Dona Inácia dorme. Mariana vela. As irmãs se dividiram e se alternam nas cabeceiras dos leitos. Glória ligou para o marido, pedindo reforços. Parentes da mãe estavam sendo mobilizados.

      Glória relatou à caçula dos Oliveira a conversa com Argemiro. Mariana roe as unhas e reflete. Tudo aquilo tinha sido muito rápido, e é preciso colocar as idéias em ordem. Olha sua vida como quem observa os estragos de um tufão. Pouco havia sobrado inteiro. E previa que, no futuro imediato, a paisagem não iria melhorar muito.

      Dona Inácia suspira. Isso tem sido uma constante. Parece que um sonho mau povoa seu descanso. Franze o cenho enquanto dorme e geme muito. Mas é só dormindo que está bem. Acordada, as dores são muitas e a tristeza, infinda.

      Mariana chama a enfermeira:

      – Vou ali dar um telefonema, já volto.

      – Tudo bem.

      Sai do quarto e vai ao hall de espera do andar. Disca. Alguém atende:

      – Alô?

      – Oi.

      – Oi. Como você tá?

      – Ah…

      Lágrimas assomam. Repreende-se por isso.

      – Queria alguma vez abrir a boca sem chorar.

      – Tudo bem. É bom chorar.

      – Não, não é não. A gente não consegue conversar. E depois, fico com a maior dor de cabeça.

      – Vou praí amanhã.

      – Jura?

      – Consegui convencer meu orientador. No fim, ele disse: "Tudo bem. Eu também já fui apaixonado".

      Ela sorri, mas aumenta o volume das lágrimas. Instala-se um grande lapso de silêncio, só interrompido pelo fungado de Mariana. O moço do outro lado da linha se angustia.

      – Você tem dormido? – ele pergunta, quebrando o intervalo.

      – Um pouco.

      – Tá comendo?

      – Se eu já não sentia fome antes, agora então…

      – Mas precisa comer, linda. Se não , como é que faz?

      – Vou tentar.

      – Promete?

      – Prometo.

      – Te amo, viu?

      Ela volta a chorar.

      – Você chega logo?

      – De manhã.

      – Mesmo?!

      – Ia sair daqui de manhã pra chegar à noite. Mas não dá pra te deixar assim. Pego o último busão de hoje… Como tá a Glória?

      – Bem. Aquilo é de pedra. Manteiga aqui, só eu mesmo.

      – Na verdade, ela engana bem.

      – Na verdade, ela é o que vai nos sobrar depois disso tudo.

      – Manda um abraço pra ela. E pra sua mãe também.

      – Mando. Um beijo gostoso, tá?

      – Outro.

      Mariana põe o fone no gancho e ruma de volta pro quarto. A mãe ainda dorme. Acarinha a cabeça da velha, e torna a chorar.