Oitenta anos do Partido da China: lutas, vitórias e lições
Acontecimentos e fenômenos notáveis marcaram o século XX. O capitalismo desenvolveu sua forma monopolista e imperialista e, em duas guerras mundiais, mostrou a que ponto de barbárie podem levar as suas contradições. A ciência e a tecnologia deram saltos estupendos, propiciando a ida do primeiro homem ao espaço – realização da antiga URSS – e o pouso do primeiro homem na Lua – promoção dos EUA. A organização social conheceu as primeiras experiências socialistas no mundo, que se espalharam pelo Leste europeu, Ásia, América, África e, enquanto campo socialista, vararam quase todo o século. O século XXI herda realidades centrais do século que passou. Uma delas, a de que o socialismo continua no mundo – e no país mais populoso, a China. E a outra: o maior índice de desenvolvimento contínuo nos últimos decênios está sendo registrado precisamente nesse país socialista.
O facho de luz vermelha que essas realidades projetam no horizonte deste século é conseqüência da direção exercida junto ao povo chinês por um partido que está completando agora oitenta anos, o Partido Comunista da China.
Uma história de lutas e vitórias
O Partido Comunista da China já surgiu no bojo da luta. O início do século XX encontrou a China com parte de seu território ocupado por oito potências – Inglaterra, Estados Unidos, Alemanha, França, Rússia czarista, Japão, Itália e Áustria. A resistência nacional levou à queda do Império e à Proclamação da República em 1911, sob a direção de um partido republicano, o Kuomitang, dirigido na época por um líder avançado, Sun Yatsen. Dez anos depois, com as notícias da Revolução de Outubro, na antiga Rússia, e com o apoio da Internacional Comunista, antigos participantes da Revolução de 1911 encaminharam a fundação, em Shangai, do Partido Comunista da China. Entre seus fundadores havia um jovem chamado Mao Tsetung.
Logo depois de fundado, o Partido tomou conhecimento de um pacto firmado por nove potências, na Conferência de Washington, definindo uma política “de portas abertas na China”. As potências se acertavam para invadir de novo o território chinês. O Partido preparou-se para resistir, e, de 1924 a 1927, participa da intitulada “Grande Revolução”, um movimento democrático e antiimperialista, em Frente Única com o Kuomitang. Foi a primeira Frente com o Kuomitang.
Morto Sun Yatsen, dentro do Kuomitang cresceu uma corrente reacionária e agressiva dirigida por Chiang Kaichek que, em 1927, dá um golpe em Shangai, matando e prendendo comunistas. O Partido rompe com aquela Frente e adota a linha de promover levantes em grandes cidades. Fez, em agosto de 1927, o levante de Nanchang, ao que outros se seguiram, todos derrotados, mas que criaram uma consciência nova no Partido, sintetizada por Mao na famosa afirmação “o poder nasce da ponta do fuzil”. Agosto de 1927 foi o marco do início da primeira guerra civil na China.
É a partir de então que Mao Tse Tung começa a organizar bases de apoio revolucionárias no campo; ponto de partida da estratégia, até então inédita no mundo, do cerco das cidades a partir do campo. O Exército do Kuomitang começa, em outubro de 1930, a empreender grandes campanhas de cerco e aniquilamento contra as bases de apoio. Na quinta campanha, em 1934, quando a Base Central já estava sendo cercada, o Exército Vermelho delibera fazer a retirada estratégica que passou à história como a Longa Marcha: 86 mil retirantes marcharam 10 mil Km, perseguidos pelo Exército de Chiang Kaichek, durante um ano; ao cabo do que morreram cerca de 56 mil pessoas.
Ao terminar a Longa Marcha, segundo alguns “a maior façanha da história mundial”, o Japão, que já ocupava um pedaço da China, faz nova invasão e chega a Pequim. Muda a conjuntura. E o Partido, que estava em guerra civil com o Kuomitang, toma audazes medidas para obrigá-lo a encerrar a guerra e participar de uma Frente antijaponesa, ao lado dos comunistas. O pleito comunista foi conseguido. Terminou, então, a primeira guerra civil contra o Kuomitang, que durou 10 anos, e começou a Guerra de Resistência contra o Japão, em 1937. Era o início da segunda Frente com o Kuomitang.
Durante a guerra antijaponesa, as forças de Chiang Kaichek, traiçoeiramente, desenvolveram campanhas de aniquilamento contra os comunistas. Estes, reagiam, intensificando o trabalho junto ao povo, realizando campanhas de estudo e retificação de erros, mas não rompiam a Frente. Iam acumulando força e prestígio. Em agosto de 1945, o Japão se rendeu na II Guerra Mundial, mas, na China, só capitulou em setembro, após a ofensiva dos comunistas – quando terminou a Guerra de Resistência, que durou oito anos.
Chiang Kaichek, com o apoio logístico dos EUA, logo em seguida volta-se contra os comunistas e, estes, a partir de 1946, resolveram passar à ofensiva. Tem início assim a segunda guerra civil, conhecida como Guerra de Libertação, e que se estendeu até 1949, quando o Exército de Chiang Kaichek foge para a ilha de Taiwan, onde se encontra até hoje. Então, em 1º de Outubro de 1949, perante 300 mil pessoas aglomeradas na maior praça do mundo, Tianamen, Mao Tsetung diz essas palavras proféticas: “Está proclamada a República Popular da China. De hoje em diante o povo chinês vai se erguer”. Naquele momento Mao Tsetung chegava com seu Partido Comunista de 28 anos de lutas contínuas, dos quais 26 foram de guerras.
Após a Proclamação da República Popular, o Partido passa a enfrentar novas e grandiosas tarefas, a começar por orientar o Estado popular no lançamento das bases de um sistema socialista no país, o que se efetivou até 1956, quando toda a terra da China passou a ser do Estado, todos os camponeses receberam parcelas iguais de terra e todos os meios de produção foram estatizados. As bases socialistas ficaram assentadas, com forte marca de voluntarismo e igualitarismo. A influência do modelo soviético de socialismo era grande.
Antes disso, um ano após a tomada do poder, a China teve de ir à Guerra da Coréia, contra os EUA, escrevendo outra página trágica e heróica. Sob o comando de Peng Dehuai, cerca de 900 mil chineses atenderam ao pedido de ajuda do Partido e do Governo da Coréia e para lá foram, numa empreitada em que cerca de 700 mil combatentes foram mortos. Mas os EUA recuaram.
A partir de 1956, com bases socialistas já lançadas, foi possível iniciar a construção do socialismo em todas as esferas, com o início dos planos qüinqüenais – que, atualmente, já está no décimo.
Grosso modo pode-se distinguir duas grandes etapas na construção do socialismo na China: uma que vai de 1957 até 1978, e outra, daí até nossos dias. Em ambas o Partido da China se esforçou por buscar caminhos originais, embora na primeira a influência do modelo soviético tenha sido grande. Aí também ocorreram dois períodos marcados por importantes erros, o do chamado “grande salto à frente”, de 1957 a 1965, e o mais grave de todos, o da “Revolução Cultural Proletária”, de 1966 a 1976.
Mas, a despeito dos prejuízos desses dois períodos, onde predominaram idéias “esquerdistas”, voluntaristas, merece realce o crescimento econômico que o país manteve em toda essa etapa – em média, 6% ao ano.
A segunda etapa de construção do socialismo na China tem seu marco inicial em 1978 e partiu de uma apreciação aprofundada da anterior, em particular dos graves erros da Revolução Cultural. Numa situação em que o campo socialista no mundo arrastava-se na crise que o levou ao desaparecimento, o Partido Comunista da China teve a sensibilidade de reprogramar sua linha de construção socialista, encaminhando-se para o que chamou de “socialismo com peculiaridades chinesas”. É a linha atual, que tem conseguido êxitos grandiosos em todos os terrenos.
Lições de uma história
São inumeráveis as lições que podem ser extraídas de uma experiência tão rica como a do Partido Comunista da China. Os marxistas, e os que têm interesses em transformações sociais, devem ter essas lições como referências importantes, mesmo sabendo que tiveram por base a experiência de um país determinado, mas também ficar atentos ao caráter universal de algumas delas. Aqui chamaremos a atenção para duas lições básicas.
1) O marxismo precisa seraplicado criadoramente nasituação do país
O marxismo não é uma doutrina de puro alcance acadêmico. Embora deva ser tratado em nível científico, retira suas conclusões da marcha objetiva da sociedade, inclusive da prática das lutas sociais. Serve para orientar os movimentos de transformação.
A experiência chinesa mostrou que as idéias mais justas aparecem com o amadurecimento do Partido, como resultado de prática revolucionária intensa e de estudo meticuloso da teoria, das condições do país e do momento histórico.
Acontece que dentro do Partido Comunista da China foi se formando uma espécie de marxismo chinês, ou marxismo para as condições da China, que era o marxismo aplicado à realidade do país. Foi o famoso comandante Zhu De quem primeiro mostrou, em reunião do Bureau Político, em março de 1943, que há mais ou menos 15/16 anos uma determinada teoria ia tomando corpo no Partido da China, uma “teoria marxista-leninista adaptada às condições chinesas”. Wang Jiaxiang, em artigo ao Jemin Ribao, de 8 de julho de 1943, chamou essa teoria, pela primeira vez, de “pensamento de Mao Tsetung”. Seu conteúdo foi sendo sistematizado no fragor da luta revolucionária, através de diversas obras e textos escritos por Mao Tsetung, dos quais alguns tiveram enorme influência no Partido e na luta, como: “Por que pode existir o Poder Vermelho na China?” (1928); “Sobre a tática de luta contra o imperialismo japonês” (1937); “Sobre a Prática” (1937); “Sobre a Contradição (1937); “Sobre a Guerra Prolongada” (1938); “Sobre a Nova Democracia”(1940); “Reformemos nosso estudo” (1941); “Sobre o Governo de Coalizão” (1945).
O VII Congresso do Partido, realizado em 1945, encampou essa opinião sobre a emergência do “pensamento de Mao Tsetung”, e pouco depois o VII Comitê Central elegeu Mao Tsetung presidente do Partido.
Deng Xiaoping deu contribuições valiosas em defesa do “pensamento de Mao Tsetung”, observando, por um lado, ser ele um todo ideológico sistemático, resultado de uma produção coletiva, para a qual a contribuição maior foi do camarada Mao Tsetung; por outro lado, ter ele mostrado que nem tudo o que foi dito ou formulado por Mao estava certo, ou coerente com a essência do próprio “pensamento Mao Tsetung”. Ensinou, em 1977, que nem Mao Tsetung, nem mesmo os clássicos do marxismo, são infalíveis; que não se pode fazer transplantes de suas formulações, já que refletem o tempo e o lugar onde foram proferidas; que, enfim, devia-se lutar contra a banalização do “pensamento de Mao Tsetung”, no emprego de suas frases como se fossem receitas. Em outras oportunidades, Deng realçou o que acha ser a postura básica do “pensamento de Mao Tsetung”, seu método de “buscar a verdade nos fatos”, exposto na obra de Mao “Reformemos nosso estudo”, de 1941. “Fatos”, explica Mao, são as coisas e situações que existem objetivamente; “verdade” é a ligação interna entre essas coisas, as leis que as regem; “buscar” é entender, estudar, pesquisar. Em outra oportunidade, ele afirmou: “quem não pesquisou não tem o direito de falar”.
A partir de 1978, frente ao Partido da China, uma outra situação vai se colocando, em outro quadro internacional – agravado pela crise do socialismo no mundo –, quando a China acabava de passar por um tempo de desordem com a Revolução Cultural. A necessidade de superar os problemas ia sinalizando o rumo a seguir. E o Partido foi fazendo outro desenvolvimento do marxismo na China, onde uma compreensão nova e apurada da sociedade teve peso fundamental. Surgiu assim a “teoria de Deng Xiaoping”, ou teoria da construção do socialismo com peculiaridades chinesas.
A teoria de Deng parte da reafirmação dos “quatro princípios fundamentais”: o caminho socialista, a ditadura democrática popular, a direção do Partido Comunista e a teoria do marxismo-leninismo e do pensamento de Mao Tsetung. Como construção teórica, avança na concepção de como se edificar o socialismo nas atuais condições chinesas, formulando a tese da etapa primária do socialismo na China, decorrente do atraso ainda existente no país e da conjuntura de adversidades internacionais vividas pela corrente socialista. Nessa etapa, sob o primado da propriedade social dos meios de produção, deve se integrar diferentes tipos de propriedade, incluindo-se a privada nacional até a estrangeira. As leis do mercado têm de ser levadas em conta, cabendo “ao Estado regular o mercado e, a este, orientar as empresas”.
A contribuição de Deng foi também decisiva na avaliação dos erros e acertos ocorridos no Partido em vida de Mao Tsetung. O equilíbrio e o rigor com que Deng se portou na apreciação do papel de Mao na história da China foram fundamentais para o que Deng chamou de “emancipação da mente, contra o ‘esquerdismo’ e a direita”. Os erros cometidos por Mao foram identificados, mas Deng advertiu contra os riscos de se procurar um bode-expiatório, mostrando que, mesmo quando a responsabilidade principal no erro fosse daquele, freqüentemente a responsabilidade era coletiva. Essa posição foi sumamente meritória, pois Deng fora vítima de reiteradas perseguições por conta dos erros a que tomava a iniciativa de relativizar. Ademais, Deng ajudou a realçar que, em Mao, a contribuição positiva no processo da revolução chinesa fora enormemente maior que seus erros – que entretanto deveriam ser reconhecidos. Tudo indica que a posição de equilíbrio e rigor de Deng Xiaoping no exame do papel de Mao Tsetung na história chinesa, feita em conjunto com cerca de quatro mil quadros dirigentes, foi decisiva para a manutenção da unidade do Partido e do próprio país.
Deng foi ainda o autor de proposições ousadas e hábeis para resolver problemas complexos legados pelo passado. Levantou a idéia de “um país, dois sistemas”, como fórmula para encaminhar a reunificação territorial da China, o que abriu caminho para um dos eventos mais espetaculares do século XX: a devolução, pacífica, pela Inglaterra, da maior cidade comercial do mundo, Hong Kong. A mesma fórmula presidiu o retorno de Macau, que deixou de ser portuguesa, e poderá ser aplicada também para a volta definitiva de Taiwan.
Deng Xiaoping não descurou, em meio às transformações feitas na China, do risco da direita aproveitar-se delas. Disse que para se oxigenar um ambiente é necessário abrir a janela, mas que, ao assim proceder-se, surgia a possibilidade de micróbios entrarem. A seu juízo, isto não deveria levar a que se mantivesse a janela fechada, mas sim a que se alteasse a vigilância, para que a sujeira, ou seja, “a poluição espiritual”, não prosperasse. Em 1989, em uma conversa com dirigentes do Partido, destacou: “É inadmissível vacilar na luta contra a liberalização burguesa e na persistente aplicação dos quatro princípios fundamentais”.
2) A construção de umgrande Partido Comunista
A idéia de Partido Comunista já estava presente no Manifesto Comunista, elaborado por Marx e Engels em 1848. Mas os seus próprios autores eram membros da Liga dos Comunistas, que lhes dera a tarefa de escrever o famoso documento. Em 1864 encaminharam uma forma mais elevada de organização dos trabalhadores, a Associação Internacional dos Trabalhadores, ou I Internacional – que, entre seus objetivos, tinha o de organizar partidos operários. Nessa base, em 1869, foi criado o primeiro partido político da classe operária, o Partido Social-Democrata Alemão, do qual Marx e Engels também foram membros. Com Marx morto e a I Internacional exaurida, Engels encabeçou a criação da II Internacional, em Paris, em 1889, que, depois da morte de Engels, caiu sob influência oportunista. No contexto das lutas das classes radicalizadas, no final do século XIX, Lênin sentiu a necessidade da criação de outros partidos, para dirigir lutas que almejassem o poder político. Concebeu e estruturou, assim, o que passou à história como Partido de Tipo Novo, também conhecido como partido leninista.
A idéia básica era construir um partido de classe, que assumisse a causa socialista e comunista, um partido de ação política, armado com uma doutrina científica que lhe permitisse uma visão de conjunto dos objetivos da luta. Esse partido deveria ser organizado a partir dos locais de trabalho, de moradia e de estudo, e deveria funcionar na base do centralismo-democrático, sem lugar para facções, frações ou grupos. Respeitaria e incentivaria a liberdade de pensamento, mas seria uma unidade de vontade. Um partido deste tipo foi que viabilizou a Revolução Russa.
Logo depois da tomada do poder em 1917, Lênin promoveu a fundação da III Internacional, ou Internacional Comunista, com o objetivo de disseminar a criação desses partidos pelo mundo afora, e coordená-los.
Foi nessa base que se fundou em 1921, na China, o Partido Comunista da China. Mas o partido, fundado, não estaria pronto e acabado. Da mesma maneira que o marxismo precisa ser aplicado às condições concretas dos países para se desenvolver, o Partido Comunista, de tipo leninista, também precisa encontrar suas formas específicas de estruturação para crescer.
Como a condição da luta social e nacional na China, durante praticamente todo o tempo antes da tomada do poder, foi a guerra, o Partido Comunista da China teve que ser, desde o início, um partido de combate, organizando o Exército e nele se organizando, e orientando o povo para a guerra.
Foi assim que o Partido Comunista da China formulou diretrizes apropriadas que permitiram a sua construção vitoriosa. Segundo Deng Xiaoping, “foi obra de Lênin a formulação de uma doutrina integral sobre a construção do Partido” e “foi o camarada Mao Tsetung quem mais desenvolveu a doutrina de Lênin sobre a construção de Partido”. (1)
As diretrizes formuladas por Mao Tsetung sobre a construção do Partido são parte importante do “pensamento de Mao Tsetung”. Muitas delas foram sistematizadas e divulgadas depois da Longa Marcha, em Yenan, antes da Guerra de Resistência contra o Japão. Há instruções várias que versam sobre: qualidades e deveres dos comunistas; cuidados a serem observados na utilização dos quadros; funcionamento dos comitês do Partido; atitude diante dos jovens e das mulheres; atitude diante da cultura e da arte; características do estilo de trabalho dos comunistas; a importância da linha de massas etc. Deng salienta que foi “graças a essa doutrina integral do camarada Mao Tsetung sobre a construção do Partido (…) que podemos alcançar a vitória total na Guerra de Resistência contra o Japão e na Guerra de Libertação”. (2)
Entre outros pontos importantes da contribuição de Mao para a construção do Partido, Deng anota ainda: “a conjugação de um alto grau de democracia com um alto grau de centralismo, a correta distinção e tratamento dos dois tipos de contradições, a fórmula da unidade-luta-unidade, o método de tirar lições dos erros passados para evitá-los no futuro e de tratar as doenças para salvar os doentes, a linha de massas e a confiança nelas.” (3) Entende-se, assim, essa importante observação de Deng Xiaoping: “Logo que se fundou a República Popular, reinava no Partido uma atmosfera de vitalidade e vivacidade”. (4) E Mao, em 1957, expressando o ponto de vista do Partido escreveu: “o objetivo a que nos propomos é criar uma situação política em que haja tanto centralismo como democracia, tanto disciplina como liberdade, tanto unidade de vontade como satisfação moral individual e vivacidade (…)”. (5)
Mais à frente, equívocos sérios foram cometidos dentro do Partido e na sociedade chinesa, com a participação e sob a direção do próprio Mao. Sobretudo durante a Revolução Cultural, a atmosfera de vitalidade e vivacidade desapareceu, o Partido e o país praticamente sucumbiram a métodos autoritários e voluntaristas. Na esteira desse processo sobraram graves injustiças a quadros, diminuição do nível ideológico do Partido e das massas, e o abastardamento do pensamento de Mao Tsetung, aventureiramente tratado como uma doutrina religiosa e mágica.
No período que se seguiu a 1978, foi necessário novo empenho para se retomar o funcionamento do Partido na base de um centralismo-democrático corretamente aplicado. E foi aí que Deng sublinhou ser “necessário pôr ênfase na democracia”, posto que “durante um tempo bastante longo, o centralismo democrático não teve autêntica vigência, já que se fez finca-pé no centralismo prescindindo da democracia (…)”. Em conseqüência dessa deformação, segundo Deng, “em todo o Partido e todo o país (…) muita gente ainda carece da coragem necessária para dizer o que pensa”. (6) E as correções foram empreendidas.
Ao completar oitenta anos de fundação, o Partido Comunista da China tem uma trajetória extraordinária de lutas e um vasto elenco de vitórias monumentais. Destas, seguramente as maiores são a fundação de uma República Popular na maior parte da imensidão asiática; o lançamento nessa República das bases de um regime socialista; e a construção do socialismo nos dias de hoje, de forma original e cuidadosa, com um sucesso e uma determinação que causam admiração no mundo inteiro. Todos os que no mundo sonham na construção de uma sociedade nova juntam-se para parabenizar o Partido Comunista da China pelos seus oitenta anos e desejar o maior êxito possível aos 63 milhões de membros desse Partido, organizados em seus 3,3 milhões de organizações de base.
Haroldo Lima é deputado federal pelo PCdoB/BA e vice-presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara Federal.
Notas
(1) Deng Xiaoping, Obras escolhidas, vol. I, pg. 59, Edições em Línguas Estrangeiras, Pequim, 1994.
(2) Idem. Ibidem.
(3) Idem. Ibidem, pg. 61.
(4) Idem. Ibidem, pg. 59.
(5) Idem. Ibidem, pg. 69.
(6) Idem. Ibidem, pg. 173.
EDIÇÃO 62, AGO/SET/OUT, 2001, PÁGINAS 34, 35, 36, 37, 38, 39