Subia, algo subia, ali, do chão,
quieto, no caule calmo, algo subia,
até que se fez flama em floração
clara e calou sua harmonia.

Floresceu, sem cessar, todo um verão
na árvore obstinada, noite e dia,
e se soube futura doação
diante do espaço que o acolhia.

E quando, enfim, se arredondou, oval,
na plenitude de sua alegria,
dentro da mesma casca que o encobria
volveu ao centro original.

O mundo estava no rosto da amada –
e logo converteu-se em nada, em
mundo fora do alcance, mundo-além.

Por que não bebi quando o encontrei
no rosto amado, um mundo à mão, ali,
aroma em minha boca, eu só seu rei?

Ah, eu bebi. Com que sede eu bebi.
Mas eu também estava pleno de
mundo e,  bebendo, eu mesmo transbordei.

 

Rilke: Poesia-Coisa
Seleção, introdução e tradução Augusto de Campos
Imago Editora – edição 1994