O debate foi promovido pelas Fundações Maurício Grabois, Perseu Abramo, Friedrich Ebert e o Instituto de estudos Contemporâneos e Cooperação Internacional, com apoio do Grupo de Reflexão e Relações Internacionais (GRRI). Contou com a presença, além do Dr. Florisvaldo Fier, o Dr. Rosinha, do responsável de Relações Internacionais da Secretaria de Governo da Presidência da República, Murilo Vieira Komminski e foi mediado pelo dirigente do PCdoB, Rubens Diniz. Participaram da atividade professores universitários, acadêmicos e sociedade civil organizada.

A mudança de correlação de forças iniciada com a eleição de Hugo Chávez na Venezuela, que abriu caminho para outros tantos governos progressistas no continente, proporcionou avanços importantes rumo à integração plena. Depois de mais de uma década de conquistas, a ofensiva da direita é contundente e mostrou sua força ao voltar ao poder na Argentina, com as eleições no último domingo (22), onde o candidato Maurício Macri (PRO), foi eleito.

Os debatedores acreditam que a estratégia de integração agora precisa ser alterada, isso porque, depois de anos consecutivos de caminhos abertos para o avanço, o momento atual é de resistência para evitar retrocessos. Para o secretário nacional de Juventude do PCdoB, André Tokarski, a contra-ofensiva da direita no continente acontece justamente quando o mundo passa por uma profunda crise do capitalismo, e neste sentindo, as elites mundiais precisam “recuperar aliados e investimentos”. Para esta estratégia neoliberal, Maurício Macri, o presidente aberto ao mercado e à minimização do Estado, soa como a “liderança perfeita” para ser impulsionada na América Latina.

“O crescimento do Mercosul é irreversível”

Em entrevista exclusiva ao Portal Vermelho, o Alto Representante do Mercosul, Dr. Rosinha, comparou o bloco latino com a União Europeia para mostrar avanços obtidos aqui. “Darei o exemplo das eleições na Grécia, lá o povo grego decidiu pela mudança do modelo econômico, no entanto não conseguiu porque a União Europeia é supranacional. A vontade do país era de mudar a economia e o bloco não permitiu. Eu cito este exemplo para mostrar que o Mercosul é intragovernamental, então a vontade popular é respeitada. Seja uma vontade que vá para a direita, para a esquerda, ou que rumo ideológico que tome, essa vontade será respeitada”.

Neste sentido, Dr. Rosinha afirma que o resultado eleitoral da Argentina deve ser respeitado como uma vontade popular e democrática e acredita que de forma ou outra, abrirá possibilidades para a integração. “[O resultado] eu vejo como um processo normal, natural e o avanço e o crescimento do Mercosul são irreversíveis. Eu acredito que mesmo com mudança de rumo ideológico e programático da nova presidência da Argentina o Mercosul continuará avançando”.

Integração energética e cidadania

Muito se debateu sobre quais os rumos os países do Mercosul devem tomar para fortalecer o bloco. Os debatedores chegaram à conclusão de que o papel do Brasil é fundamental neste processo, por ser o mais o país em extensão territorial e também pela economia. Neste sentido, algumas prioridades foram apontadas, entre elas a questão da soberania e integração energética, além do desenvolvimento da cidadania e da ciência e tecnologia como modo de unir e fortalecer os países membro.

O professora da Universidade Federal de Integração Latino-Americana (Unila), Renato Martins, considerou como questão prioritária a validação de diplomas universitários em todos os países do bloco. Segundo ele, estudantes formados na Unila – universidade que recebe alunos de diversos países da América do Sul – voltaram aos seus locais de origem e não conseguiram validar seus diplomas, mesmo tento estudado numa instituição cujo principal foco é a integração.

“Deveria ser automática a validação de diploma das universidades federais de todos os países, estas que têm reconhecimento nacional e internacional e não há dúvida com relação à formação do aluno. Sabemos que existem muitas universidades que são verdadeiras usinas de vender diploma, mas estes casos seriam debatidos separadamente”, defendeu. Para ele, as universidades públicas têm prestígio e garantia de qualidade assegurados de forma que não precisaria de um processo burocrático para a validação do diploma. Desta forma seria possível avançar na valorização do ensino como um todo.

Já o responsável de Relações Internacionais da Secretaria de Governo da Presidência da República alertou para a questão da comunicação. Segundo ele, não é aceitável que não existam reuniões e um plano de trabalho integrado entre os ministros da Comunicação de todos os países membros. “Há apenas encontros de trabalhos com funcionários técnicos, mas existem temas muito importantes que precisam ser debatidos num nível superior, como a questão da governança na internet, por exemplo”, explicou.

O Dr. Rosinha, por sua vez, acredita que não haverá integração plena sem o desenvolvimento da ciência e da tecnologia. “Temos muito para avançar. Eu vejo que um grande desafio é a ciência e a tecnologia, se nós quisermos que o bloco avance, uma questão fundamental é a ciência e a tecnologia. Assim como o Parque Tecnológico de Itaipu, há muitos outros parques tecnológicos, outros centros que estão estudando e desenvolvendo. Precisamos ter mais trocas de informações e mais trocas de experiências para nós avançarmos. Hoje o Mercosul é o quinto bloco econômico, se nós quisermos fazer dele um bloco que interage soberanamente no mundo nós temos que investir em ciência e tecnologia, caso contrário nós ficaremos para trás. Este é o grande desafio hoje”.

Porém, a questão comercial é um desafio a ser superado. “Não há integração de países sem avanço da questão comercial e econômica. A questão da macroeconomia continua sendo um desafio para os Estados membros do Mercosul, e a questão comercial é um grande desafio também neste momento porque o mundo todo retrocedeu nas questões comerciais, caíram as cifras pela metade com relação a anos anteriores justamente pela crise econômica, isso coloca um desafio”, esclareceu o Alto Representante do Mercosul.

Ele acredita que com relação à cidadania muitos passos importantes já foram dados e problemas graves superados, como o caso da imigração, que hoje a América Latina é muito mais desenvolvida que a Europa, por exemplo. “O Mercosul hoje, quando se compara à União Europeia, tem relações melhores na questão da imigração. Nós não temos o problema da imigração que a União Europeia tem hoje, nós superamos isso”.

Dr. Rosinha destaca que construindo a cidadania é possível avançar. Já existem direitos importantes assegurados, como residência e aposentadoria, independente do país onde o cidadão latino-americano tenha trabalhado durante a vida. No entanto, há muito por se fazer. “Nós teremos agora, em no máximo 5 ou 6 anos a carteira de identidade única. Temos muito para avançar”, anunciou.