Ben Ali foi embora, mas seu regime permanece intacto, assim como as forças imperialistas neocolonialistas que o apoiavam e, agora, apoiam a transição e os interesses que usurpavam do povo tunisino, que buscam continuar fazendo o mesmo.

Após a expulsão de Ben Ali do poder, assumiu as rédeas um governo "transitório", caracterizado por todos os tunísios uma "continuação" do regime derrubado, considerando que segue a mesma política econômica catastrófica para o país.

Por outro lado, foi constituída a "Suprema Comissão" (Haute Instance), composta por 170 membros, que representa os partidos que foram constituídos até hoje, num total de 65. A Comissão, por intermédio de grupos de trabalho, está tentando definir a forma com a qual o país realizará as primeiras eleições gerais após a época de Ben Ali. Mas a disputa entre os membros já é extremamente agressiva.

A data na qual insiste a Comissão Eleitoral da Haute Instance, apesar de recusada inicialmente pelo "governo de transição", é 16 de outubro deste ano. Contudo, caso contrário, lucrarão somente os partidos que já são muito bem organizados e dispõem de recursos, isto é, os partidos que já existiam durante o regime de Ben Ali, assim como seu próprio partido, o qual, após sua dissolução, foi absorvido por outras agremiações, como o Partido Islâmico que, a exemplo dos Irmãos Muçulmanos, desenvolve ações sociais e filantrópicas.

A crescente influência do Partido Islâmico Ennahdha, apoiado ostensivamente, com generosos volumes de recursos enviados por países do Golfo Pérsico, Arábia Saudita, assim como pelo Partido de Justiça e Desenvolvimento (AKP) do primeiro-ministro da Turquia, Retzep Tayyip Erdogan, que, além de recursos financeiros, ofereceu ao Ennahdha a infra-estrutura que dispõe em países da Europa onde vivem imigrantes turcos para ajudar os islamitas tunisinos a realizarem a propaganda eleitoral entre os imigrantes tunisinos.

Regime reivindica poder

"Extremamente crítico" caracterizaram o atual período, no que diz respeito ao processo iniciado com a saída de Ben Ali, os líderes sindicalistas da Confederação dos Trabalhadores da Tunísia. E avaliando que os resultados de todo este processo pré-eleitoral, não garantem que serão positivos para o povo e os trabalhadores da Tunísia.

Os líderes sindicais revelaram que o problema mais importante é que os elementos do antigo regime de Ben Ali dispõem elevadas somas de recursos financeiros, dispõem de redes organizadas e continuam agindo com os métodos antigos. Por exemplo, é indicativo o fato de que, dos 65 partidos políticos que foram criados após a saída de Ben Ali, 15 – os mais fortes – fazem parte da estrutura do antigo regime.

Estes partidos buscam provocar guerra civil, convulsão e insegurança para, em seguida, surgirem com outros nomes como fiadores da ordem e da estabilidade. E para consecução de seus objetivos utilizam todos os meios: terrorismo, repressão, prisões e assassinatos de líderes sindicais e políticos. O exército, a polícia e os serviços secretos de repressão encontram-se em pontos centrais das cidades e nas rodovias da Tunísia.

Pelo lado do povo e de todos aqueles que participaram das manifestações contra o Ben Ali, não existe nenhuma organização. Mas a Confederação dos Trabalhadores da Tunísia está se preparando por um eventual segundo turno – o regime foi derrubado, mas não está liquidado, dizem os sindicalistas.

Por isto estão agrupando três elementos que compõem o front principal. Primeiro, fortalecer o nível de conscientização da juventude que participou da derrubada de Ben Ali. Segundo, na Tunísia o salário mínimo de 150 euros de um trabalhador é o mais alto que poderia ganhar um dos 700 mil jovens tunisino, formados por universidades e desempregados. Terceiro, é que sobrevive o anacrônico sistema das tribos, cujas bases definem tudo, até o cotidiano de seus membros. Assim, segundo os líderes sindicais, "nada mudou radicalmente na Tunísia e por isso a luta deverá continuar a qualquer custo".

Hipocrisia

A posição da União Européia (UE), a qual, supostamente, saudou como "revolução" as manifestações populares na Tunísia, é hipócrita, porque sua política que pôs de joelhos durante tantos anos o povo da Tunísia permanece a mesma.

Este povo continua sofrendo sob a ditadura de Bruxelas por causa do Acordo de Cooperação Econômica que formalizou com Ben Ali, explorando impiedosamente todos os setores da economia tunisina, indústria, comércio, serviços e até o setor público.

Os tunisinos lembram que até o último orçamento do país apresentado pelo Ben Ali fixava como meta a redução do déficit para 2,6%, isto é, inferior ao limite imposto aos membros da UE. Ainda, cerca de 37% do orçamento deverá ser destinado ao pagamento do principal e do serviço de empréstimo contraído junto a instituições financeiras da UE.

O cenário político na Tunísia encontra-se ainda "em conformação". Entretanto, é importante destacar o papel do Partido Ennahdha, composto e apoiado por grandes comerciais, industriais e latifundiários. Consequentemente, entende-se que não tem problemas com o imperialismo europeu e norte-americano.

Aliás, próceres do Ennahdha mantiveram encontros na Europa e nos EUA, a fim de assegurar que continuarão a favor da economia neoliberal e do livre mercado. Em outras palavras, nada mudou na Tunísia.

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Fonte: Africa News Agency, no Monitor Mercantil