Chegou arretada no trabalho e já começou a distribuir maus-dias na recepção. Tinha brigado com o namorado – na verdade, caso – e já não podia acreditar em mais nada, muito menos em homem.

      Sentou diante do micro. Abriu o msn e escreveu no lugar de seu nome: “O que passou, não volta mais”. Os amigos, ao abrirem suas respectivas caixas de diálogo, viram lá a identidade insólita. Quem será? Quem não será é o caminho mais fácil até a resposta. Por eliminação, chegaram até ela. Sacaram tudo.

      O caso chegou. Todo prosa, sempre bem trajado, entrou sob olhares, ou de mofa, ou de rancor. Já na recepção deixou o seu habitual bom dia, emitido com sua invariável inflexão de voz “galã-das-oito”, que foi distribuindo pela casa, principalmente quando passava um ente do sexo feminino.

      Cauteloso, passou ao largo da sala dela. Deu telefonemas, despachou com a secretária, adiou reuniões, agendou viagens, fechou negócios. Ao meio-dia, hora sagrada do almoço, discou o ramal dela. Recebeu de lá um “pois não” profissionalmente modulado em timbre de veludo, que, uma vez identificado o interlocutor, transformou-se em puro gelo. Depois de muito “o que é isso, minha linda” pra cá, “não faz isso, princesa” pra lá, recebeu de chofre e de frente epítetos que começaram em “você é mesmo um cara de pau” e terminou em expressões impublicáveis. 

      Ficou preocupado, mas não perdeu a pose. Arrumou a mesa enquanto imaginava alguma estratégia de abordagem que evitasse ao máximo mais avarias. Súbito, na tela do micro, explode uma caixa piscante onde se lê “Vende-se cordão banhado a ouro. Falar com ‘Em busca do amor verdadeiro, no telefone tal’”.

      Desse dia em diante, resolveu que era melhor almoçar sozinho.