''Era manhã de setembro
e ela me chupava o membro''. (1)

Era manhã iluminada
de um sol esplendoroso
quando, como em um filme B
de terror americano
o mundo foi desabando
em Nova Iorque sitiada,
em que o velho Sousândrade
antevira o caos,
em seu Guesa Errante,
no berço do Deus capital,
antes de retornar ao Maranhão,
onde, tratado como um inútil,
passou a viver
das pedras da Vitória,
a chácara de sua amásia.

Pensar que o débil poeta
pressagiou, com olhos de profeta,
o triunfo do absurdo,
e que o gauche itabirano
cantou um dia
a angústia do poeta
em não poder, sozinho,
dinamitar
a ilha de Manhattan.

Era manhã de setembro,
E ela me fazia levitar,
Levevivendo.

Era difícil acreditar
que em meio
a um prazer
quase nirvânico
(o de ver o dia
sendo inaugurado
por uma carícia
inefável)
o mundo caísse,
aos pedaços,
em estrondo
de Bastilha.

Como se fosse um coevo
do vate Castro Alves
gritei, em berro
brado retumbante:
meu Deus! Será verdade
ou vídeo-game
tanto horror
perante os céus?

Pior que era:
e a liberdade
      desmaiou,
em raios fúlgidos,
no céu da pátria,
naquele instante,
caiu, com a estátua amada,
em estrondo de Niágara.

II

O mundo nunca mais
conheceu a paz
depois que se mostrou
como é, em sua face de Caim
– violento e violentado.

Era manhã de setembro,
eu me lembro, eu me lembro,
nos mares pelos
homens emporcalhados
na ocidental praia lusitana,
        no lendário oriente
das mil e uma noites
e na terra de Tio Sam,
o velho patrão
multi-americano.

A simples anarquia
desabava sobre a terra.

Era manhã de setembro:

''Nunca esquecerei deste
acontecimento
na vida de minhas retinas
tão fatigadas''. (2)

Notas

(1) Carlos Drummond de Andrade
(2) Carlos Drummond de Andrade

 Brasigóis Felício, é goiano, nasceu em 1950. Poeta, contista, romancista, crítico literário e crítico de arte. Tem 36 livros publicados entre obras de poesia, contos, romances, crônicas e críticas literárias.