PCdoB divulga análise sobre Marco Civil da Internet
Existem pontos centrais que balizam o PL com o objetivo de manter a liberdade na internet e impedir que ela seja apropriada pelas empresas de telecomunicações – as telecoms ou teles – e que não devem ser alterados: neutralidade de rede (artigo 9º); retirada de conteúdos protegidos por direito autoral (parágrafo 2º do artigo 15); privacidade e proteção de dados. Além disso, diante das denúncias de espionagem há seguimentos propondo a obrigatoriedade de armazenamento de dados em data centers no Brasil, medida que na opinião do documento é ineficaz.
“As duas primeiras questões foram até o momento as principais fontes de tensão, que impediram o projeto de ser colocado em votação. As duas últimas, surgiram principalmente após as denúncias de espionagem, mas não são públicas, ainda, as propostas concretas de redação para estes itens, portanto teceremos apenas comentários gerais sobre estes”, diz um dos trechos do documento.
De acordo com o documento, é preciso estar atento ao que de fato motivou a publicação do regime de urgência, no Diário Oficial da União, na sexta-feira (13). Estar na ordem do dia “não significa que foram solucionados os impasses no interior do governo e entre os vários segmentos interessados diretamente nesta discussão: empresas de telecomunicações, grandes provedores de conteúdo, aplicações e serviços da internet, indústria do copyright – em particular aqui as empresas de radiodifusão – e os vários setores que fazem este debate nos movimentos sociais, universidades e outras organizações da sociedade civil”.
Os prazos para a reta final da tramitação do PL 2126 são: os deputados têm o prazo de 5 sessões ordinárias – a contar do dia 13, para apresentar emendas de Plenário ao projeto; a votação do Marco Civil deve ocorrer até no máximo o dia 27/10/2013. Se isso não ocorrer o PL 2126/2011 passa a trancar a pauta da Câmara; depois de votado na Câmara, o projeto tem mais 45 dias para ser apreciado no Senado, caso contrário tranca a pauta para a aprovação de outras matérias.
Neutralidade
A neutralidade da rede é um dos pilares do Marco Civil, para garantir que a internet continue da mesma forma como a conhecemos hoje: livre. “A neutralidade de rede é a garantia de que as empresas de telecomunicações – que oferecem conexão à internet – não possam tratar de forma diferenciada os pacotes de dados (conteúdos, aplicações e serviços) que trafegam na rede. Ou seja, quem fornece a conexão não pode distinguir a velocidade e qualidade com o qual determinado pacote circula”, defende o documento da Secretaria da Questão da Mídia, assinado pela comunista Renata Mielli, que lembra que “este tem sido o principal embate no interior do governo, entre a sociedade e as empresas de telecomunicações”. Ela lembra que, por se tratar do “coração do projeto”, “de nada adianta perder aqui e ganhar nos outros”. Por isso reforça: “Não importa se é o download de um vídeo, uma transação bancária, um upload de música, um acesso à rede social, uma mensagem de e-mail, ou uma conexão de voz por IP. Este princípio é o que garante que a internet seja neutra e, portanto, um ambiente de colaboração, descentralizado e criativo”.
O principal objetivo das teles em alterar esse princípio é claro que é o lucro, ampliando as “possibilidades de modelos de negócios e terem maior opções de pacotes para ofertar aos usuários, aumentando a capacidade de ganhos e reduzindo a obrigação de ampliação das suas redes de infraestrutura”.
Para impedir a censura
“O Marco Civil da Internet é uma carta de princípios, que prevê direitos e deveres para o uso da internet no Brasil. A discussão em torno da publicação de conteúdos e de sua retirada do ar é um aspecto central para equilibrar direitos e deveres de quem presta o serviço nas suas mais variadas camadas e de quem utiliza a rede”, esclarece o texto.
O texto original do PL define que o provedor de aplicações de internet só poderá ser responsabilizado pelo conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial determinando a retirada deste conteúdo, ele permanecesse no ar. As contribuições que criticavam este dispositivo o faziam a partir de argumentos variados, entre eles a judicialização do assunto, num cenário em que a Justiça não está preparada e não tem as diretrizes para julgar estes temas; parte considerável da população não teria instrumentos para solicitar, via judicial, a retirada de determinado conteúdo que considere infringente; como garantir os direitos autorais de conteúdos protegidos e postados por terceiros tendo como foco o direito de autor propriamente dito e o forte lobby da indústria de copyright envolvendo os direitos autorais.
“Sobre os pontos 1 e 2 há que se reconhecer que é preciso definir claras diretrizes para que o Judiciário atue neste campo. Contudo, reconhecer a deficiência existente não retira a validade do princípio. Já que sem a previsão explicita de notificação judicial, o que valeria é o notice and take down – ou seja, retirada apenas mediante notificação sem qualquer mediação, um verdadeiro ataque à liberdade de expressão”, alerta a secretaria.
O relator da matéria, o deputado Molon, alterou o texto original do caput do artigo 15 que trata do assunto, fazendo pequenos ajustes, mas mantendo a necessidade de ordem judicial para que o provedor de aplicações seja responsabilizado civilmente pela manutenção de conteúdo gerado por terceiros. Mas, o relatório incluiu uma preocupante exceção a esta regra no 2º parágrafo deste artigo: “O disposto neste artigo não se aplica quando se tratar de infração a direitos de autor ou a direitos conexos”. Ou seja, a exceção “beneficia explicitamente a indústria de copyright e afeta de forma impactante a liberdade de expressão na internet. Porque somente com uma notificação, oriunda de qualquer pessoa ou parte, um provedor pode retirar um conteúdo postado do ar se a alegação for violação do direito autoral. Sem que haja o direito ao contraditório, ou obrigação de ouvir a pessoa responsável pela postagem. Sem qualquer trâmite legal”.
Mas quem de fato está interessado nesse ponto? Sabe-se que essa briga não é para proteger o artista, pelo contrário, o compartilhamento de seu trabalho na internet tem sido fonte de renda e reconhecimento. É preciso apontar as empresas que estão intereferindo diretamente no texto para se beneficiar. A Rede Globo é uma delas, que quer impedir, por exemplo, a disseminação do vídeo do SPTV, cujo estúdio foi alvo de um protesto de militantes da comunicação que usaram um laser verde para invadir a programação da emissora. “E, mais que isso, é uma briga entre produtores de conteúdo e o Google. E nesta briga e jogo de interesses quem perde é a liberdade de expressão e o usuário”, avisa o documento.
Leia a íntegra do documento e entenda melhor porque é preciso defender o texto original do Marco Civil ou “ajustes” somente “no sentido da melhoria do texto, mas sem alterar sua inspiração inicial”. Para ler, clique na área de download no alto, à direita deste texto.