Nosso impávido auto engano nos leva a valorizar demais as tempestades sentimentais e os vulcões emocionais que nos arrastam a cometer insanidades. É comum ouvirmos pessoas que cometeram barbaridades dizerem, à guisa de justificativa, que são “sentimentais demais”.

      Altemar Dutra, eterno romântico boca de cantor, assim falou: “Sentimental demais/ eu sei que sou assim/cantando estas canções/para quem ama/igual a mim/”. Amar não é crime, isto chega a ser sublime, mas e quando em nome do amor danamos a desferir palavrões e sopapos por simples ciúme das divas ou doidivanas que colocamos no altar de nossa adoração fanática?

      De um modo geral, tentamos justificar nossas barbaridades declarando sacos de bondades e oceanos de sublimidades de que nos julgamos capazes. Tudo em potencial, é claro, em estado de vontade nunca realizada, pois que nossos atos desmentem quilometricamente aquilo que expressamos em nossas orações, quando “a situação fica russa”, e a sorte a nós não se achega, “nem que a vaca tussa”.

      Emoções destrambelhadas geram saraivadas de bordoadas. De pessoas incapazes de conter palavras e gestos de violência acesa não se deve esperar que sejam poços de serenidade, quando o sapato lhes aperta o calo da sua maior estima. O caso pode acabar em rima rica, se for o caso de serem poetinhas ou poetastros, mas o pau vai comer solto, e é bem capaz de acabar em esforço físico, ou em formalidade fria de vara de família.

      Por que a glória imortal do amor é tão caluniada a ponto de ser confundida com este furor e destempero? Por que amantes que conversam com as estrelas, e muitas vezes saem, pelas madrugadas friorentas, a vê-las, tornam-se ciumentos homicidas, a ponto de só se sentirem satisfeitos quando estão a desferir pernadas & sopapos?

      Assim sendo e assim passando, tanto em mansões quanto em barracos, cansado de ver proliferar o descalabro em amor de fino trato, na alta ou na baixa sociedade, eu me permito compartir com o estóico leitorado estes versinhos marotos: “De emoções sem freio/os presídios/ e as varas de família/estão cheios”.  

 Brasigóis Felício, é goiano, nasceu em 1950. Poeta, contista, romancista, crítico literário e crítico de arte. Tem 36 livros publicados entre obras de poesia, contos, romances, crônicas e críticas literárias.