Seu Delegado José Unias de Talabarte Cerqueira é filho do Desembargador Talabarte Cerqueira e neto do falecido Sinhô Talabarte, proprietário de muitas sesmarias e de um sem-número de reses e almas. Sua mãe, dona Maria Helena Soares de Talabarte Cerqueira, era filha de outro poderoso: o também falecido Major Emiliano Oliveira Soares.

      Irmão de muitos doutores e professoras, Zé Unias formou-se em Direito. Tentaram, como não poderia deixar de ser, enfia-lo na política, para o que não levava o menor jeito. Tinha gosto pelo mando e um prazer grande em desvendar enigmas. Virou delegado.

      Ainda candidato a vereador, descobriu Maria em seus 15 anos. Endoideceu. Sem consultar família, foi propor-lhe casamento. A menina se riu. Queria casar não.

      O homem tentou de um tudo: de flores, presentes e promessa de vida feliz, até o suicídio acompanhado de bilhete lacrimoso. Nada demoveu a moça de sua decisão de não-amor.

      O Desembargador ainda intercedeu pelo filho, apesar da oposição da esposa. Sabia o que era aquilo. Convencido de que seus dias seriam menos tediosos com Joana Maria, filha do açougueiro, não queria cometer o mesmo erro de seu pai, o velho Talabarte. Queria o filho, se não feliz, ao menos sem úlcera.

      Maria manteve inalterada sua determinação. Zé Unia foi mandado numa viagem de esquecimento e cura. Voltou um ano depois. Vendo de novo a garota, agora, aos 16 anos, ainda mais Maria, teve uma forte recaída e retomou o assédio. Só que, desta vez, com calma, com estratégia, como quem caça passarinho.

      Foi daí que, no ano seguinte, ele chegou. E tudo virou um precipício só. Seu Delegado Zé Unias viveu seu pior inferno.

      Agora, tinha esse caso nas mãos: onde andavam Maria e o irmão? Por que Dona Maria e o marido não quiseram esclarecer nada e também se foram? Havia um homicídio a apurar.

      O delegado olhava a foto de Maria sobre sua escrivaninha. Foi tirada numa noite em que ele mandara detê-la por estar bebendo numa roda de amigos.

      – A senhorita me acompanhe.

      – Como é?

      – A senhorita é menor e está consumindo bebida alcoólica.

     – Deixe de história, Zé Unia. Vá caçá ladrão, vá.

      – Cabo!

      – Nhô…

      – Prenda o dono do estabelecimento e conduza essa moça e esse pessoal até a delegacia.

      Foi aquele alvoroço. Xingaram, protestaram. O dono da bodega chorou, pediu pelamordedeus. Teve jeito não: foram todos para a delegacia.

      Mas o que ele mais gostou foi o olhar de ódio que ela lhe dispensava. Amou aquilo.

      Amou-a naquele ódio dela. E, aproveitou, pediu pro escrivão fichar todo mundo, com foto datada e tudo.

      – Mas, seu delegado, eles tudo são menor. Só não seu Ubaldo, da bodega.

      – Tá conversando muito, seu Teodoro!

      – Sim sinhô…

      Aquela foto não tava boa. Ela tava ali com aquela mesma cara de deboche de sempre. Não com aquela mirada de ódio e ira que o tinha excitado. Mas já era alguma coisa, para quem dela não tinha sequer nada.