Serra nada contra a correnteza e começa a ser arrastado rio abaixo. Desde então, sua campanha é regida pelo o desespero que comanda os afogados. Encontrará algum galho no qual possa se agarrar e impedir o desastre que se anuncia? De cada cem analistas, 99 não vislumbram um bote salva-vidas. A campanha do ex-governador passa, então, a rogar pragas. Mas há um adágio que diz: “praga de urubu não mata cavalo gordo”.

Serra tem atado nos calcanhares uma âncora de chumbo. O povo quer a continuidade e ele representa o retrocesso. Ele usa a imagem do presidente Lula no seu programa de TV, esconde como pode Fernando Henrique Cardoso, mas a maioria do eleitorado o enxerga como um virtual demolidor das conquistas dos dois mandatos do presidente Lula. O que o afunda é a comparação entre a “ herança maldita” de seu padrinho e o legado benigno do ciclo virtuoso aberto em 2003. Serra é estampa de uma ideia que fracassou no mundo e no Brasil. Embora jure que não, mesmo que apregoe a baixa dos juros, ele é quem se dispôs a ser o defensor de um neoliberalismo enrustido, de uma social-democracia às avessas. Em vez de “Estado de bem-estar social”, Estado de flagelo social. “Mínimo” às necessidades do povo e ao progresso da Nação e “máximo” para o apetite insaciável da plutocracia.

O que se houve na rua é que “ a mulher” vai ganhar. O povo diz que no Brasil há o péssimo costume de que se ganha um político da oposição, ele muda tudo, até aquilo que está dando certo. Em 2002, quando o Brasil estava na UTI, a palavra “mudança” era música. A oposição e a mudança precisam triunfar, pois ninguém agüentava mais. Hoje, com o Brasil trilhando o caminho do desenvolvimento com distribuição de renda, a palavra mágica é “continuidade”

Dilma, para além do ouro que é o apoio de Lula, progressivamente vai criando empatia com o povo. Sua história, sua competência, seu compromisso com a democracia, com o povo e a Nação passam a ser conhecidos pelos os eleitores. Continuidade e avanço constituem o binômio de sua mensagem.

Sua campanha precisa administrar a euforia de uma vitória pré-anunciada pelas pesquisas. Mas, convenhamos, este é o problema com o qual todo candidato sonha. Essa tendência pode alavancar a vitória de seus aliados nas eleições ao Congresso Nacional, aos governos estaduais, às assembléias legislativas.

Dilma, com razão, tem dito que a eleição só se resolve no dia 3 de outubro. Ela mesma dá o exemplo “escalando um Everest a cada dia”. Dois procedimentos, entre tantos, seriam úteis para combater o “salto alto” que pode desguarnecer sua campanha da necessária consciência de que a vitória se constrói dia a dia, lance a lance.

A coligação que sustenta Dilma ainda não divulgou seu programa de governo. Seus principais compromissos. É hora de fazê-lo. É uma tradição — ótima tradição — que vem desde a campanha de 1989. Os famosos treze pontos. Este texto com a assinatura das legendas coligadas e dos candidatos é um documento indispensável à jornada eleitoral e ao futuro governo.

A campanha de Dilma é sustentada por duas pilastras. A primeira é a coligação partidária. A segunda são os movimentos sociais e as lideranças das entidades dos trabalhadores. É preciso uma agenda que contribua para o engajamento desta segunda pilastra. O diferencial de uma candidata que tem o apoio da esquerda é justamente a militância dos movimentos temáticos, das lutas do povo e dos trabalhadores. Foi um êxito o encontro de Dilma com as mulheres trabalhadoras. Todavia, até agora não foi realizado nenhum evento específico com os estudantes e a juventude. Também não houve a entrega das propostas programáticas das centrais sindicais à candidata.

Quando se aproximam os trintas dias decisivos do confronto, Serra tem o desafio de conter a debandada de suas fileiras e as deserções até de seus correligionários mais leais. Dilma precisa desde já provar que sabe administrar distintas situações. Manter em pé de guerra sua coligação e seus apoiadores quando as pesquisas e os sinos das igrejas precocemente já badalam sua vitória.

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Presidente da Fundação Maurício Grabois e editor da revista Princípios