compreendam a necessidade de preparar milícias de combatentes, que todos eles adquiram a plena certeza da inevitabilidade da insurreição e do caráter popular da mesma. Então conseguiremos — e isto de forma alguma é uma utopia — que em cada grande cidade haja não centenas de milicianos, como em Moscou, em Dezembro, mas milhares e milhares. E então não haverá metralhadoras que resistam, como dizia o povo em Moscou, assinalando o insuficiente caráter de massas, a insuficiência de um mais estreito contato com o povo e a composição das equipes de combate daquela cidade.

Assim pois: organização dos Soviets de deputados operários, de Comitês camponeses e instituições análogas por todas as partes ao mesmo tempo que a mais ampla propaganda e agitação a favor da necessidade da insurreição simultânea, da preparação imediata das forças para a insurreição e da organização de destacamentos isolados de “milicianos” em massa.

(V. I. Lênin, Ob. compl. t. X -pág. 16-17, ed. russa. Escrito na terceira dezena de junho de 1906).

                               Ao Comitê Militar Anexo ao Comitê de São Petersburgo

V. I. Lênin

QUERIDOS camaradas: Agradeço-vos muito a remessa 1) do memorial do Comitê Militar e 2) das notas a respeito do problema da organização dos preparativos da insurreição — 3) os esquemas da organização. Após haver lido estes documentos, julguei ser de meu dever dirigir-me francamente ao Comitê Militar para um intercâmbio de opiniões entre camaradas. Não é preciso dizer que não vou examinar a focalização prática da questão; não pode haver dúvida de que se faz tudo o que é possível, dadas as rigorosas condições da Rússia. A julgar porém pelos documentos, existe o perigo de que a coisa degenere em burocratismo. Todos estes esquemas, todos estes planos da organização do Comitê Militar produzem a impressão de papelório oficialesco; rogo que me perdoem, pela franqueza, abrigo a esperança de que não suspeitareis de que haja em mim o desejo de estabelecer discussão. Em semelhante empreendimento, o que há de menos conveniente são os esquemas, assim como as discussões e conversações sobre as funções do Comitê Militar e sobre os direitos do mesmo. O que faz falta aqui é uma energia furiosa e nada mais que energia. Veio com espanto, viva Deus!, com espanto, que há mais de meio ano se está falando em bombas e ainda não se fabricou uma sequer! E aqueles que falam são pessoas bastante conhecedoras do assunto… Acudi à Juventude, senhores! Este é o único procedimento salvador. De outra forma, viva Deus! chegareis tarde (eu o vejo por todos os sintomas) e vos quedareis com apontamentos “muito sábios”‘, planos, desenhos, esquemas, fórmulas magníficas, porém sem organização, sem um trabalho vivo. Acudi à juventude. Criai, em seguida, equipes de combate em todas as partes, tanto entre os estudantes como particularmente entre os operários, etc. etc. Que se organizem, imediatamente, destacamentos de três a dez, a trinta ou mais homens. Que se armem eles próprios, imediatamente com o que cada um possa, este com um revólver, aquele com uma faca, aquele outro com um trapo impregnado de gasolina para provocar incêndios, etc. Que estes destacamentos imediatamente elejam seus dirigentes e se ponham em contato, segundo as possibilidades, com o Comitê Militar anexo ao Comitê de Petersburgo. Não exijais qualquer classe de formalidades, ride, por amor de Cristo, de todos os esquemas, e enviai, por Deus, a todos os diabos, todas essas discussões sobre “funções, direitos e privilégios”. Não exijais o ingresso obrigatório no POSDR(2): seria uma exigência absurda para a insurreição armada. Não recuseis entrar em contato com cada círculo, mesmo que seja de três homens, sob a única condição de que esteja resguardado da polícia e disposto a lutar contra o exército czarista. Que os círculos que o desejarem entrem para o POSDR, ou se declarem simpáticos ao POSDR, isto é magnífico; eu, porém, consideraria inquestionavelmente um erro exigir isto.

O papel do Comitê Militar, anexo ao Comitê de Petersburgo, deve consistir em: ajudar estes destacamentos do exército revolucionário, servir de “bureau” de ligação, etc. Todo destacamento aceitará gostosamente vossos serviços, porém se, nesta empresa começais com esquemas e com discursos acerca dos “direitos” do Comitê Militar, lançareis tudo a perder, eu vos asseguro e o lançareis a perder sem remédio.

Aqui é necessário agir realizando a mais ampla propaganda. Que cinco ou dez homens percorram por semana centenas de círculos de operários e estudantes, que se metam por toda parte onde possam, e por toda parte proponham um plano claro, conciso, concreto e simples: formai imediatamente um destacamento, armai-o com o que possais, trabalhai com todas as forças, nós vos ajudaremos com o que pudermos, porém não nos espereis, atuai por vós mesmos.

O centro de gravidade desta empresa é a iniciativa da massa dos pequenos círculos. Eles farão tudo. Sem eles todo o vosso Comitê Militar não ê nada. Estou disposto a medir a produtividade dos esforços do Comitê Militar pelo número de destacamentos desta natureza com os quais esteja em contato. Se ao cabo de um ou dois meses não houver, dependentes do Comitê Militar de Petersburgo, um mínimo de 200 a 300 destacamentos, em tal caso este Comitê Militar será um Comitê morto. Neste caso haverá que enterrá-lo. Na atual situação de efervescência, não recrutar centenas de destacamentos, significa permanecer a margem da vida.

Os propagandistas devem dar a cada um dos destacamentos fórmulas breves e multo simples para a fabricação de bombas, devem explicar da maneira mais elementar todos os tipos de trabalho a realizar e em seguida deixar que eles mesmos desenvolvam toda sua atividade. Os destacamentos devem imediatamente iniciar a instrução militar à base de operações imediatas, sem mais delonga. Alguns destacamentos, desde já, eliminarão um espião da polícia, provocarão a explosão de uma delegacia de polícia, outros empreenderão um assalto a um banco para a confiscação de meios destinados à insurreição, outros realizarão manobras ou levantamento de planos, etc. Obrigatoriamente, porém, se deve, em seguida, começar a aprender na prática: não temais estes ataques de experiência. Podem, naturalmente, degenerar em extremismo, porém esta é uma desgraça do dia de amanhã: hoje a desgraça reside em nossa rotina, em nosso doutrinarismo, na imobilidade própria de intelectuais, no temor senil a toda iniciativa. Que cada destacamento aprenda por si mesmo, ainda que não seja mais do que a surrar os guardas municipais: dezenas de baixas nossas serão recompensadas com juros, porque darão centenas de combatentes experimentados, que amanhã arrastarão consigo centenas de milhares.

Um forte aperto de mão, camaradas; desejo-vos êxito. Não imponho de modo algum meu ponto de vista, considero, porém, de meu dever levantar minha voz consultiva.

Vosso: Lênin

(V. I. Lênin, Ob. compl. t.VIII págs. 325-326, ed. russa. Escrito à 16 de outubro de 1905).

                           As Tarefas dos Destacamentos do Exército Revolucionário

V. I. Lênin

1) Ações militares independentes.

2) Direção da multidão.

Os destacamentos poderiam ser de todas as proporções, a começar por destacamentos de dois ou três homens.

Os destacamentos devem armar-se a si próprios com o que puderem (um fuzil, um revólver, uma bomba, uma faca, uma manopla, um pau, um trapo impregnado de gasolina para os incêndios, uma corda ou uma escada de corda, uma pá para a construção de barricadas, um petardo de piroxilina, arame farpado, pregos, — contra a cavalaria, — etc. etc.). Em caso algum porém esperar pela ajuda de outros, de cima, de fora, mas conseguir tudo por si mesmo.

Os destacamentos, tanto quanto possível, devem constituir-se de homens que vivam próximos ou que se encontrem com freqüência de maneira regular em horas determinadas, (o melhor seria uma e outra coisa, pois os encontros regulares podem ser interrompidos pela insurreição). A tarefa dos destacamentos consiste em organizar as coisas de maneira que nos minutos mais críticos, nas condições mais inesperadas, seus componentes possam estar juntos. Cada destacamento, deve, por isso, elaborar de antemão os métodos e os processos de ação conjunta: sinais nas janelas, etc., a fim de que possam encontrar-se uns aos outros com maior facilidade; gritos ou assovios convencionais para reconhecer um camarada entre a multidão; sinais convencionais para o caso de encontro à noite, etc., etc. Todo homem enérgico, com dois ou três camaradas, pode elaborar toda uma série de regras e processos semelhantes que devem ser formulados, bem aprendidos e treinados para aplicá-los. Não se deve esquecer de que há 99% de probabilidades de que os acontecimentos sobrevenham de surpresa e que será necessário agrupar-se em condições terrivelmente difíceis.

Mesmo sem armas os destacamentos podem desempenhar um papel muito sério:

dirigindo a multidão;
atacando em ocasiões propícias, um guarda municipal, um cossaco que fortuitamente ficou para trás (este caso se deu em Moscou), etc., e tirando-lhes as armas;
salvando os prisioneiros ou os feridos quando houver poucos policiais;
subindo ao alto das casas, aos andares superiores, etc., e jogando sobre as tropas pedras, água fervendo, etc.
Com energia, um destacamento organizado e bem municiado constitui uma força imensa. Em caso algum se deve renunciar à organização de um destacamento ou adiar sua formação com o pretexto de que faltam armas.

Os destacamentos devem, tanto quanto possível, determinar antecipadamente as funções, às vezes eleger de antemão o comando, o chefe do destacamento. Seria, naturalmente, pouco inteligente, cair no jogo das nomeações para os cargos, porém não se deve esquecer agigantesca importância de uma direção homogênea, de uma atuação rápida e decidida. A decisão, o brio, constituem as 3/4 partes do êxito.

Os destacamentos devem, imediatamente após serem formados, isto é, agora mesmo, empreender o trabalho em todos os aspectos, de forma alguma apenas o trabalho teórico, mas também e incondicionalmente, o trabalho prático. Por trabalho teórico entendemos o estudo da arte militar, o conhecimento dos problemas militares, a leitura de conferências sobre problemas militares, a organização de palestras a cargo de militares especialmente convidados (oficiais, suboficiais etc., etc., incluindo operários que tenham estado nas fileiras); leitura, estudo e assimilação de folhetos ilegais e de artigos de periódicos sobre o combate de rua etc., etc.

Os trabalhos práticos, repetimos, devem ser iniciados imediatamente. Dividem-se em operações preparatórias e em operações militares. Nas operações preparatórias estão incluídas a obtenção de toda espécie de armas e de toda espécie de projéteis, a procura de andares bem situados para a batalha de rua (adequados para luta a partir de lugares elevados, para depósitos de bombas ou de pedras, etc., ou de ácidos que devem ser jogados contra os policiais, etc., etc.; assim como locais adequados para a instalação de um Estado Maior, para o recebimento de informações, como refúgio para os perseguidos, para alojar feridos, etc., etc.). Além disso, entre os trabalhos preparatórios figuram os trabalhos de reconhecimento imediato, de exploração: conhecer as plantas dos presídios, das delegacias de polícia, dos ministérios, etc., conhecer a distribuição do trabalho nas instituições oficiais, nos bancos, etc., as condições de defesa, esforçar-se por estabelecer contatos que possam prestar serviços (um empregado na polícia, num banco, num tribunal, num presídio, nos Correios, nos Telégrafos, etc.), conhecer os depósitos de armas, todas as casas de armas da cidade, etc.. Neste sentido, o trabalho é imenso e, além disso, é um trabalho de tal natureza, que nele poderá prestar um enorme serviço toda classe de pessoas, mesmo totalmente inaptas para a luta de ruas, inclusive pessoas fracas, mulheres, adolescentes, velhos, etc. É necessário esforçar-se para agrupar, agora mesmo, nos destacamentos, indefectível e incondicionalmente, todos quantos “queiram” participar na causa da insurreição, pois “não há” nem pode haver uma pessoa que querendo trabalhar não traga um imenso benefício, inclusive mesmo quando não possua armas, mesmo quando seja pessoalmente incapaz para a luta.

Além disso, sem limitar-se unicamente, em caso algum, às ações preparatórias, os destacamentos do exército revolucionário devem com a maior rapidez possível, passar também às ações militares, com os seguintes fins:

treinamento das forças militares;
exploração dos pontos débeis do inimigo;
assestar no inimigo derrotas parciais;
libertação dos prisioneiros (detidos);
obter armas;
obter meios para a insurreição (seqüestro de recursos monetários do governo), etc., etc..
Os destacamentos podem e devem aproveitar agora mesmo toda ocasião propícia para realizar um trabalho vivo, não adiando as cousas de nenhum modo até a insurreição geral, pois sem uma preparação “no fogo” da luta não é possível tampouco adquirir a habilidade necessária para a insurreição.

Naturalmente, tudo que é levado ao extremo é mau; tudo o que é bom e útil levado ao extremo pode converter-se e inclusive, ultrapassando certo limite, obrigatoriamente se converte em um mal e em um prejuízo. O terror, em escala ilimitada, desordenado, não preparado, só pode, levado ao extremo, fragmentar as forças, esbanjá-las. Isto é certo e naturalmente não se deve esquecer. De outro lado, porém, não se pode esquecer em caso algum que, agora, a palavra de ordem, da insurreição “já está dada”, a insurreição “já começou”. Começar o ataque em condições favoráveis constitui não apenas um direito, mas a obrigação direta de todo revolucionário. A execução dos traidores, dos policiais, dos “gendarmes”, a explosão das delegacias de polícia, a libertação dos detentos, o seqüestro dos recursos pecuniários do governo, para invertê-los em atender às necessidades da insurreição: tais operações já se realizam em todas as partes onde arde a chama da insurreição, na Polônia, no Cáucaso, e cada destacamento do exército revolucionário deve estar imediatamente disposto para semelhantes operações. Cada destacamento deve recordar que, deixando passar hoje uma ocasião propícia que se apresenta para levar a cabo uma tal operação, este destacamento torna-se culpado de uma “inatividade imperdoável”, de passividade, e uma culpa desta natureza é o maior crime áe um revolucionário em época de insurreição, a maior vergonha para todo aquele que aspira à liberdade, não por palavras, mas com os fatos.

Quanto à composição destes destacamentos pode-se dizer o seguinte: O número de membros que desejem fazer parte dele e a determinação de suas funções, a própria experiência o indicará. Os próprios destacamentos têm que começar a elaborar esta experiência, sem esperar diretivas de fora. Deve-se pedir, naturalmente, à organização local revolucionária a remessa de um revolucionário que seja militar para realizar conferências, palestras, conselhos, porém, na falta de um militar, isto deve ser feito, sem falta e de modo obrigatório, pelos próprios destacamentos.

No que se refere à filiação partidária, os membros de um partido, naturalmente, preferirão agrupar-se em um mesmo destacamento. Não se deve, porém, opor obstáculos insuperáveis à entrada nos destacamentos de membros de outros partidos. Precisamente aqui é que devemos realizar a unificação, o acordo prático, (sem qualquer espécie de fusão de partido, entende-se) do proletariado socialista com a democracia revolucionária. Aquele que se queira bater pela liberdade e demonstre com fatos sua disposição, pode ser contado entre os democratas revolucionários, e com ele se deve esforçar-se por trabalhar conjuntamente na preparação comum da insurreição (naturalmente, com a condição de haver plena confiança em relação à pessoa ou ao grupo de que se trate). Todos os outros “democratas” devem ser afastados rigorosamente, como quase-democratas, como charlatães liberais nos quais não cabe confiar e em relação aos quais seria criminoso, por parte dos revolucionários, manifestar credibilidade.

Naturalmente, é de desejar a unificação dos destacamentos entre si. É extraordinariamente útil a elaboração de formas e condições de uma atividade conjunta. Em caso algum, porém, se deve, ao fazê-lo, cair no extremo de traçar planos complicados e esquemas gerais e de retardar o trabalho vivo devido a pedantescas elucubrações, etc. A insurreição, inevitavelmente terá, lugar sob condições em que os elementos desorganizados serão mil vezes mais numerosos que os organizados; são inevitáveis os casos em que terão que atuar imediatamente, no local, dois homens, ou um homem só, e que deve preparar-se para atuar por sua própria conta e risco. As dilações de tipo burocrático, as discussões, os retardamentos, a indecisão, são a morte da insurreição. A mais alta decisão, a maior energia, a utilização imediata de todo momento propicio, o avivamento instantâneo da paixão revolucionária da multidão, a condução desta para ações mais elevadas e mais resolutas: tal é o primeiro dever de um revolucionário. Uma ação militar magnífica que “instrui” os soldados do exército revolucionário, dando-lhes o batismo de fogo, e que presta um imenso serviço à revolução é a luta contra os elementos das “Centúrias Negras”. Os destacamentos do exército revolucionário devem, imediatamente, averiguar quem, onde e como forma as “Centúrias Negras”, e depois não se limitarem apenas à propaganda, (isto é útil, porém isto só é pouco), mas atuar também com a força armada, espancando tais elementos, matando-os, fazendo explodir suas sedes e Estados Maiores, etc., etc.

(V. I. Lênin, Ob. comp. T. VIII págs. 327-330, ed. russa). (Escrito em fins de outubro de 1905).

                                                 

                                                  Conselhos de Um Ausente

V. I. Lênin

ESCREVO estas linhas à 8 de outubro, com pouca esperança de que cheguem às mãos dos camaradas de Petrogrado para o dia 9. É possível que já cheguem tarde, pois o Congresso dos Soviets da região do Norte está convocado para o dia 10 de outubro. Tentarei, entretanto, acudir com meus “Conselhos de um ausente”, para o caso de que a provável ação dos operários e soldados de Petrogrado e de todos seus “arredores” se realize breve, porém, que ainda não se haja realizado.

Que todo o Poder deve passar aos Soviets, é evidente. Da mesma forma, deve ser indiscutível para todo bolchevique que um Poder revolucionário proletário (ou bolchevique, o que hoje é uma só e única cousa) teria assegurado maiores simpatias e o apoio abnegado dos trabalhadores e explorados do mundo inteiro, em geral, dos países beligerantes em particular, e sobretudo, dos camponeses russos. Não há por que deter-se nestas verdades, conhecidas de todo o mundo e já provadas de há muito tempo. Contrariamente, há por que deter-se em algo que seguramente não é de todo claro para todos os camaradas, a saber: que a passagem do Poder aos Soviets significa hoje, praticamente, a insurreição armada. Poderia acreditar-se que isto é algo evidente, e, entretanto, nem todos pararam ou param para meditar sobre isto. Renunciar hoje à insurreição armada equivaleria a renunciar à palavra de ordem mais importante do bolchevismo (todo o Poder aos Soviets) e a todo o internacionalismo revolucionário-proletário em geral.

A insurreição armada, porém, é um aspecto especial da luta política, submetido a leis especiais, que devem ser profundamente analisadas pela reflexão. Carlos Marx dava a esta verdade uma expressão extraordinariamente plástica ao escrever que

“a Insurreição armada é como a guerra, uma arte”.
Dentre as normas mais importantes desta arte Marx destaca as seguintes:

Não brincar nunca com a insurreição e, uma vez começada, saber firmemente que se deve levá-la a termo.
Deve-se concentrar no lugar e no momento decisivo forças muito superiores às do inimigo; do contrário, este, melhor preparado e organizado, aniquilará os insurrectos.
Uma vez a insurreição começada, deve-se proceder com a maior decisão e tomar infalivelmente, incondicionalmente, a ofensiva. “A defensiva é a morte da insurreição armada.”
Esforçar-se por colher o inimigo desprevenido, escolher o momento em que suas tropas se achem dispersas.
Esforçar-se por obter êxitos diários, ainda que sejam pequenos, (inclusive poder-se-ia dizer que a cada hora, quando se trata de uma única cidade), mantendo a todo custo a “Superioridade moral”.
Marx resume os ensinamentos de todas as revoluções, quanto ao que se refere à insurreição armada, citando as palavras de “Danton, o maior mestre de tática revolucionária, que a história conhece: Audácia, audácia, e sempre audácia!”.
(V. I. Lênin. Ob. Compl., t. XXI, págs. 319-135, ed. esp.) (Escrito à 21 de outubro de 1917).

                                        A Insurreição Armada e Nossa Tática

J. Stálin

O MOVIMENTO revolucionário “já atingiu no momento atual um ponto tal que torna necessária a insurreição armada”: este pensamento, expresso pelo terceiro congresso do nosso partido é, cada dia, mais confirmado. A chama da revolução arde sempre mais forte, suscitando aqui e ali insurreições locais. Três dias de barricadas e de combates de ruas em Lodz, uma greve de muitas dezenas de milhares de operários em Ivanovo-Voznesiensk, com inevitáveis encontros sangrentos com tropas, insurreições em Odessa, “motim” na frota do Mar Negro e das equipagens da frota de Libau, a “semana” de Tiflis, são todos presságios da tempestade que se avozinha. Essa se aproxima, se aproxima de modo irresistível e, se não hoje, amanhã, desabará sobre a Rússia e atingirá em cheio, qual poderosa torrente purificadora todas as coisas velhas e putrefatas, libertará o povo russo de seu opróbrio multissecular, que se chama autocracia. Os últimos esforços convulsivos do czarismo — a intensificação de todos os meios de repressão, o haver posto metade do país sob estado de sítio, a multiplicação das forças e, ao mesmo tempo, os discursos demagógicos dirigidos aos liberais e as promessas falsas de reformas não o salvarão de seu destino histórico. Os dias da autocracia estão contados, a tempestade é inevitável. Nasce já uma ordem nova, saudada por todo o povo, que dela espera a renovação e o nascimento.

Que novos problemas põe diante de nosso Partido esta tempestade que se avizinnha? Como devemos adaptar a nossa organização e a nossa tática às novas exigências da vida, para ter uma participação mais ativa e organizada na insurreição, que constitui o único e necessário início da revolução? Para dirigir a insurreição devemos nós, fração de vanguarda daquela classe que não é somente uma vanguarda, mas também a principal força operante da revolução, criar organismos especiais ou, para este fim já é suficiente o mecanismo atual do partido?

Há já alguns meses que o Partido se acha diante de tais problemas, que exigem uma solução urgente. Para aqueles que têm o culto da “espontaneidade”, que aviltam a função do Partido a um simples seguir o curso da vida, que se arrastam à cauda e não marcham à frente, como é próprio da fração consciente de vanguarda, tais problemas não existem. A insurreição é espontânea, dizem eles, não é possível organizá-la e prepará-la; qualquer plano de ação elaborado com antecedência é uma utopia (eles são contra qualquer “plano” pois que é “consciência” e não “fenômeno espontâneo”!), um inútil desperdício de forças; a vida social tem as suas vias imperscrutáveis, e ela reduzirá a cacos todos os nossos projetos. Por isso nós, dizem, devemos limitar-nos somente à propaganda e à agitação da idéia da insurreição, da idéia do “auto-armamento” das massas; devemos conseguir somente a “direção política”: o povo insurrecto que o dirija, “tecnicamente”, quem quiser.

Nós, porém, temos de fato exercido sempre até agora tal direção! — objetam os adversários da “política seguidista”. É evidente que uma ampla agitação e propaganda, que uma direção política do proletário são absolutamente necessárias. Limitarmo-nos, porém, a essas tarefas gerais significa que queremos fugir à questão colocada pela própria vida, ou que revelamos uma incapacidade completa para adaptar a nossa tática às exigências da luta revolucionária em desenvolvimento impetuoso. Entende-se que devemos neste momento decuplicar a agitação política, que devemos esforçar-nos para submeter à nossa influência não apenas o proletariado, mas também aquelas inúmeras camadas do “povo” que pouco a pouco se aproximam da revolução, que devemos esforçar-nos para popularizar entre todas as classes da população a idéia da necessidade da insurreição. Mas não podemos limitar-nos somente a isto! A fim de que o proletariado possa utilizar para os objetivos da sua luta de classes a revolução que se aproxima, a fim de que possa instaurar aquela ordem democrática que mais do que qualquer outra assegure a luta conseqüente para o socialismo, é indispensável que o proletariado, em torno do qual está a oposição que o comprime, não somente se ache no centro da luta, mas se torne também chefe e dirigente da insurreição. Além de que a direção técnica e a preparação organizativa da insurreição em toda a Rússia, constituem a tarefa nova que a vida pôs diante do proletariado. E se o nosso Partido quer ser o dirigente político efetivo da classe operária, não pode e não deve recusar-se a cumprir estas novas tarefas.

O que devemos fazer, portanto, para atingir esta meta? Quais devem ser os nossos primeiros passos?

Muitas organizações nossas já resolveram praticamente o problema, empregando uma parte das próprias forças e dos próprios meios para armar o proletariado. A nossa luta contra a autocracia já entrou agora em um período no qual a necessidade do armamento é por todos reconhecida. É certo, porém, que somente a consciência da necessidade do armamento não basta, é necessário colocar para o Partido a tarefa prática de modo claro e direto. Por isso os nossos comitês devem agora preparar-se sem demora para armar o povo localmente, para criar grupos especiais para executarem este trabalho, para organizar grupos de distrito para buscarem as armas para si, para organizar laboratórios para a preparação de várias substâncias explosivas, para elaborar um plano de ocupação dos depósitos de armas e dos arsenais particulares e estatais. Não somente devemos armar o povo com o “ardente desejo de auto-armamento”, segundo nos aconselha a nova “ISKRA”, como devemos também “tomar as mais enérgicas medidas para armar o proletariado”, segundo o compromisso que nos fez assumir o terceiro congresso do Partido. Para resolver tais problemas nos é mais fácil do que qualquer outra cousa chegar a um acordo, seja com a fração que se destacou do partido (se essa pensa de fato de modo sério no armamento e não se limita a cacarejar com o “ardente desejo do auto-armamento”), seja com as organizações social-democráticas nacionais, como por exemplo os federalistas armênios e outros que se atribuem estas mesmas tarefas. Uma tentativa do gênero já se viu em Bakú, onde, depois do massacre de fevereiro, o nosso comitê, o grupo de “Balakhano — Bibi-Eibat” e o comitê dos ghnciakistas(3) elegeram entre os próprios membros uma comissão organizadora para o armamento. É absolutamente necessário que este trabalho difícil e de grande responsabilidade seja organizado com um esforço geral e lembremo-nos que os cálculos dos fracionístas devem ser o menos possível obstáculos para a união de todas as forças social democráticas neste terreno.

Concomitantemente com o aumento das reservas de armas e com a organização de sua procura e de sua preparação em fábricas especiais, é necessário dedicar a mais séria atenção à criação de toda a sorte de equipes de combate para a utilização das armas que se venha a possuir. Em caso algum se devem permitir ações tais como a palavra de ordem das armas diretamente às massas. Uma vez que temos poucos meios e é muito difícil esconder as armas ao olho vigilante da polícia, não se chegará a armar camadas mais ou menos consideráveis da população e nossos esforços cairão no vazio. Completamente diferente será quando tivermos criado uma organização especial de combate. As nossas equipes de combate aprenderão a fazer bom uso das armas; no curso da insurreição — comece esta espontaneamente ou seja preparada com antecedência — agirão como frações principais e de vanguarda, em torno delas se reunirá o povo insurrecto e sob a sua direção irá ao combate. Graças à sua experiência e capacidade organizativa, e graças também ao bom armamento, será possível aproveitar todas as forças do povo insurrecto e atingir assim os objetivos imediatos: o armamento de todo o povo e a realização de um plano de ação elaborado com antecedência. Elas ocuparão rapidamente os diversos depósitos de armas, as instituições governamentais e sociais, o correio, o telégrafo, etc., o que será indispensável para o posterior desenvolvimento da revolução.

Mas estas equipes de combate não são necessárias somente quando a insurreição revolucionária já se estendeu a toda cidade; a sua função não é menos importante também nas vésperas da insurreição. Durante os últimos seis meses nos persuadimos claramente que a autocracia, desacreditada aos olhos de todas as classes da população, concentrou toda a sua energia em mobilizar as forças reacionárias do país, seja os mercenários profissionais, seja os elementos menos conscientes e fanatizados dos tártaros, para lutar contra os revolucionários. Armados pela polícia e sob sua proteção, esses aterrorizam a população e criam uma atmosfera perigosa para o movimento de libertação. As nossas organizações de combate devem estar sempre prontas a opor a devida resistência a todas as tentativas destas forças obscuras e esforçar-se para transformar o ódio e a resistência suscitados por sua ação em um movimento contra o governo. As equipes armadas de combate, prontas a qualquer momento a ganharem a rua e porem-se à frente das massas populares, podem facilmente atingir a meta colocada pelo terceiro congresso, “organizar a resistência armada ao ataque das Centúrias Negras e de todos os elementos reacionários em geral, dirigidos pelo governo” (“Resoluções sobre a tática do governo às vésperas da revolução. Veja Informações)(4).

Uma das tarefas principais das nossas equipes de combate e em geral das organizações técnico-militares, deve ser a elaboração de um plano insurrecional para o próprio distrito e a sua coordenação com o plano elaborado pelo centro do Partido para toda a Rússia. Achar os pontos mais fracos do inimigo, indicar os pontos dos quais se deve atacar, distribuir todas as forças no bairro, estudar a topografia da cidade: tudo isto deve ser feito preliminarmente, para q«e em, nenhuma circunstância sejamos tomados desprevenidos. É absolutamente fora de propósito examinar aqui nos detalhes, este aspecto da atividade de nossas organizações. O segredo absoluto na elaboração do plano de ação deve ser acompanhado da difusão mais ampla possível entre o proletariado dos conhecimentos técnico-militares absolutamente necessários para conduzir os combates de rua. Para esta tarefa devemos chamar os militares que fazem parte da organização. Para esta tarefa, podemos chamar também muitos outros companheiros nossos, que por sua capacidade natural e suas tendências serão úteis neste trabalho.

Somente uma tal preparação cuidadosa da insurreição pode assegurar a função dirigente da social-democracia nos próximos combates entre o povo e a autocracia.

Somente uma preparação completa para o combate dará ao proletariado a possibilidade de transformar os encontros isolados com a polícia e com o exército em uma insurreição de todo o povo, para substituir o governo czarista por um governo revolucionário provisório.

O proletariado organizado, malgrado os partidários da “política seguidista”, dedicará todas as suas energias a concentrar nas próprias mãos a direção seja técnica seja política da insurreição. Esta direção é a condição indispensável que nos permitirá utilizar a revolução iminente no interesse da nossa luta de classes.

(Folheto publicado em 1906, em Tiflis, em georgiano, na Editora PROLETARIAT com alguns anexos. Assinado: camarada K).

                            O Momento Atual e o Congresso de Unificação do Partido Operário

J. Stálin

MAS se é assim, se sem vitória da insurreição, a vitória do povo é atualmente impossível, se, de outra parte, a própria vida prepara a ação armada do povo, se esta ação é inevitável, é obvio que o dever da social-democracia é preparar-se conscientemente para a ação. Preparar-lhe conscientemente a vitória. Das duas uma: ou devemos abandonar a soberania do povo (república democrática) e contentar-nos com a monarquia constitucional, e então teremos o direito de dizer que não é nossa tarefa organizar a insurreição armada; ou devemos colocar em primeiro lugar, como nosso objetivo atual, a soberania do povo (república democrática) e repelir decididamente a monarquia constitucional e, então, não temos o direito de dizer que não é tarefa nossa organizar conscientemente a ação que se desenvolve espontaneamente.

Como, porém, preparar-se para a insurreição armada, como propiciar-lhe a vitória?

A ação de dezembro demonstrou que nós social-democratas, além de todos os outros erros, temos culpa diante do proletariado de um outro erro grave. Este erro consiste em não estarmos preocupados, ou estarmos pouco preocupados, com o armamento dos operários, com a organização dos grupos vermelhos. Recordai dezembro. Quem não se recorda do povo despertado, saído à luta em Tiflis, no Cáucaso ocidental, no Sul da Rússia, na Sibéria, em Moscou, em Petersburgo, em Baku? Por que a autocracia conseguiu tão a tempo dispersar este povo enfurecido? Seria porque o povo não estava ainda convicto de que o Governo czarista não serve para nada? Certamente que não! Por que então?

Antes de mais nada, porque o povo não tinha armas ou tinha muito poucas: por mais que se seja consciente, com as mãos nuas não se resiste às balas! Sim! Censurava-se com razão quando se dizia: arrecadais o dinheiro e não se vê as armas.

Em segundo lugar, porque não tínhamos grupos vermelhos treinados que arrastassem atrás de si os outros, buscassem armas com as armas e armassem o povo: nos combates de rua, o povo é um herói se os seus irmãos armados não o guiam e não lhe dão o exemplo, pode transformar-se numa massa desorientada.

Em terceiro lugar, porque a insurreição era desordenada e desorganizada. Quando Moscou combatia nas barricadas, Petersburgo calava. Tiflis e Kutais se preparavam para o assalto quando Moscou já estava “domada”. A Sibéria tomava as armas quando o sul e os letões já estavam “vencidos”. Isso significa que o proletariado em luta enfrentou a insurreição fracionado em grupos, pelo que foi relativamente fácil ao governo infligir-lhe uma “derrota”.

Em quarto lugar, porque a nossa insurreição seguiu a política da defensiva e não da ofensiva.

O próprio governo provocou a insurreição de dezembro, o próprio governo a atacou; ele tinha o seu plano, enquanto que nós enfrentávamos, não preparados, essa ofensiva do governo; não tínhamos um plano meditado, éramos constrangidos a seguir a política da defesa, a arrastar-nos assim a reboque dos acontecimentos. Se os moscovitas tivessem, desde o início, escolhido a política do ataque teriam imediatamente ocupado a estação de Nikolaiev e o governo não teria podido lançar as tropas de Petersburgo para Moscou, de modo que a insurreição de Moscou teria durado mais tempo e isto, em conseqüência, teria exercido uma influência também sobre outras cidades. A mesma cousa se deve dizer em relação aos letões: se estes, desde o início, tivessem tomado o caminho da ofensiva, como primeira cousa se teriam apoderado das armas e teriam aniquilado as forças governamentais.

Marx não dizia em vão:

“Uma vez começada a insurreição, deve-se agir com a maior decisão, e passar à ofensiva. A defensiva é a morte de toda insurreição armada…” “Deve-se surpreender o adversário enquanto suas tropas ainda estão dispersas; deve-se conseguir cada dia novos triunfos, ainda que pequenos; deve-se manter a superioridade moral que o primeiro levante eficaz propícia; deve-se atrair os elementos vacilantes que seguem a parte mais forte e aderem sempre ao lado mais seguro; deve-se obrigar o inimigo a retroceder antes que possa reunir suas forças; em suma, falando com as palavras de Danton, o maior mestre de tática revolucionária que a história conhece: “audácia, audácia e sempre audácia!”

(J. Stalin — Obr. comp. V. I. Edizione Rinascita — Roma 1950 — páginas 306 a 308).

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Notas:
(1) Refere-se à execução do General-Governador de Moscou, Grão-Duque Sérgio Alexandrovitch, pelo terrorista social-revolucionário Kaliav, em 1905. 
(2) N. da R. — Partido Operário Social Democrata Russo, do qual, mais tarde, saiu o PC (b) da URSS. 
(3) Membro do partido pequeno-burguês armênio “Cohjciak”, fundado em Gênova em 1887, por iniciativa dos estudantes armênios. Na Transcaucásia, este partido tomou o nome de Partido Social-democrático armênio e conduziu uma política divisionista no movimento operário. Depois da revolução de 1905/1907, degenerou transformando-se em um grupo reacionário nacionalista. 
(4) Veja o PC (b) da URSS, nas resoluções e nas decisões dos congressos, das conferências e reuniões plenárias do comitê Central, parte I, sexta edição, 1940, pág. 45.